Quando a terra treme...
Por Alessandra Leles Rocha
Enquanto
o mercado, no Brasil, revira os olhos a cada fala do Presidente da República
sobre aspectos da economia nacional, é interessante perceber como uma
significativa parcela da imprensa se permite atuar como um cardume alinhado às
ideias da direita, na mais completa concordância vociferante 1.
Afinal
de contas, tal comportamento não condiz com o fato de terem plena consciência de
que ele fala do alto de quem já ocupou o cargo por duas vezes e, se não
enfrentou os mesmos desafios de agora, teve que lutar contra outros não menos
complexos e difíceis. A diferença atual, é que ele chega para a governança de
um país massacrado pela obsessão do ideário da direita e de seus simpatizantes.
Tanto,
que é fácil identificar como a balança das análises está visivelmente desequilibrada.
Todos lançam olhares, discursos e comentários de reprovação às considerações e
manifestações do Presidente da República; mas, onde está a mesma conduta em
relação as personagens que guiaram a economia do país, na última gestão?
Sim,
porque não se pode esquecer que os problemáticos desarranjos econômicos foram
intensificados, nos últimos quatro anos, e que o fato de a Pandemia ter figurado
no cenário, não é dela a responsabilidade majoritária pelos resultados. Baixa
atividade econômica. Juros nas alturas. Retorno triunfante da inflação. Desemprego
e precarização do trabalho. Isolamento diplomático. ... São alguns dos fenômenos
trazidos pela política econômica do governo anterior, que não trouxeram retorno
algum para o país; mas, que deixaram uma herança bastante ruim para os próximos
anos.
A
insatisfação dos direitistas brasileiros é tão grande que eles não se contêm em
si mesmos! Desde o resultado das eleições, em outubro de 2022, é isso. Todos os
dias, eles lançam seus balões de ensaio, repletos de tensões especulativas para
sustentarem a sua oposição. O que faz transparecer uma obstinada tentativa de
encobrir os seus próprios desacertos, equívocos e incompetências, já
devidamente registrados nas páginas da história nacional, desviando o foco para
o outro que nem bem deu início ao ritmo dos trabalhos. Afinal, só se passaram
37 dias desde a cerimônia de posse, em 1º de janeiro deste ano.
Daí
eu fiquei pensando a respeito, até que me deparei com a avalanche de notícias
sobre o terremoto de 7,8°, na escala Richter, que afetou além da Turquia e da
Síria 2, regiões do epicentro sísmico, outros
países como o Líbano, o Iraque, a Jordânia, a Geórgia, a Armênia e o Chipre. O insólito
atacou novamente!
Cada
vez que a raça humana é surpreendida pela fúria indomável das tragédias naturais,
o mais lógico e óbvio deveria ser parar e refletir profundamente. Situações como
essa desconstroem sumariamente quaisquer percepções materialistas e desumanas
que regem o mundo, na maioria do tempo. Nessas horas críticas, o ser humano
retoma o posto de protagonista da vida. É sobre o tênue limiar entre sobreviver
e morrer que os olhos do mundo se fixam sobre toneladas de escombros, de
sofrimentos, de desesperos, de dores.
Nessas
horas, o amanhã amplia a sua incerteza. Será que o pior já passou? Será que
novas tragédias estão por vir? Será que ainda resta algum sobrevivente? Será
que haverá espaço para atender a todos? Será que o atendimento médico será
suficiente? Será que a comida e os remédios satisfarão as demandas? Será ...? Será
...? Será ...?
É
por isso que tudo para. Conflitos históricos. Guerras em curso. Disputas geográficas.
Silêncios diplomáticos. Relações comerciais interrompidas 3.
Todos os planejamentos, todas as políticas, todas as estratégias, ficam em
suspenso por tempo indeterminado. A economia é obrigada a se guiar pelas
trilhas do possível, não dos interesses desses ou daqueles. Mas, todos estão
cientes de que as perdas são inevitáveis e que a reconstrução é essencial. As
prioridades passam a ser imediatamente reavaliadas. Não são os lucros que estão
sobre os pratos da balança; mas, as vidas que precisam ser acolhidas,
preservadas, cuidadas.
De
modo que olhar para eles, para suas tragédias humanas, traz um choque de
realidade para as nossas rusgas pequeno burguesas. Enquanto o mundo treme, implode,
a direita brasileira e seus simpatizantes tocam harpa, nos corredores do
Congresso Nacional, da Bolsa de Valores e onde mais estejam discutindo o seu
descontentamento com as falas do Presidente da República. Ah, faça-me o favor! É muito, para aguentar!
Se
ainda não deu para entender, o mundo há tempos deixou de ser um lugar de
certezas. Como dizia a canção, “[...] Tudo
muda o tempo todo no mundo [...]” 4.
Há tempos se vive aos sobressaltos pela força do imponderável e ainda querem
acreditar que o ser humano tem controle sobre alguma coisa? Nem sobre o
imaterial. Nem sobre o material. Nossos planos estão cada vez mais fadados a
falhar, a não se concretizar como foram pensados. Porque o mundo não flutua
mais na imensidão azul do céu, ele balança de um lado para outro. De repente. Num
piscar de olhos. E ninguém, absolutamente ninguém, pode detê-lo.
Não pense que isso é uma apologia a irresponsabilidade, a inconsequência, a imprudência ou ao descuido, porque não é. Só não dá para cobrar uma rigidez, uma previsibilidade, que está longe de ser plena, de ser completa, diante da realidade que se descortina no mundo e que ultrapassa o domínio de ação do ser humano. Nenhum país está a salvo. Nenhuma economia. Nada. Porque epidemias, vulcões, terremotos, maremotos, tsunamis, furacões, tempestades, nevascas, incêndios, ... a natureza, nas suas mais diferentes expressões, pode decidir mudar as regras do jogo sem consultar ninguém. Então...
3 https://oglobo.globo.com/mundo/noticia/2023/02/terremoto-na-turquia-e-na-siria-tremor-de-terra-deixa-mortos.ghtml
4 Como uma onda (Zen-Surfismo) – Lulu Santos / Nelson Motta (1983) - https://www.letras.mus.br/lulu-santos/47132/