Aberta
a temporada do “Me engana que eu gosto”
Por
Alessandra Leles Rocha
Um dos grandes
desafios da contemporaneidade tem sido as Fake
News, na medida em que são criadas e disseminadas com fins específicos de
desestabilização, mobilização, e/ou desorganização das estruturas sociais para
atender a interesses de determinados indivíduos, grupos ou instituições. E no
Brasil, não é diferente.
Nos últimos três anos
essa prática tem se intensificado e produzido efeitos desastrosos em vários
campos da vida cotidiana, particularmente, no tocante à Pandemia. Mesmo assim,
declarações do próprio Presidente da República dão conta do seu apreço às Fake News, sob argumentos que retiram
delas quaisquer parâmetros de ofensividade prejudicial às boas relações
sociais. Segundo ele, eventuais distorções e manipulações da verdade são de
natureza trivial da vida e, por isso, as pessoas já deveriam estar habituadas a
elas. Pena, que não seja bem assim.
Então, diante das
notícias do dia, me deparei com algo de importância reflexiva nesse contexto.
Foi noticiado que o governo federal anunciou recursos na ordem de 450 milhões
para serem gastos em propaganda, a título de resgatar a sua imagem e
popularidade. A ideia é contrapor o trabalho informativo sério das mídias de
comunicação, que vem apontando sem filtros a dinâmica atual da realidade
brasileira ao cidadão, oportunizando uma análise crítica a respeito dos
acontecimentos. Assim, a notícia chega com ares do velho “jeitinho brasileiro” para consolidar a imagem de uma realidade
paralela por vias nada ortodoxas de informação.
Pode ser que, sob
diversos aspectos, o cidadão esteja se comportando de um modo voluntariamente crédulo
e irresponsável diante dessas notícias enviesadas e tendenciosas que circulam pela
internet, através das redes sociais. Mas, quando o assunto é o cotidiano, no
seu sentido mais prático, os parâmetros de análise se ampliam à revelia das
opiniões terceirizadas, porque quase sempre “dói
no bolso” os impactos.
É o custo de vida “pela hora da morte”. É a necessidade de
estabelecer cortes drásticos nas despesas do dia a dia; sobretudo, supérfluos e
prazeres. De modo que não se precisa ser um expert
em finanças e economia para enxergar adequadamente o que acontece na fila
do banco, do supermercado, da padaria, do açougue, ... E não para por aí.
O “arrastar de correntes” promovido pela
gestão da Pandemia no país, também, representa um desgaste palpável para o
cidadão. Ele vê outros países seguindo em frente, buscando recuperar o ritmo do
desenvolvimento, e se vê estagnado por medidas erráticas de caráter
insuficiente e ineficiente, como se o objetivo fosse mesmo o “quanto pior melhor”. E sabendo muito
bem quem vai pagar o preço dessa conta, ele sobrevive aos dilemas impostos por
essa realidade caótica de um vírus perigoso e desconhecido que persiste na sua
jornada destrutiva.
Ele, então, tenta
espairecer a cabeça quente de tantos problemas, mas o calor do ambiente não lhe
permite essa graça. É! Falta chuva, falta água, falta vento, enquanto sobram
incêndios florestais e desmatamentos por todo o país, alterando com severidade
os padrões climáticos e aumentando o preço das tarifas de energia elétrica e o
risco de eventuais interrupções de fornecimento.
Reservatórios superficiais
e subterrâneos estão evaporando a olhos vistos, elevando o risco de
desabastecimento de água para a população a um nível iminente. E quando digo
população, são todos os estratos sem exceção. É toda a cadeia produtiva sem
exceção. São todas as demandas humanas sem exceção.
Portanto, tomando por
base apenas essas questões, já é possível perceber que a perda de popularidade
do governo não é uma questão de perspectivas expressas por veículos de
informação e comunicação. Não se trata de ser A, B ou C, influenciando ninguém
a ser contra ou a favor, muito pelo contrário.
São fatos. São
realidades vivenciadas diariamente, em níveis de impacto negativo maiores ou
menores; mas, que, não são invisíveis ou imperceptíveis para ninguém. No cerne
dessa seara cotidiana, o indivíduo é, portanto, o autor das suas próprias
conclusões e o protagonista das suas decisões. Mesmo que seu exercício de
cidadania ainda permaneça como um rastro vestigial.
No fim das contas,
falar de milhões sobre publicidade governamental é “o fim da picada”. Nem parece que estamos falando do país que quer
pagar 39 bilhões de precatórios em 2022, ao invés dos 90 bilhões previstos, a
fim de ter condições de aumentar o valor do programa Bolsa Família. Sim, porque
diante do aumento exponencial de cidadãos em condição de vulnerabilidade,
conforme apontam as taxas de desemprego e pobreza nacionais, esse benefício
saiu da condição de despesa supérflua para o status de suma importância. Do
país que vive no limite do respeito ao teto de gastos, porque não consegue se
desvencilhar das suas práxis perdulárias crônicas. ...
De modo que, mais do
que indecoroso um gasto de 450 milhões nesse cenário apocalíptico que o país
vive, ele é simplesmente de uma ineficácia total. Na medida em que os problemas
nacionais já alcançaram os limites da sobrevivência, extinguindo-se quaisquer
possibilidades de aceitação de um universo paralelo.
Uma idealização,
nesse ponto das conjunturas, beira as raias do ridículo e, ao contrário de
apaziguar, só faz acirrar os ânimos. Porque a ruptura com equilíbrio lança as
pessoas para longe de suas zonas de conforto, exigindo-lhes uma adaptação para a
qual, nem todos, estão adaptados ou têm condições de se adaptar.
Por sorte, como dizia o próprio fundador da BBDO, uma das maiores agências de publicidade do mundo, “Para o bem ou para o mal, suas palavras são a sua propaganda. Todas as vezes que abre a boca, você revela o que existe em sua mente”. Desse modo, quaisquer Fake News travestidas de propaganda populista não perderão a sua identidade, a sua essência. Isso significa, então, que apesar dos esforços em distribuir “lentes cor-de-rosa” aos cidadãos, por meio da mídia, os resultados de declínio de popularidade do governo estão lançados ao risco de serem ainda maiores e mais rápidos. Afinal de contas, “O que é bom se vende por si só, o que é ruim faz propaganda de si” (Provérbio Africano).