terça-feira, 31 de janeiro de 2023

Uma histórica sombra nefasta sobre o Brasil


Uma histórica sombra nefasta sobre o Brasil

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Assim pensa a direita e sua trupe. Sem constrangimentos. Sem pudores. Sem meias palavras. Essa gente faz questão de ostentar a sua incivilidade como instrumento de poder. Foi assim, durante a Segunda Guerra Mundial. É assim, agora. E se nada for feito para conter tamanha fúria, será assim, no futuro.

Entretanto, tal comportamento abjeto deixa claro, bem claro, que o rol de pessoas ligadas ao massacre e dizimação dos povos yanomamis, em Roraima, é bem maior do que parece e se associa a figuras dos diferentes entes da federação, ou seja, Municípios, Estado e União. Cada um com o seu quinhão de responsabilidades, diretas e indiretas, nessa monstruosidade social.

A fala do governador do estado de Roraima a um veículo de comunicação e informação nacional, por exemplo, é como um portal do tempo, em que se é lançado abruptamente aos idos de 1500, tamanho o negacionismo e o espírito depredatório presentes em suas palavras. Ele lança o povo Yanomami ao mais baixo nível de objetificação, em uma tentativa repugnante de justificar a desimportância social dessas pessoas para o país 1.

O que fez vir à tona a lembrança de uma descrição feita por Anne Frank, em seu diário nos tempos do nazismo, “Criticam tudo, e quero dizer mesmo tudo, sobre mim: o meu comportamento, a minha personalidade, as minhas maneiras; cada centímetro de mim, da cabeça aos pés, dos pés à cabeça, é objeto de mexericos e debates. São-me constantemente lançadas palavras duras e gritos, embora eu não esteja habituada com isso. Segundo as autoridades, eu deveria sorrir e aguentar”. Talvez, seja a mesma impressão e percepção dos Yanomamis. Como se tivessem nascido para não existir, ficando à disposição de serem propriedades dos poderosos, servindo-lhes e satisfazendo seus interesses, inclusive, os mais inomináveis.

Essa guinada saudosista imposta pela direita e sua trupe é estarrecedora! Ao invés do mundo buscar a reafirmação do que fez de melhor, de mais produtivo, de mais criativo, até aqui, ele revira os baús para trazer de volta o seu pior, o seu lado mais sombrio e desumano, a sua face mais odiosa e desprezível. E esse comportamento adquire ares ainda mais pesados e insuportáveis, porque ele teve que se ajustar e tentar fazer caber no contexto de uma realidade totalmente diferente; mas, não menos tóxica.

Pois é, infelizmente, ao juntar passado e presente o resultado se potencializou negativamente. O mundo comandado pelas forças cientificas e tecnológicas; sobretudo, no campo dos meios de informação e comunicação, não só acirraram o individualismo, o narcisismo e o egoísmo humano, como, também, possibilitaram a disseminação em larga escala dessas expressões e manifestações. De modo que ficou muito mais fácil espalhar essas ideias destrutivas e beligerantes, por aí.

Com a roda do tempo girando freneticamente, o ser humano foi consumido por uma fatídica e crônica falta de tempo para dar vazão a sua existência integral. Portanto, não se trata necessariamente de culpabilizar a fragilidade educacional quanto ao recrudescimento da estupidez, da ignorância. O fiel dessa balança é o tempo. Cada vez mais escasso pelo excesso de atividades e compromissos que se digladiam entre si na captura da atenção humana. 

O que em termos cognitivos e intelectuais coloca os indivíduos cada vez mais distantes das análises críticas e reflexivas, para alinhá-los ao efeito manada contemporâneo. Eles leem as manchetes, mas não os conteúdos e formam suas opiniões a partir da fragilidade de linhas que nem sempre dizem o essencial. Sob a máxima de não perderem o seu tempo, eles deixam de opinar, de escolher, de decidir, para se sujeitarem às opiniões, escolhas e decisões alheias já preestabelecidas.

Considerando que aqueles que controlam os meios tecnológicos são os mesmos que controlam toda a sociedade, eles conseguem manter o comportamento humano sob rédeas curtas, sem maiores tensões, agitações e rebeldias. Gota a gota, eles disseminam as suas ideologias através das ferramentas tecnológicas e virtuais, de modo que facilmente elas se incorporam no inconsciente coletivo, sem transpirar quaisquer preocupações sobre eventuais desdobramentos e consequências que possam emergir desse movimento.

É com base nesse cenário que a direita brasileira e sua trupe acreditam que podem fazer e acontecer sem a menor resistência. Que tendo eles o poder social, político e econômico, nas mãos, a sua empreitada obterá total êxito. Mas será? Excesso de confiança, de convicção, de certeza é sempre algo temerário, considerando que vida em si é atravessada pelo imponderável. Haja vista o próprio exemplo da segunda Guerra Mundial, não é mesmo?

Só posso dizer que, nesse momento, a exaustão de testemunhar os acontecimentos em tempo, quase real, é imensa e repleta de uma aura de tristeza, de dor, de indignação. É difícil de acreditar que um ser humano seja capaz de tamanha brutalidade, desprezo e covardia com seu semelhante, em nome da cobiça, da ganância, do poder 2.

Por isso, queria mesmo era fechar os olhos e só os abrir com a luz da justiça sendo feita, cumprida, exaltada.  Mas, por enquanto, o que resta é debruçar reflexivamente sobre o que disse Albert Camus, “Vou-lhe dizer um grande segredo, meu caro. Não espere o juízo final. Ele realiza-se todos os dias”. Afinal, “Não espere por uma crise para descobrir o que é importante em sua vida” (Platão) e na vida de seu país.


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