É
preciso mais atitude!
Por
Alessandra Leles Rocha
Entendo que a transição de
governo, dessa vez, não se deu da forma adequada; mas, da forma possível.
Acontece que, agora, o governo eleito e empossado, é o governo. Então, não cabe
aceitar a morosidade, a má vontade, a resistência ou a falta de empenho, que ainda
transita, através de certos grupos, dentro da esfera governamental. Afinal,
isso não foge aos olhos de nenhum cidadão minimamente observador e perspicaz.
Através de silêncios, de
atitudes, de falas dissimuladas, a política do boicote, do quanto pior melhor,
se acotovela para tentar se afirmar. A pergunta é: até quando? Esses
comportamentos começam a macular e a comprometer o compromisso empenhado pelo
atual governo em não errar. Se há quem não se sinta confortável, ou capaz, ou
desimpedido de alguma forma, para fazer parte desse gigantesco trabalho de
reconstrução, o que se espera é o mínimo de hombridade para declinar do papel
em nome de quem possa cumpri-lo a contento.
Confesso que a situação dos
Yanomamis, por exemplo, já começa a causar desgaste. Primeiro, porque a
situação de abandono e crueldade com os povos originários, no Brasil, não
remonta de 2023. Ela é histórica. E ao longo de décadas é sim, de conhecimento
público, o acirramento da sua degradação. No entanto, paira no ar a impressão
de um pisar em ovos, em relação aos garimpeiros e exploradores ilegais, que se
apropriaram da região indígena e tem levado ao extermínio milhares deles.
Segundo, porque estamos falando
de subnutrição no mais importante nível de seres humanos em diferentes faixas
etárias. Estamos falando de acometimento grave de doenças tropicais e de
doenças trazidas pela contaminação de mananciais hídricos e do solo pelo
mercúrio. Estamos falando de todo tipo de violência física, psicológica, sexual
e patrimonial. Estamos falando da ilegalidade no seu sentido mais bruto e
aviltante, ou seja, o desrespeito das leis e das autoridades legitimamente
responsáveis pelo país. E se tudo isso não for importante, não for urgente, não
for grave, o que será?
Enquanto se caminha a passos
lentos, comedidos, a morte assola sem distinção. O que me deixa intrigada, no
sentido, de perceber que o atual governo não estava, portanto, tão bem
informado a respeito do assunto, como deveria estar. Essa era uma prioridade
para ser enfrentada desde o primeiro dia; pois, seres humanos estavam morrendo.
Vidas ceifadas que estavam se juntando aos milhares que o país havia perdido em
outros campos de desolação, como a COVID-19 e a violência urbana.
O país tinha que estar mais bem
inteirado da situação, com um plano de emergência nas mãos, com os responsáveis
definidos e incumbidos de suas missões. Acontece que, mais uma vez, nesse
recorte temporal recente, tem-se a percepção de um excesso de diplomacia, de
dialogia, de mesuras e rapapés, na hora de confrontar quem não está nem aí para
o país. Como se o Estado brasileiro é que tivesse que pedir licença para os
criminosos para cumprir o seu dever constitucional. Êpa! Como assim? Isso é a
mais completa subversão da legalidade, do bom senso, da lógica democrática. E
por quê agir assim, hein?
Daqui e dali, já não é difícil
perceber a quantidade de obstáculos, sendo colocados propositalmente para se
interpor ao fluxo natural, no qual deveria navegar o país. Então, não pode o
governo se permitir trabalhar desacelerando o ritmo para não entrar em embate direto
com essas forças. Caso contrário, ele será vencido pelo desgaste que representa
o chamado arrastar de correntes. Sim, porque isso cansa, desestimula, frustra.
Como diz o provérbio, “Água mole em pedra
dura, tanto bate até que fura”, e o Brasil tem que ser uma corrente
caudalosa de água, nesse momento, para romper os desafios e consolidar seus
objetivos.
Por isso, não raras às vezes, fico
pensando onde foi parar a compreensão do que traz a bandeira nacional na sua
inscrição de “ordem e progresso”,
quando verifico tais comportamentos acontecendo, em pleno século XXI. As
correntes que nos arrastaram para o retrocesso, para o conservadorismo
retrógrado, e que agora tentam se firmar a todo custo pelas mãos da direita e
seus simpatizantes, são as mesmas que promoveram a destruição generalizada que
assolou o país, nesses últimos quatro anos.
E enquanto aqui, uns e outros,
não aceitam a realidade dos fatos e se desvirtuam pelos caminhos desvairados da
insurreição, o mundo lá fora aposta alto no Brasil, como, há tempos, não
acontecia. Sinais de que acreditam que a fênix brasileira pode sim, ressurgir
das cinzas e contribuir significativamente com o mundo, sob diferentes
aspectos.
Daí a necessidade de o governo
brasileiro assumir, de fato, o seu protagonismo, tomando as decisões que
precisam ser tomadas, no tempo exato. Submeter-se ao mau humor inconformado da
direita e seus simpatizantes é um erro crasso que não pode sequer ser cogitado.
Como diz o provérbio português, “Se
gostou, gostou; se não gostou, coma menos”. Sobretudo aqueles que são
funcionários públicos, a compreensão de que estão na condição de funcionários
de Estado e não de governo tem que prevalecer. E mesmo os que foram, por alguma
razão, convidados a participar, precisam se valer da ética para permanecer.
Pois, na medida em que se permite
emergir esse tipo de ruído no governo, abre-se a possibilidade de que os
problemas ganhem vultos ainda maiores, através da mídia. Ora, muito do que
chega aos ouvidos dos veículos de comunicação e informação, na
contemporaneidade, são factoides. Quando inadvertidamente eles se sobrepõem aos
fatos, a tendência natural é manipular a verdade em si e induzir aos erros de
interpretação, favorecendo um certo tipo de opinião enviesada e pouco
comprometida com a realidade.
E para um governo que tem enfrentado, desde a campanha eleitoral, uma oposição belicosa e inconsequente, a necessidade de se posicionar de maneira clara e contundente é fundamental, em todos os momentos. Não pode haver espaços entre linhas e entrelinhas. O que se pensa, o que se diz, o que se faz, tudo deve estar devidamente ajustado e coerente às circunstâncias e ao arcabouço jurídico-institucional em vigência. Porque “A verdadeira medida de um homem não se vê na forma como se comporta em momentos de conforto e conveniência, mas em como se mantém em tempos de controvérsia e desafio” (Martin Luther King Jr.).