segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

Quando a terra treme...


Quando a terra treme...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Enquanto o mercado, no Brasil, revira os olhos a cada fala do Presidente da República sobre aspectos da economia nacional, é interessante perceber como uma significativa parcela da imprensa se permite atuar como um cardume alinhado às ideias da direita, na mais completa concordância vociferante 1.

Afinal de contas, tal comportamento não condiz com o fato de terem plena consciência de que ele fala do alto de quem já ocupou o cargo por duas vezes e, se não enfrentou os mesmos desafios de agora, teve que lutar contra outros não menos complexos e difíceis. A diferença atual, é que ele chega para a governança de um país massacrado pela obsessão do ideário da direita e de seus simpatizantes.

Tanto, que é fácil identificar como a balança das análises está visivelmente desequilibrada. Todos lançam olhares, discursos e comentários de reprovação às considerações e manifestações do Presidente da República; mas, onde está a mesma conduta em relação as personagens que guiaram a economia do país, na última gestão?

Sim, porque não se pode esquecer que os problemáticos desarranjos econômicos foram intensificados, nos últimos quatro anos, e que o fato de a Pandemia ter figurado no cenário, não é dela a responsabilidade majoritária pelos resultados. Baixa atividade econômica. Juros nas alturas. Retorno triunfante da inflação. Desemprego e precarização do trabalho. Isolamento diplomático. ... São alguns dos fenômenos trazidos pela política econômica do governo anterior, que não trouxeram retorno algum para o país; mas, que deixaram uma herança bastante ruim para os próximos anos.

A insatisfação dos direitistas brasileiros é tão grande que eles não se contêm em si mesmos! Desde o resultado das eleições, em outubro de 2022, é isso. Todos os dias, eles lançam seus balões de ensaio, repletos de tensões especulativas para sustentarem a sua oposição. O que faz transparecer uma obstinada tentativa de encobrir os seus próprios desacertos, equívocos e incompetências, já devidamente registrados nas páginas da história nacional, desviando o foco para o outro que nem bem deu início ao ritmo dos trabalhos. Afinal, só se passaram 37 dias desde a cerimônia de posse, em 1º de janeiro deste ano.

Daí eu fiquei pensando a respeito, até que me deparei com a avalanche de notícias sobre o terremoto de 7,8°, na escala Richter, que afetou além da Turquia e da Síria 2, regiões do epicentro sísmico, outros países como o Líbano, o Iraque, a Jordânia, a Geórgia, a Armênia e o Chipre. O insólito atacou novamente!

Cada vez que a raça humana é surpreendida pela fúria indomável das tragédias naturais, o mais lógico e óbvio deveria ser parar e refletir profundamente. Situações como essa desconstroem sumariamente quaisquer percepções materialistas e desumanas que regem o mundo, na maioria do tempo. Nessas horas críticas, o ser humano retoma o posto de protagonista da vida. É sobre o tênue limiar entre sobreviver e morrer que os olhos do mundo se fixam sobre toneladas de escombros, de sofrimentos, de desesperos, de dores.

Nessas horas, o amanhã amplia a sua incerteza. Será que o pior já passou? Será que novas tragédias estão por vir? Será que ainda resta algum sobrevivente? Será que haverá espaço para atender a todos? Será que o atendimento médico será suficiente? Será que a comida e os remédios satisfarão as demandas? Será ...? Será ...? Será ...?

É por isso que tudo para. Conflitos históricos. Guerras em curso. Disputas geográficas. Silêncios diplomáticos. Relações comerciais interrompidas 3. Todos os planejamentos, todas as políticas, todas as estratégias, ficam em suspenso por tempo indeterminado. A economia é obrigada a se guiar pelas trilhas do possível, não dos interesses desses ou daqueles. Mas, todos estão cientes de que as perdas são inevitáveis e que a reconstrução é essencial. As prioridades passam a ser imediatamente reavaliadas. Não são os lucros que estão sobre os pratos da balança; mas, as vidas que precisam ser acolhidas, preservadas, cuidadas.

De modo que olhar para eles, para suas tragédias humanas, traz um choque de realidade para as nossas rusgas pequeno burguesas. Enquanto o mundo treme, implode, a direita brasileira e seus simpatizantes tocam harpa, nos corredores do Congresso Nacional, da Bolsa de Valores e onde mais estejam discutindo o seu descontentamento com as falas do Presidente da República. Ah, faça-me o favor!  É muito, para aguentar!

Se ainda não deu para entender, o mundo há tempos deixou de ser um lugar de certezas. Como dizia a canção, “[...] Tudo muda o tempo todo no mundo [...]” 4. Há tempos se vive aos sobressaltos pela força do imponderável e ainda querem acreditar que o ser humano tem controle sobre alguma coisa? Nem sobre o imaterial. Nem sobre o material. Nossos planos estão cada vez mais fadados a falhar, a não se concretizar como foram pensados. Porque o mundo não flutua mais na imensidão azul do céu, ele balança de um lado para outro. De repente. Num piscar de olhos. E ninguém, absolutamente ninguém, pode detê-lo.

Não pense que isso é uma apologia a irresponsabilidade, a inconsequência, a imprudência ou ao descuido, porque não é. Só não dá para cobrar uma rigidez, uma previsibilidade, que está longe de ser plena, de ser completa, diante da realidade que se descortina no mundo e que ultrapassa o domínio de ação do ser humano. Nenhum país está a salvo. Nenhuma economia. Nada. Porque epidemias, vulcões, terremotos, maremotos, tsunamis, furacões, tempestades, nevascas, incêndios, ... a natureza, nas suas mais diferentes expressões, pode decidir mudar as regras do jogo sem consultar ninguém. Então...


4 Como uma onda (Zen-Surfismo) – Lulu Santos / Nelson Motta (1983) - https://www.letras.mus.br/lulu-santos/47132/