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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

É preciso mais atitude!


É preciso mais atitude!

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Entendo que a transição de governo, dessa vez, não se deu da forma adequada; mas, da forma possível. Acontece que, agora, o governo eleito e empossado, é o governo. Então, não cabe aceitar a morosidade, a má vontade, a resistência ou a falta de empenho, que ainda transita, através de certos grupos, dentro da esfera governamental. Afinal, isso não foge aos olhos de nenhum cidadão minimamente observador e perspicaz.

Através de silêncios, de atitudes, de falas dissimuladas, a política do boicote, do quanto pior melhor, se acotovela para tentar se afirmar. A pergunta é: até quando? Esses comportamentos começam a macular e a comprometer o compromisso empenhado pelo atual governo em não errar. Se há quem não se sinta confortável, ou capaz, ou desimpedido de alguma forma, para fazer parte desse gigantesco trabalho de reconstrução, o que se espera é o mínimo de hombridade para declinar do papel em nome de quem possa cumpri-lo a contento.

Confesso que a situação dos Yanomamis, por exemplo, já começa a causar desgaste. Primeiro, porque a situação de abandono e crueldade com os povos originários, no Brasil, não remonta de 2023. Ela é histórica. E ao longo de décadas é sim, de conhecimento público, o acirramento da sua degradação. No entanto, paira no ar a impressão de um pisar em ovos, em relação aos garimpeiros e exploradores ilegais, que se apropriaram da região indígena e tem levado ao extermínio milhares deles.

Segundo, porque estamos falando de subnutrição no mais importante nível de seres humanos em diferentes faixas etárias. Estamos falando de acometimento grave de doenças tropicais e de doenças trazidas pela contaminação de mananciais hídricos e do solo pelo mercúrio. Estamos falando de todo tipo de violência física, psicológica, sexual e patrimonial. Estamos falando da ilegalidade no seu sentido mais bruto e aviltante, ou seja, o desrespeito das leis e das autoridades legitimamente responsáveis pelo país. E se tudo isso não for importante, não for urgente, não for grave, o que será?

Enquanto se caminha a passos lentos, comedidos, a morte assola sem distinção. O que me deixa intrigada, no sentido, de perceber que o atual governo não estava, portanto, tão bem informado a respeito do assunto, como deveria estar. Essa era uma prioridade para ser enfrentada desde o primeiro dia; pois, seres humanos estavam morrendo. Vidas ceifadas que estavam se juntando aos milhares que o país havia perdido em outros campos de desolação, como a COVID-19 e a violência urbana.

O país tinha que estar mais bem inteirado da situação, com um plano de emergência nas mãos, com os responsáveis definidos e incumbidos de suas missões. Acontece que, mais uma vez, nesse recorte temporal recente, tem-se a percepção de um excesso de diplomacia, de dialogia, de mesuras e rapapés, na hora de confrontar quem não está nem aí para o país. Como se o Estado brasileiro é que tivesse que pedir licença para os criminosos para cumprir o seu dever constitucional. Êpa! Como assim? Isso é a mais completa subversão da legalidade, do bom senso, da lógica democrática. E por quê agir assim, hein?

Daqui e dali, já não é difícil perceber a quantidade de obstáculos, sendo colocados propositalmente para se interpor ao fluxo natural, no qual deveria navegar o país. Então, não pode o governo se permitir trabalhar desacelerando o ritmo para não entrar em embate direto com essas forças. Caso contrário, ele será vencido pelo desgaste que representa o chamado arrastar de correntes. Sim, porque isso cansa, desestimula, frustra. Como diz o provérbio, “Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”, e o Brasil tem que ser uma corrente caudalosa de água, nesse momento, para romper os desafios e consolidar seus objetivos.  

Por isso, não raras às vezes, fico pensando onde foi parar a compreensão do que traz a bandeira nacional na sua inscrição de “ordem e progresso”, quando verifico tais comportamentos acontecendo, em pleno século XXI. As correntes que nos arrastaram para o retrocesso, para o conservadorismo retrógrado, e que agora tentam se firmar a todo custo pelas mãos da direita e seus simpatizantes, são as mesmas que promoveram a destruição generalizada que assolou o país, nesses últimos quatro anos.

E enquanto aqui, uns e outros, não aceitam a realidade dos fatos e se desvirtuam pelos caminhos desvairados da insurreição, o mundo lá fora aposta alto no Brasil, como, há tempos, não acontecia. Sinais de que acreditam que a fênix brasileira pode sim, ressurgir das cinzas e contribuir significativamente com o mundo, sob diferentes aspectos.

Daí a necessidade de o governo brasileiro assumir, de fato, o seu protagonismo, tomando as decisões que precisam ser tomadas, no tempo exato. Submeter-se ao mau humor inconformado da direita e seus simpatizantes é um erro crasso que não pode sequer ser cogitado. Como diz o provérbio português, “Se gostou, gostou; se não gostou, coma menos”. Sobretudo aqueles que são funcionários públicos, a compreensão de que estão na condição de funcionários de Estado e não de governo tem que prevalecer. E mesmo os que foram, por alguma razão, convidados a participar, precisam se valer da ética para permanecer.

Pois, na medida em que se permite emergir esse tipo de ruído no governo, abre-se a possibilidade de que os problemas ganhem vultos ainda maiores, através da mídia. Ora, muito do que chega aos ouvidos dos veículos de comunicação e informação, na contemporaneidade, são factoides. Quando inadvertidamente eles se sobrepõem aos fatos, a tendência natural é manipular a verdade em si e induzir aos erros de interpretação, favorecendo um certo tipo de opinião enviesada e pouco comprometida com a realidade.

E para um governo que tem enfrentado, desde a campanha eleitoral, uma oposição belicosa e inconsequente, a necessidade de se posicionar de maneira clara e contundente é fundamental, em todos os momentos. Não pode haver espaços entre linhas e entrelinhas. O que se pensa, o que se diz, o que se faz, tudo deve estar devidamente ajustado e coerente às circunstâncias e ao arcabouço jurídico-institucional em vigência. Porque “A verdadeira medida de um homem não se vê na forma como se comporta em momentos de conforto e conveniência, mas em como se mantém em tempos de controvérsia e desafio” (Martin Luther King Jr.). 

sábado, 5 de março de 2022

Se não tem pão, que comam...


Se não tem pão, que comam...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Há quem atribua à Maria Antonieta, rainha consorte da França, no século XVIII, a frase “Se não tem pão, que comam brioches”. Uma maneira cruel de manifestar total desapreço aos súditos que passavam fome naquele país, durante o reinado de Luís XVI. Contudo, em pleno século XXI, essas palavras voltam a circular no imaginário coletivo motivadas pela mesma razão, a fome.

Infelizmente, a expressão, agora, fica pela metade, “Se não tem pão, que comam...”. Porque “o relatório O estado da Insegurança Alimentar e Nutrição no Mundo (SOFI) 2021, construído através do esforço de várias agências das Nações Unidas, estima que cerca de um décimo da população global – até 811 milhões de pessoas – estava subalimentada em 2020” 1.

Acontece que, “desde bem antes da pandemia do COVID-19, vários fatores importantes colocaram o mundo fora do caminho para acabar com a fome e a desnutrição em todas as suas formas até 2030” 2. Dentre eles estão os conflitos geopolíticos, os eventos extremos do clima, o baixo desenvolvimento e as depressões econômicas ocorridas e a inexistência de dietas saudáveis em decorrência da pobreza e da desigualdade.

Em meados de 2010, ela já dava sinais de aumento; mas, “em 2020 a fome disparou em termos absolutos e proporcionais, ultrapassando o crescimento populacional” 3. Afinal, o mundo foi confrontado, também, com a elevação do preço dos alimentos puxado pela pandemia e a disparada no valor dos insumos; pois, “a variação de preços desses produtos segue ‘o mercado’, que é umbilicalmente vinculado ao modelo agrícola”, ou seja, “baseado no lucro e no ‘elevado uso de insumos, comprados dos oligopólios, alta produtividade e monocultivo’” 4.

Sendo assim, “embora haja fatores conjunturais influindo na variação de preços, como variações climáticas que afetam a produtividade das lavouras ou a variação da demanda de grandes importadores como a China e outros países asiáticos, a variação de preços segue, estruturalmente, a especulação financeira e os ganhos dos grandes oligopólios do chamado ‘Agronegócio’” 5.

Então, diante da guerra deflagrada no leste europeu, com a invasão da Ucrânia pela Rússia, e todas as sanções já impostas pela diplomacia internacional ao país agressor, a tendência é que determinadas commodities, tais como cereais (arroz, trigo, milho, aveia), óleos vegetais (soja, girassol, canola, milho), leite e derivados, carnes, açúcar e café, tenham seus preços inflacionados pela escassez de produção e/ou distribuição no mercado internacional.

De modo que esse movimento tende a agravar a insegurança alimentar no planeta, particularmente, em relação às populações mais carentes e vulneráveis. Segundo o “Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola, Fida, a crise na Ucrânia pode causar aumento de preços e escalada da fome, porque a região é responsável por 12% das exportações de calorias alimentares globais, o que inclui alimentos básicos como trigo, milho e óleo de girassol, e 40% da produção ucraniana abastece países com graves problemas de fome, no Oriente Médio e na África” 6.

Em relação ao cenário brasileiro, as expectativas também não são nada boas. Primeiro, porque a elevada demanda mundial pressiona os custos de produção, com impactos sobre o preço das matérias-primas, dos insumos e da energia elétrica e derivados do petróleo. No que diz respeito às commodities agrícolas, elas tiveram seus valores inflacionados; assim como, o fato da insuficiência de resinas plásticas para a produção de embalagens ter elevado o custo desses produtos, também.

Portanto, “se não tivermos pão, comeremos...” o que houver disponível nos mercados, feiras e mercearias. O que couber no orçamento. Os tempos sisudos estão nos afastando do direito a acessibilidade e a segurança alimentar.

Estamos privados de escolher, de decidir, de adquirir qualitativa e quantitativamente o que irá compor as nossas refeições; bem como, satisfazer as nossas demandas nutricionais e eventuais gulodices. Estamos vulneráveis ao adoecimento de nossos corpos pela carência de alimentos. Quem diria que, no Terceiro Milênio, ainda não teríamos conseguido erradicar a fome!

De certa forma, tudo isso é uma consequência de como a humanidade, ou pelo menos parte dela, se posiciona diante da vida, do cotidiano, das relações socioeconômicas. Tanta indiferença. Tanta negligência. Tanto descaso. Tanta omissão.

Porque se acostumaram a satisfazer seus desejos e vontades sem maiores sacrifícios; muitas vezes, até sem se preocupar em repartir, em partilhar, em oferecer a quem se encontrava em posição menos favorável. Bastava a fome fazer doer o estômago e lá estavam os alimentos prontos para o seu deleite.

Mas, tendo em vista que, agora, tudo mudou ... Torna-se oportuno recordar as palavras de Dom Hélder Câmara, “A fome dos outros condena a civilização dos que não tem fome”. Afinal de contas, “Nos lugares em que homens e mulheres e crianças carregam o fardo da fome, um discurso sobre democracia e liberdade que não reconheça estes aspectos materiais pode soar falso e minar os valores que procuramos promover” (Nelson Mandela – Prêmio Nobel da Paz, em 1993). Seria, então, como repetir ao infinito “Se não tem pão, que comam brioches”.  

sábado, 26 de fevereiro de 2022

Guerra. Paz. No fim, tudo parte da reflexão.


Guerra. Paz. No fim, tudo parte da reflexão.

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

A experiência de uma guerra real, talvez, seja capaz de fazer com que uma boa parte da humanidade reavalie os seus pontos de vista políticos. Especialmente, no que diz respeito a desconsiderar ou desqualificar certos discursos e comportamentos de seus representantes, atribuindo-lhes, muitas vezes, um caráter de mera fanfarronice. Afinal, no campo político nada é à toa, nada é brincadeira, nada é blefe, porque por trás das ações há intenções que não se conhece nem em extensão e nem em profundidade.

E o governo russo está provando tudo isso. O movimento da diplomacia internacional em monitorá-lo ao longo de décadas e, particularmente, depois da anexação da Crimeia, em 2014, e o seu apoio e reconhecimento de áreas separatistas na Ucrânia, no mesmo ano, mostrou-se insuficiente para conter quaisquer novas iniciativas ainda mais belicosas. A Ucrânia está sob ataque e ameaça russa nesse momento.  

Isso significa que prevenir ainda é o melhor remédio. Até mesmo, nas relações diplomáticas. Os limites e sanções precisam oferecer a segurança e a consistência exemplificativa, para dissuadir a continuidade dos atos ofensivos e delituosos que um dado país, ou conjunto de países, pretenda colocar em prática. Afinal de contas, a própria Segunda Guerra Mundial provou de todas as maneiras possíveis que a diplomacia dialógica não funciona diante de certas figuras dotadas de poder.

A aura de superioridade, de blindagem, de inacessibilidade que a investidura em cargos de governança e liderança de Estado constitui esbarra em um limite muito tênue entre a razão e a loucura. Quaisquer traços ou sinais de desequilíbrio psicoemocional podem tornar essa aura um instrumento terrível e devastador. Totalmente incontrolável, na medida em que o balizamento entre o certo e o errado, o humano e o desumano, o legítimo e o ilegítimo, o legal e o ilegal, desaparece como fumaça.

E, infelizmente, não é necessário chegar aos extremos para se perceber os caminhos que começam a ser transitados por essas pessoas. As linguagens verbais e não verbais são bastante elucidativas para desencadear um movimento mais atencioso, mais perspicaz a respeito. Pois, em algum momento, o ser humano é traído por sua própria identidade, sua própria essência, em algo muito mais significativo do que um simples ato falho.

Daí o risco imenso que se corre em “bater palma para maluco dançar”. Geralmente, quem age assim, não mede as consequências e, portanto, não sabe desatar os nós que elas podem resultar. A situação, então, sai fora de controle e começa a gerar uma retroalimentação de problemas, cada vez mais complexos e danosos. Como é o caso da guerra que estamos presenciando.

Ora, ainda que as análises diplomáticas se baseiem em um conjunto de fatos, de acontecimentos, de estratégias, de interesses, de perdas e de ganhos, não se pode desconsiderar o elemento surpresa que reside na consciência (ou inconsciência) daquele que detém o poder e pode alterar e interferir de maneira substancial e contundente nos resultados.

É preciso contar com a existência de uma certa perspectiva oculta que reside nesse outro. De modo que, no fundo, as perspectivas diplomáticas acabam se tornando um tipo de especulação, na qual o resultado pode surpreender a todos. Afinal, ninguém conhece plenamente a si mesmo, que dirá constituir certezas e convicções sobre qualquer outra pessoa!

Assim, não considero que o mundo foi pego de surpresa com essa guerra. Minha opinião é de que erraram na aposta, na insistência dialógica, na crença de um possível blefe. Ainda que estivessem certos, arriscar a vida de seres humanos dessa maneira é um preço muito alto. No entanto, eles erraram e um país inteiro está sob uma ameaça bélica, pautada na tirania de um outro país, cuja liderança acredita que não encontrará quaisquer resistências às suas investidas. Ele se habituou a não enxergar nas eventuais perdas e sanções, que possam ser impostas pela diplomacia internacional, nenhum obstáculo ao seu poder e aos seus objetivos.

O que explica a dificuldade de resolução quando a situação chega a esse ponto. Como bem escreveu José Saramago, em seu Ensaio sobre a Cegueira (1995), “[...]se antes de cada ato nosso, nos puséssemos a prever todas as consequências dele, a pensar nelas a sério, primeiro as imediatas, depois as prováveis, depois as possíveis, depois as imagináveis, não chegaríamos sequer a mover-nos de onde o primeiro pensamento nos tivesse feito parar”. Afinal, estaríamos guiados pela razão e não, lançados à imprevisibilidade através das paixões mundanas.

A ideia de “Justificar tragédias como vontade divina tira da gente e responsabilidade por nossas escolhas” (Umberto Eco). E governar, tanto quanto viver, é fazer escolhas. Sucesso ou fracasso. Construção ou destruição. Prosperidade ou penúria. Vida ou morte. Igualdade ou desigualdade. Progresso ou atraso. Enfim... A questão é que essa governança, também, existe a partir de escolhas. De modo que, no frigir dos ovos, somos todos responsáveis pelo o que acontece em tempos de guerra ou em tempos de paz.


segunda-feira, 4 de outubro de 2021

Entre o necessário e o supérfluo ...


Entre o necessário e o supérfluo ...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Atenta ao que trazem os veículos de informação e comunicação, nada mais oportuno do que despender alguns minutos, no dia de hoje, a refletir sobre São Francisco de Assis. Símbolo do despojamento material e de uma devoção incondicional aos pobres, miseráveis e desafortunados de sua época, o trabalho de São Francisco emerge uma discussão profundamente importante entre o necessário e o supérfluo, em tempos contemporâneos, em tempos de Pandemia.

Desse modo, antes que alguém pense que essas considerações têm caráter de apologia à pobreza e à miséria, já digo que não. Francisco de Assis tornou-se a figura que o mundo conhece por escolha, por livre e espontânea vontade. E foi sob esse princípio que seus seguidores, desde o século XIII, têm se juntado a Ordem Franciscana para dar continuidade às suas convicções e trabalhos, ou seja, por opção, por total liberdade. A ideia é partir de seu legado para uma breve análise de como “a ganância do ter não só engoliu o ser e a convivência pacífica, mas até privou a maior parte dos homens do ter indispensável, para acumular nas mãos de uns poucos o que a todos pertence” (D. Paulo Evaristo Arns).

Acontece que em pleno século XXI, passados oito séculos desde o início dos trabalhos franciscanos, a humanidade ainda se permite conviver com uma miséria brutal e perversa, oriunda de inúmeras desigualdades sociais, que parecem desconsiderar por completo os limites do que realmente necessita o ser humano para viver com dignidade. Talvez, muitos não se recordem dessa citação da personagem Tião Galinha, na novela Renascer, de 1993, “Quem trabalha e mata a fome, não come o pão de ninguém. Quem ganha mais do que come, sempre come o pão de alguém”.

Mas, em muitos lugares do planeta, particularmente no Brasil, essa estranha habilidade em banalizar as agruras cotidianas, ao ponto de invisibilizá-las e naturalizá-las, acontece amiúde e sem causar quaisquer remorsos ou constrangimentos a uma significativa parcela da população. Como se a vida tivesse mesmo que ser assim, desigual. No entanto, quanto mais o tempo passa, mais essa desigualdade se aprofunda porque o desejo de manter as regalias, os privilégios, os poderes e os “pequenos poderes”, impulsiona as engrenagens da ganância.

Nem sei por quê as pessoas se admiram tanto com o fato das pirâmides do Egito serem câmaras mortuárias onde os faraós, suas famílias, seus escravos e seus tesouros eram enterrados; na medida em que as civilizações posteriores permaneceram amealhando riquezas, da mesma forma, como se pudessem ter alguma serventia depois da morte. Não é à toa, a quantidade de disputas judiciais e assassinatos, envolvendo heranças; posto que, não se usa mais ser enterrado com os bens acumulados.

Assim, enquanto, milhares de indivíduos se entretêm e se encantam com as notícias em torno do “fabuloso mundo das classes A e A+”, ninguém para e se questiona sobre o modo como essas riquezas foram constituídas. Porque, verdade seja dita, ainda que o trabalho e o esforço tenham composto esses dias de “glória”, nas entrelinhas, provavelmente, a conquista do sucesso e do dinheiro não só veio da espoliação de muitos; mas, de uma infinidade de negociatas e atitudes nada éticas e morais.

De modo que esse silêncio, das camadas inferiores da pirâmide social, contribui para a manutenção das desigualdades; sobretudo, dificultando sua própria mobilidade e ascensão. Como mostram os registros ao longo da história da humanidade, as pessoas sempre estiveram alocadas em um lugar cativo na sociedade e não lhes era permitido quaisquer movimentos de mudança. A cada divisão histórica – Pré-História, História Antiga, Idade Média, Idade Moderna e Idade Contemporânea -, essa questão foi adquirindo contornos próprios, a partir das conjunturas de desenvolvimento. O que não significa que perderam a sua força; haja vista a miséria, a pobreza, o desemprego, o desalento pelas vias urbanas.

O que vejo no mundo não é uma questão de perda de santidade; mas, de humanidade. Não se trata de uma insuficiência numérica de novos discípulos de Francisco de Assis, aspergindo sua fé e convicção de trabalho assistencial; mas, de simples empatia, respeito e fraternidade do ser humano para com o ser humano. O modo como as estruturas sociais foram organizadas fez perder, por completo, o sentido humano da vida, para ceder aos caprichos da acumulação desenfreada de bens e capitais. Sem que ninguém se perguntasse se isso era necessário ou não, se a sobrevivência dependia disso ou não.

Chegamos ao limite de uma fé que se resigna ao dízimo, não aos valores, aos princípios, as atitudes humanitárias e fraternas. Por isso, as pessoas se enxergam caridosas, a partir de práticas que não passam de placebos, as quais jamais irão, de fato, proporcionar aos seus pares condições de dignidade e autonomia. Se julgam no direito de excluir a crença do outro, porque não é a sua, como se houvesse um padrão ideológico a ser seguido. Inclusive, fazem guerra por esse motivo. Talvez devêssemos pensar a respeito de que “Só quem reza, em total entrega da alma, sabe desse acender e tombar da palavra nos abismos” (Mia Couto – A confissão da leoa, 2012).

Afinal, “você é quem decide o que vai ser eterno em você, no seu coração. Deus nos dá o dom de eternizar em nós o que vale a pena, e esquecer definitivamente aquilo que não vale...” (Pe. Fábio de Melo). Daí a importância simbólica e atemporal de Francisco de Assis. Porque ele discutiu o sagrado na perspectiva do humano, sem rótulos ou estereótipos, sem julgamentos, sem senões. Apenas, como alguém que é sim, capaz de pacificar, de amar, de perdoar, de unir, de crer, de corrigir, de acalmar, de alegrar, de iluminar, sem pedir nada em troca. Razão pela qual o seu legado permanece na busca em renovar em cada um, o resgate a esse ser humano que se perdeu dentro de si mesmo, chegando ao ponto de ser capaz de alimentar-se da miséria, da pobreza, da fome de seus próprios semelhantes.


terça-feira, 28 de setembro de 2021

Apesar dos benefícios, a longevidade trouxe o “etarismo”


Apesar dos benefícios, a longevidade trouxe o “etarismo”

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Imagino que muitos desconheçam o termo “etarismo”; embora, ele esteja frequentemente circulando no cotidiano social na sua forma prática. Trata-se do preconceito aos idosos, decorrente das fragilidades que o processo de envelhecimento impõe natural e gradativamente ao ser humano. De repente, aqui e ali se ouvem frases como “Você está velho (a) demais para isso! ”, “Lugar de velho (a) é no asilo”, “Você está ficando gagá”, “Você dá muito trabalho”. Mas, como dizem por aí, “quem não quiser envelhecer que morra jovem”.

Por isso, se torna cada vez mais importante debater e refletir sobre essa questão. De acordo com o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) 1, “O envelhecimento populacional é uma das mais significativas tendências do século XXI. Apresenta implicações importantes e de longo alcance para todos os domínios da sociedade. No mundo todo, a cada segundo 2 pessoas celebram seu sexagésimo aniversário – em um total anual de quase 58 milhões de aniversários de 60 anos. Uma em cada 9 pessoas no mundo tem 60 anos de idade ou mais, e estima-se um crescimento para 1 em cada 5 por volta de 2050: o envelhecimento da população é um fenômeno que já não pode ser mais ignorado”.

De modo que diante dessa evolução demográfica é fundamental criar condições e oportunidades para que a população possa envelhecer com segurança, saudável, incluída socialmente e economicamente ativa. Afinal, ninguém será eternamente jovem e “é a forma como optamos por tratar dos desafios e maximizar as oportunidades de uma crescente população idosa que determinará se a sociedade colherá os benefícios do ‘dividendo da longevidade’” (UNFPA).

Assim, ela afeta a dinâmica social, na medida em que há uma correlação direta entre desenvolvimento e longevidade humana. Países, cujo desenvolvimento é intenso e consistente, vêm favorecendo a uma expectativa de vida muito maior para sua população. Não só pelo fato da diversidade de políticas públicas que melhor atendam as demandas dos cidadãos; mas, também, pelo fato da renda per capita circulante possibilitar aos indivíduos a manutenção da sua sobrevivência e qualidade de vida. De modo que essa realidade vem desconstruindo o estereótipo do idoso à margem da sociedade, inerte e solitário.

Afinal, dentro desse contexto mais privilegiado, estão outros aspectos que dão suporte a essa ampliação da expectativa de vida, tais como acesso ao saneamento básico e água tratada; a segurança alimentar; ao desenvolvimento das ciências médicas e suas tecnologias, ampliando a base de diagnóstico e tratamento precoce; e, a imunização, que tem evitado milhões de mortes desnecessárias ao ano e reduzido a circulação de agentes infectocontagiosos ao redor do planeta.

Apesar de nos países em desenvolvimento e subdesenvolvidos o idoso conseguir manter-se ativo, nem sempre isso ocorre por escolha e condições favoráveis. Na maioria das vezes, esse movimento decorre da total necessidade básica de sobrevivência. A própria estrutura econômica desses lugares transforma, muitas vezes, os idosos em arrimo de família. Assim, a baixa remuneração advinda de sua aposentadoria passa a ser o principal componente do sustento e manutenção de todos, incluindo filhos, netos e até bisnetos, em alguns casos, os quais por razões de desemprego e/ou baixa escolaridade não teriam como sobreviver sozinhos. Muitas vezes, a insuficiência dessa remuneração acaba impulsionando o retorno desse idoso ao mercado de trabalho, geralmente informal, a fim de complementação dos recursos.

Além disso, há de se considerar que a análise do envelhecimento populacional não se dá de maneira homogênea. Como qualquer grupo social é necessário destacar características como idade, gênero, etnia, educação, renda e saúde; na medida em que “precisam ser tratados especificamente, por meio de programas e modelos de intervenção adequados a cada segmento” (UNFPA). Haja vista, por exemplo, que “o envelhecimento é um processo que atinge homens e mulheres de forma diferente. As relações de gênero estruturam todo o curso da vida, influenciando o acesso a recursos e oportunidades com um impacto que é tanto contínuo quanto acumulativo” (UNFPA).

Dentro desse contexto, verifica-se que o etarismo predomina em relação às mulheres, porque elas são mais vulneráveis à discriminação e abusos, em razão de um conjunto de inacessibilidades que comprometem sua inserção no mercado de trabalho, seu atendimento nos serviços de saúde, seu direito à propriedade e heranças, sua menor remuneração e renda básica, e suas garantias quanto à previdência social. Por isso, “essas diferenças têm importantes implicações para políticas e planejamento de programas públicos” (UNFPA).

Mas, e a realidade específica do Brasil?  Segundo a Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), “o número de brasileiros idosos de 60 anos e mais era de 2,6 milhões em 1950 (4,9% do total), passou para 29,9 milhões em 2020 (14% do total) e deve alcançar 72,4 milhões em 2100 (40% do total populacional). O número de brasileiros idosos de 80 anos e mais era de 153 mil em 1950 (0,3%), passou para 4,2 milhões em 2020 (2% do total) e deve alcançar 28,2 milhões em 2100 (15,6% do total populacional) ”2.

Tendo em vista que esse panorama estava contextualizado dentro de uma realidade econômica, todos os impactos sociais sentidos por essa população idosa são decorrentes, principalmente, do mau aproveitamento do chamado bônus demográfico, ou seja, dos períodos em que conta com mais força de trabalho e menos pessoas inativas no país.

Então, quando a Pandemia se instalou, “a economia brasileira já estava enfraquecida, com ‘esclerose múltipla’ e com várias ‘doenças’ de risco, como baixa produtividade, baixa competitividade internacional, baixo dinamismo na produção de bens e serviços, baixa geração de emprego decente, baixa geração de renda, baixo investimento e com ‘pressão alta’ no déficit fiscal, na dívida pública e nos indicadores de pobreza e desigualdade social” (FIOCRUZ).

Acontece que “a experiência internacional mostra que nenhum país consegue enriquecer depois de envelhecer. Países de renda média que não aproveitam o bônus demográfico costumam ficar presos eternamente na ‘Armadilha da renda média’” (FIOCRUZ). Portanto, as dificuldades que se desenham no horizonte brasileiro são imensas. Sobretudo, se consideramos indivíduos abaixo da linha da miséria, indígenas, analfabetos, residentes na zona rural, residentes nas periferias urbanas, dentro do perfil de envelhecimento nacional.

Trata-se de uma questão cujo desenvolvimento de suas complexidades é diário. Daí a necessidade de contenção e mitigação, o mais rápido possível. Porque quanto mais o tempo passa, mais o idoso está submetido a diversas expressões de vulnerabilidade social. De modo que suas demandas passam a ser entendidas como onerosas demais, difíceis demais, cansativas demais, enfim ... Trazendo à tona a impressão que a conquista da longevidade, de uma maior expectativa de vida, foi algo ruim e indesejável para alguns indivíduos e segmentos da sociedade. 

Porém, isso não é justificativa e nem dá o direito a ninguém de manifestar o “etarismo”. Aliás, como a sociedade pode se dar ao luxo de manifestar qualquer preconceito nesse sentido? Envelhecer é parte do ciclo da vida. Antes de ousar hastear por aí bandeiras absurdas e ofensivas, é preciso lembrar de que “A pior cegueira é a mental, que faz com que não reconheçamos o que temos a frente” (José Saramago – Ensaio sobre a Cegueira), ou o que temos dentro de nós. Porque ela é uma porta aberta para que o preconceito seja esse “fardo que confunde o passado, ameaça o futuro e torna o presente inacessível” (Maya Angelou – escritora norte-americana) a todos, sem distinção.

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

Aberta a temporada do “Me engana que eu gosto”


Aberta a temporada do “Me engana que eu gosto”

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Um dos grandes desafios da contemporaneidade tem sido as Fake News, na medida em que são criadas e disseminadas com fins específicos de desestabilização, mobilização, e/ou desorganização das estruturas sociais para atender a interesses de determinados indivíduos, grupos ou instituições. E no Brasil, não é diferente.

Nos últimos três anos essa prática tem se intensificado e produzido efeitos desastrosos em vários campos da vida cotidiana, particularmente, no tocante à Pandemia. Mesmo assim, declarações do próprio Presidente da República dão conta do seu apreço às Fake News, sob argumentos que retiram delas quaisquer parâmetros de ofensividade prejudicial às boas relações sociais. Segundo ele, eventuais distorções e manipulações da verdade são de natureza trivial da vida e, por isso, as pessoas já deveriam estar habituadas a elas. Pena, que não seja bem assim.

Então, diante das notícias do dia, me deparei com algo de importância reflexiva nesse contexto. Foi noticiado que o governo federal anunciou recursos na ordem de 450 milhões para serem gastos em propaganda, a título de resgatar a sua imagem e popularidade. A ideia é contrapor o trabalho informativo sério das mídias de comunicação, que vem apontando sem filtros a dinâmica atual da realidade brasileira ao cidadão, oportunizando uma análise crítica a respeito dos acontecimentos. Assim, a notícia chega com ares do velho “jeitinho brasileiro” para consolidar a imagem de uma realidade paralela por vias nada ortodoxas de informação.

Pode ser que, sob diversos aspectos, o cidadão esteja se comportando de um modo voluntariamente crédulo e irresponsável diante dessas notícias enviesadas e tendenciosas que circulam pela internet, através das redes sociais. Mas, quando o assunto é o cotidiano, no seu sentido mais prático, os parâmetros de análise se ampliam à revelia das opiniões terceirizadas, porque quase sempre “dói no bolso” os impactos.

É o custo de vida “pela hora da morte”. É a necessidade de estabelecer cortes drásticos nas despesas do dia a dia; sobretudo, supérfluos e prazeres. De modo que não se precisa ser um expert em finanças e economia para enxergar adequadamente o que acontece na fila do banco, do supermercado, da padaria, do açougue, ... E não para por aí.

O “arrastar de correntes” promovido pela gestão da Pandemia no país, também, representa um desgaste palpável para o cidadão. Ele vê outros países seguindo em frente, buscando recuperar o ritmo do desenvolvimento, e se vê estagnado por medidas erráticas de caráter insuficiente e ineficiente, como se o objetivo fosse mesmo o “quanto pior melhor”. E sabendo muito bem quem vai pagar o preço dessa conta, ele sobrevive aos dilemas impostos por essa realidade caótica de um vírus perigoso e desconhecido que persiste na sua jornada destrutiva.

Ele, então, tenta espairecer a cabeça quente de tantos problemas, mas o calor do ambiente não lhe permite essa graça. É! Falta chuva, falta água, falta vento, enquanto sobram incêndios florestais e desmatamentos por todo o país, alterando com severidade os padrões climáticos e aumentando o preço das tarifas de energia elétrica e o risco de eventuais interrupções de fornecimento.

Reservatórios superficiais e subterrâneos estão evaporando a olhos vistos, elevando o risco de desabastecimento de água para a população a um nível iminente. E quando digo população, são todos os estratos sem exceção. É toda a cadeia produtiva sem exceção. São todas as demandas humanas sem exceção.

Portanto, tomando por base apenas essas questões, já é possível perceber que a perda de popularidade do governo não é uma questão de perspectivas expressas por veículos de informação e comunicação. Não se trata de ser A, B ou C, influenciando ninguém a ser contra ou a favor, muito pelo contrário.

São fatos. São realidades vivenciadas diariamente, em níveis de impacto negativo maiores ou menores; mas, que, não são invisíveis ou imperceptíveis para ninguém. No cerne dessa seara cotidiana, o indivíduo é, portanto, o autor das suas próprias conclusões e o protagonista das suas decisões. Mesmo que seu exercício de cidadania ainda permaneça como um rastro vestigial.

No fim das contas, falar de milhões sobre publicidade governamental é “o fim da picada”. Nem parece que estamos falando do país que quer pagar 39 bilhões de precatórios em 2022, ao invés dos 90 bilhões previstos, a fim de ter condições de aumentar o valor do programa Bolsa Família. Sim, porque diante do aumento exponencial de cidadãos em condição de vulnerabilidade, conforme apontam as taxas de desemprego e pobreza nacionais, esse benefício saiu da condição de despesa supérflua para o status de suma importância. Do país que vive no limite do respeito ao teto de gastos, porque não consegue se desvencilhar das suas práxis perdulárias crônicas. ...

De modo que, mais do que indecoroso um gasto de 450 milhões nesse cenário apocalíptico que o país vive, ele é simplesmente de uma ineficácia total. Na medida em que os problemas nacionais já alcançaram os limites da sobrevivência, extinguindo-se quaisquer possibilidades de aceitação de um universo paralelo.

Uma idealização, nesse ponto das conjunturas, beira as raias do ridículo e, ao contrário de apaziguar, só faz acirrar os ânimos. Porque a ruptura com equilíbrio lança as pessoas para longe de suas zonas de conforto, exigindo-lhes uma adaptação para a qual, nem todos, estão adaptados ou têm condições de se adaptar.

Por sorte, como dizia o próprio fundador da BBDO, uma das maiores agências de publicidade do mundo, “Para o bem ou para o mal, suas palavras são a sua propaganda. Todas as vezes que abre a boca, você revela o que existe em sua mente”. Desse modo, quaisquer Fake News travestidas de propaganda populista não perderão a sua identidade, a sua essência. Isso significa, então, que apesar dos esforços em distribuir “lentes cor-de-rosa” aos cidadãos, por meio da mídia, os resultados de declínio de popularidade do governo estão lançados ao risco de serem ainda maiores e mais rápidos. Afinal de contas, “O que é bom se vende por si só, o que é ruim faz propaganda de si” (Provérbio Africano).  


segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Imagine...


Imagine...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Imagine a seguinte situação. Uma pessoa se encontra em estado muito grave, correndo risco de morte e, ao contrário de levá-la para o hospital e supri-la de todos os tratamentos necessários para salvá-la, quem está ao seu redor fica administrando chás e remédios inespecíficos para contornar a situação, que só faz se agravar.

Pois é, isso é o mesmo o que acontece no Brasil nesse momento. Ao invés de tomar uma providência contundente para evitar a expansão das crises em curso, diversas correntes políticas continuam contemporizando a situação e aguardando pelo desfecho de uma eleição prevista para 2022.

Claramente, isso significa que estão mais preocupados consigo mesmos do que com o país. Se assim não fosse, já estariam mobilizados e articulados para impedir a avalanche de desmandos que insiste em estampar as manchetes midiáticas diariamente. Temos que concordar que esses quase três anos de governo fizeram o Brasil patinar, patinar e não sair do lugar, preso a um visgo de incompetências e inabilidades.

De modo que os dias têm sido de um exaustivo calvário para a população. E se as esperanças em torno da resolução dos problemas mais urgentes são minguadas e difíceis, pelo menos no que diz respeito ao cerne do problema, que é a gestão de todos eles, isso poderia já ter encontrado uma solução não fosse a inação travestida por melindres e rapapés politiqueiros, de gente que prefere permanecer pisando em ovos para não atrapalhar interesses próprios. O pior é que muitos destes ainda têm a coragem de dizer que se preocupam com o país.

Sinceramente, não entendo uma preocupação que coloca os interesses pessoais como prioridade. De repente, o que se vislumbra diante dos olhos acaba sendo mais do mesmo de séculos de história nacional. De um exercício político democrático que se coloca acima do próprio pilar que o sustenta, que é a soberania popular. A política só existe por ela, sem povo não há palanque, não há discurso, não há voto, não há plataforma a ser defendida.

Então, olhando para as conjunturas atuais não sei quem está fazendo pior papel nessa história. Se os que estão à frente da gestão pública federal ou os que estão nos círculos do poder político, porque ambos estão negligenciando a população de todas as maneiras possíveis e inimagináveis. Tripudiando sobre o desespero e o desalento de milhões de brasileiros que só fazem viver um dia de cada vez.

E eles sabem muito bem que o tempo é inimigo dessa situação. Quanto mais ele corre, mais complexas ficam as questões. Mais desespero pelas vacinas.  Mais desemprego. Mais miséria. Mais inflação. Mais juros. Mais escassez de água. Mais risco de apagões elétricos. Mais temor de desabastecimento agropecuário. ... Por isso, o povo tem pressa. Ela representa o que lhe resta de sentimento nesse mar de caos e de loucura. Enquanto seus corações saltam pela boca de aflição desatinada é sinal de que ainda estão vivos. Vejam só, a que ponto chegamos!

Ao permitir tamanha deterioração e desconstrução das estruturas governamentais, por ausência de planejamentos consistentes e embasados técnica e cientificamente, o governo brasileiro afetou a estabilidade e a sustentabilidade da sua governança, expondo o país a riscos e desafios, muitos deles, desnecessários. Entre insuficiências e o emprego equivocado de recursos financeiros, criou-se obstáculos de gestão gravíssimos, os quais têm repercutido diretamente sobre as políticas públicas.

E aí, quem paga o ônus desse processo é sempre a população. Mas, até quando? Essa pergunta precisa sim, ser feita, porque a conta está prestes a não fechar. O cenário socioeconômico brasileiro está cada vez mais desalentador, o que significa que cada vez mais pessoas podem menos, agravando o potencial de impacto sobre a sociedade. Um exemplo disso é a Pandemia, quando milhares de pessoas perderam seus postos de trabalho, seus planos privados de saúde e passaram a compor as fileiras assistenciais do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e do Sistema Único de Saúde (SUS).

Quanto mais se acirram as adversidades, mais dependentes das políticas públicas se torna a população e mais investimentos são necessários para atendê-la nas suas demandas emergenciais. Mas, como? Se o recurso governamental advém de impostos e a arrecadação tende a cair abruptamente nesses contextos. Por isso, o desarranjo do país precisa ser estancado o mais rapidamente para evitar o colapso total das engrenagens.

Não dá mais para a classe política se esconder ou se omitir diante dos fatos. Os erros cometidos já estão postos para quem quiser ver. As urgências estão batendo à porta insistentemente. Portanto, não é hora de retóricas vãs, é hora de ação, de enfrentar os problemas na raiz de sua causa. Afinal de contas, política tem tudo a ver com Direitos Humanos, com dignidade humana, com respeito humano.

Está faltando coerência ao Brasil. Ele sai por aí fazendo discursos, assumindo compromissos, e o mundo aguarda pelas respectivas respostas. E, de repente, ele age na contramão, usa o direito de não fazer nada como resposta, tentando acreditar que não tem nenhum problema. Mas tem. Perde a credibilidade. Perde o espaço no campo diplomático e do comércio exterior. Perde dinheiro. Perde influência. E isso é gravíssimo, porque no fim das contas, “Nossas vidas começam a acabar no dia em que nos calamos sobre as coisas que importam” (Martin Luther King Jr. – ativista político norte-americano e pastor de igreja protestante). 


quinta-feira, 9 de setembro de 2021

Apenas, uma questão de prioridade...


Apenas, uma questão de prioridade...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Apesar das ondas de reverberação dos acontecimentos de 7 de setembro, a insatisfação diante da inconsistência das respostas institucionais, aos gravíssimos insultos à Democracia, o movimento de clamor popular me parece distante da consciência necessária para sua efetividade.

Isso porque, como bem escreveu o professor e geógrafo, Milton Santos, “A força da alienação vem dessa fragilidade dos indivíduos, quando apenas conseguem identificar o que os separa e não o que os une”. E é exatamente isso, o que está operando na sociedade brasileira neste momento.

Fruto de camadas de desigualdade dispostas cuidadosamente ao longo dos séculos, o resultado inevitável disso é a desagregação manifesta por uma visível incapacidade dialógica de unir esforços em prol de um objetivo comum, de fundamental importância para todos. Pelo o que me vem à mente, talvez, em um único momento da história nacional isso foi rompido, no Movimento das Diretas Já.

Exaustos pelos “anos de chumbo” que já duravam duas décadas, partidos políticos, representantes da sociedade civil, artistas e intelectuais se dispuseram a colocar suas diferenças ideológicas de lado para defenderem conjuntamente os interesses Democráticos do país.

Assim, eles conseguiram mobilizar, entre 1983 e 1984, milhões de pessoas em comícios e passeatas nas principais cidades brasileiras. Só no Rio de Janeiro, em 1984, reuniram um milhão de cidadãos em comício na Candelária.

Sob um mesmo palanque discursavam as mais diferentes posições político-ideológicas do país, tais como: Tancredo Neves, Leonel Brizola, Miguel Arraes, José Richa, Ulysses Guimaraes, Franco Montoro, Dante de Oliveira, Mário Covas, Gerson Camata, Orestes Quércia, Luiz Inácio Lula da Silva, Eduardo Suplicy, Roberto Freire, Luís Carlos Prestes, Fernando Henrique Cardoso, Heráclito Fontoura Sobral Pinto (jurista), Sócrates (jogador de futebol), Christiane Torloni (atriz), Mário Lago (ator), Gianfrancesco Guarnieri (ator), Fafá de Belém (cantora), Chico Buarque (cantor), Taiguara (cantor), Beth carvalho (cantora), Martinho da Vila (cantor), Osmar Santos (locutor esportista), Juca Kfouri (jornalista esportivo).  

Dentre as principais pautas que impulsionaram o movimento estavam a perseguição política, o cerceamento das liberdades, a retomada das eleições diretas para os cargos majoritários – Presidente, Governador, Prefeito e Senador, e a ineficiência econômica, com uma inflação que chegava a 211%.

Isso significa que sempre há um momento em que as questões pessoais se tornam tão insignificantes e tão pouco representativas, diante da gravidade que obstaculiza a sobrevivência de todos, que não resta outro caminho senão agregar as forças e combater o inimigo comum. É preciso entender, de uma vez por todas, que a desagregação só favorece à perpetuação dos problemas. Como explica a Física, vetores na mesma direção; mas, em sentido oposto, se anulam. Simples assim.

Dada a gravidade da conjuntura atual, então, não interessa o que cada um fez no verão passado. O foco tem que estar centrado no que realmente importa que é a sobrevivência do país. Só a Pandemia, que já arrastou para o túmulo mais de meio milhão de brasileiros, seria motivo suficiente para não se ater em desavenças inúteis. Mas, há muito mais, necessitando de ações contundentes a serem resolvidas pela força do espírito coletivo.

Quem nunca ouviu falar sobre o “Dilema do Porco Espinho”, do filósofo alemão Arthur Schopenhauer 1? Ou buscamos uma trégua as divergências, a partir de um ponto de equilíbrio que nos une verdadeiramente, ou as conjunturas irão se tornar cada vez piores e mais complexas. Está claro que o atual governo não pretende retroceder nos descaminhos que escolheu trilhar, então...

Não se esqueça, “O inimigo inteligente ataca, exatamente, onde você acha estar a salvo” (Pearl Harbor, 2001). Por isso, o fato de abrir mão de algo, temporariamente, por um objetivo maior, não significa uma ruptura definitiva com suas crenças e valores. Não significa se deixar frágil ou vulnerável.

Muito pelo contrário. A vida é repleta de momentos em que certas escolhas são imperiosas para a sobrevivência adiante. E reconhecer isso é de extrema importância; sobretudo, para a consolidação do processo evolutivo humano. O amanhã depende do hoje, do agora.

sábado, 4 de setembro de 2021

O esporte posto em xeque


O esporte posto em xeque

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

A indignação é amarga; mas, talvez, sem ela não se consiga descortinar certas verdades que se escondem por aí. Nem só de paz, harmonia e amizade entre os povos se constrói a competição que enaltece o mais rápido, o mais alto, o mais forte. Por trás do ideário olímpico, o qual também sustenta o paralímpico, se começa a conhecer a face obscura das medalhas.

O excesso de rigor em relação ao doping ou quaisquer outros instrumentos que venham beneficiar o desempenho dos atletas, é uma marca presente na Olimpíada (Paralimpíada) da era Moderna. Entretanto, mal sabiam os atletas, jornalistas e torcedores que a igualdade desportiva poderia estar em risco por outras vias.

Embora existam as regras para cada desporto e árbitros, que se orientam por elas, posicionados adequadamente para validar e dirimir eventuais dúvidas que possam surgir no ato da disputa, isso não é tudo. Há um júri de apelação que pode ser acionado pelas equipes, em caso de contestação dos resultados. No entanto, esse recurso fere diretamente o princípio de igualdade competitiva e não permite a quem foi penalizado se manifestar.

Que o diga o atleta brasileiro, Thiago Paulino, competidor do arremesso de peso, categoria F57, nessa Paralimpíada, quando lhe foi retirado o primeiro lugar, depois de uma apelação manifesta por um atleta chinês. Não só faltaram informações precisas do júri de apelação a respeito do caso, como o prazo de análise ocorreu muitas horas depois do término da disputa. Ocasionando, inclusive, atraso na cerimônia de premiação, ocorrida no dia seguinte à prova.

Então, tudo isso faz pensar. Querendo ou não, os jogos Olímpicos e Paralímpicos são oriundos dos interesses de pessoas importantes e influentes nas sociedades dominantes do mundo. Ainda que haja uma participação quase que maciça das delegações desportivas de todo o planeta, advém desse grupo seleto, o Comitê Olímpico Internacional (COI), o poder organizacional de todo o evento.

Portanto, há uma tendência natural de que os Jogos Olímpicos e Paralímpicos sejam delineados pela perspectiva dos países hegemônicos do mundo. É sob a luz de suas crenças, valores e interesses que tudo é pensado. Sem contar que as escolhas dos respectivos representantes no COI e demais entidades envolvidas são baseadas na influência política, porque eles precisam ser bons interlocutores para visibilizar a melhor imagem de sua nação.

Não é à toa que, aqui e ali, se percebam a formação de grupos representativos em determinados desportos; de modo que, romper essas bolhas é quase um ato desafiador. Não se trata apenas de superar a consagração de estruturas técnicas, táticas e de performance dos atletas; mas, do olhar mais condescendente e favorável das equipes de arbitragem para eles. Sob o argumento de uma subjetividade que não só envolve a análise e interpretação dos árbitros; de certo modo, flexibilizam o teor das regras e das contestações de maneira desigual. 

Em síntese, esse movimento encoberta perversas distorções e sutis tendenciosidades, beneficiando alguns em detrimento de outros. Porque quaisquer tentativas de contestação podem acabar silenciadas, como aconteceu com o atleta brasileiro, na medida em que as próprias regras criam subterfúgios para se absolver de suas próprias condutas antiéticas e contraditórias ao ideário do evento.

Infelizmente, os Jogos Olímpicos e Paralímpicos são mais que uma vitrine do cenário geopolítico mundial. Olhe para as bandeiras tremulando no alto do pódio e busque nos quadros de medalhas a quantidade de vezes que isso aconteceu. Não há grandes surpresas. Não há grandes alternâncias de destaque.  

Mais do que uma eficiência competitiva nas quadras, ginásios, arenas, piscinas, ... são jogos de eficiência de poder. Ainda que de maneira subliminar, os desempenhos de alguns estão sim, baseados em velhas e novas alianças. Quem assistiu ao filme Raça (Race) 1, de 2016, compreende isso muito bem.

Apesar da indignação, da frustração, do desapontamento, ou qualquer outra tentativa de definição para o que possamos estar compartilhando com Thiago Paulino, nesse momento, houve uma sucessão de vitórias que ultrapassam quaisquer medalhas.

Primeiro, porque ele venceu. Contra tudo e contra todos. Ele arremessou mais longe, mais forte, e todos viram. Os presentes ou aqueles pelas lentes poderosas das câmeras.

Segundo, porque retiramos as máscaras da hipocrisia. Ficou muito claro que não basta vencer, não basta dizer que há igualdade, não basta... Os Jogos Olímpicos e Paralímpicos nos mostraram que permanecem existindo para a reafirmar os pilares que sustentam as identidades nacionais e revelam a sua distinção.

Por fim, a maior das vitórias foi termos dado o primeiro passo na ruptura com a submissão secular. O pódio de Thiago Paulino ficou marcado na história. Braço direito erguido no ar, punho cerrado, e toda a simbologia de enfrentamento e resistência contra as injustiças, as desigualdades, as opressões. Chega de silêncio. Chega de apatia. Chega de subserviência. Não precisamos necessariamente de palavras para nos expressar, só precisamos de atitude. Porque o esporte foi posto em xeque, mais uma vez.

Agora, não temos mais dúvidas de que, em qualquer tempo, em qualquer lugar, em qualquer situação, é preciso se posicionar, questionar a nossa própria identidade, ressignificar e reafirmar os nossos próprios valores e crenças, redimensionar o nosso papel no mundo. Só assim, será possível ocupar o nosso verdadeiro lugar, ainda que, tentem nos impedir ou nos silenciar.   

sexta-feira, 27 de agosto de 2021

Contra o quê? Contra quem?


Contra o quê? Contra quem?

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Às vezes, tenho a nítida impressão de que a humanidade manifesta uma visão romantizada da guerra, como se tudo transcorresse a partir de um ideário de força e poder, com todos os seus heróis e vilões, ocupando espaços determinados nas linhas de enfrentamento.

Mas, a verdade é que não é bem assim. Se o mundo evoluiu, é obvio que as guerras também. Nesse sentido, os instrumentos bélicos se aprimoraram a tal ponto que deram origem a uma poderosa indústria armamentista, que depende dos movimentos geopolíticos conflituosos para faturar cifras inimagináveis; mas, também, vê com bons olhos os conflitos de menor proporção.

É, caro (a) leitor (a), há quem fomente os distúrbios e as animosidades para favorecer a produção e o comércio de armas. E para esse fim, a narrativa proposta por essa “indústria da destruição” é a de que não se precisa despender horas e horas de diálogo, a fim de se chegar a um denominador comum para as divergências; basta se valer da exibição e utilização dos arsenais bélicos, que estão cada vez mais requintados e letais.

O que em síntese, significa que a vida perdeu totalmente a sua importância, passando a ficar gravemente exposta, sempre a um triz da fatalidade. De modo que as sociedades estão cada vez mais presas ao agora, porque o amanhã é um refém involuntário da violência.

Não se engane, as guerras estão em todo lugar. Países. Polícias. Milícias. Afetos e desafetos. Próximos e distantes. Em qualquer esquina. A qualquer hora do dia ou da noite. Alianças que se desfazem e refazem ao sabor dos interesses da ocasião. Afinal, essa indústria não pode parar. E assim, ela realmente não precisa aguardar a deflagração de uma desavença de grandes proporções para manter a sua contabilidade em dia.

Nesse contexto, a retórica armamentista se aprimora de maneira muito consistente, porque atinge os pontos nevrálgicos da sociedade e acena como uma solução rápida e eficaz. A começar pelo fato de que ela transforma vulneráveis em valentões. Dá visibilidade a quem, certamente, poderia passar despercebido.

A arma na mão agiganta uma superioridade que nem sempre existe, mas que surge pelo tênue limite entre a vida e a morte. Sua propriedade significa status, na medida de um poder aquisitivo suficiente para ter e manter esse tipo de artefato. O que explica a falência flagrante dos discursos e intenções em nome da pacificação social.

Não, não é sem razão, portanto, a resistência que tem havido no combate e mitigação dos discursos de ódio social, os quais quase sempre resultam na exacerbação da violência armada. Aqui e ali as ocorrências, registradas ou não, dão conta de episódios de misoginia, sexismo, aporofobia, homofobia, xenofobia, racismo ou etarismo1. Sem contar os casos relacionados às diferenças ideológicas, de caráter político e religioso, ou aqueles resultantes de outros delitos, como tráfico de drogas, por exemplo.

Afinal de contas, a violência armada possibilita uma recorrência que não tarda a favorecer uma naturalização desses acontecimentos. As vidas perdidas jazem tão perfeitamente nas planilhas estatísticas dos obituários que, a sociedade passa por esses números sem percebê-los ou questioná-los. Esquecendo-se de que, diante da banalização da violência armada, quando qualquer motivo é motivo para a beligerância, ninguém está a salvo de ser uma vítima em potencial.

Tanto que o historiador britânico, Eric Hobsbawm, escreveu “Uma previsão: a guerra no século 21 provavelmente não será tão assassina como era no século 20. Mas a violência armada, criando sofrimento e perdas desproporcionais, continuará onipresente e endêmica – ocasionalmente epidêmica – em grande parte do mundo. A perspectiva de um século de paz é remota”.

Por isso, quando vejo a imprensa mundial se desesperando com a situação da retomada do Afeganistão pelo Talibã, penso que cabe uma reflexão profunda a respeito. A verdade é que a grande questão que impera ali, começa bem antes do Talibã e do seu radicalismo extremista.

É preciso entender que as guerras e os conflitos armados não cabem em recortes de tempo, há uma linha histórica condutora até se alcançar o apogeu da beligerância. O que explica as idas e vindas de personagens distintos; ora aliados, ora adversários, e raras às vezes, meros espectadores.

Sendo assim, aqui, ali ou acolá, não dá para desperdiçar atenção as fotografias, aos “frames”, é preciso ver o filme inteiro para entender o que se sucede naquele ponto. Daí é preciso paciência e disposição, pois cada novo acontecimento vai exigir sempre uma recapitulação da história.

Mas, no fim de cada ato desse processo de releitura, não há como fugir do fato de que a síntese que se apresenta tende a manifestar sempre a seguinte compreensão, ou seja, “Através da violência você pode matar um assassino, mas não pode matar o assassinato. Através da violência você pode matar um mentiroso, mas não pode estabelecer a verdade. Através da violência você pode matar uma pessoa odienta, mas não pode matar o ódio. A escuridão não pode extinguir a escuridão. Só a luz pode” (Martin Luther King Jr.).

Diante de todas essas considerações, então, só posso concordar com as palavras do físico e astrônomo, Marcelo Gleiser, quando ele diz que “Há algo de muito patológico numa espécie que se diz inteligente, mas só é capaz de garantir sua sobrevivência pelo acúmulo de armas”.

Porque, no fim das contas, “O que, na verdade, oprime o espírito, o que provoca inquietudes e desassossegos, é a pobreza mental. Poderemos ser ricos economicamente, mas se não somos capazes de oferecer, a nós mesmos, as enormes vantagens que a riqueza do conhecimento pode proporcionar, haverá muita miséria dentro de nossos palácios ou de nossas vestes” (Gonzalez Pecotche – educador e pedagogista).



1 Misoginia – ódio ou aversão às mulheres.

Sexismo - discriminação e ou preconceito baseada no gênero ou sexo de uma pessoa.

Aporofobia – repúdio, aversão ou desprezo pelos pobres ou desfavorecidos; hostilidade para com pessoas em situação de pobreza ou miséria.

Homofobia – é o preconceito contra pessoas LGBTQIA+ (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, trans, queers, pansexuais, agêneros, pessoas não binárias e intersexo).

Xenofobia – é a desconfiança, temor ou antipatia por pessoas estrangeiras.

Racismo – discriminação e ou preconceito (direto ou indiretamente) contra indivíduos ou grupos por causa da sua etnia ou cor.

Etarismo – preconceito contra os idosos.