À
sombra do ilusionismo retórico nacional
Por
Alessandra Leles Rocha
Uma passada de olhos por alguns
veículos de informação 1 e
começo a acreditar que as expectativas deles não eram por um presidente e sim,
um mágico. Não, não é piada. Acontece que diante do cenário brasileiro, em que
o governo passou quatro anos fixamente preocupado em se reeleger, não é difícil
lembrar como toda a estrutura governamental foi desmantelada em nome dessa
ambição, incluindo a economia.
Vamos lá, a experiência pregressa
de dois outros mandatos não pode ser utilizada de maneira absoluta como
critério comparativo. Primeiro, pela obviedade da relação espaço-tempo. São
inúmeras variáveis distintas nesse contexto, tanto dentro quanto fora do país.
Segundo, pelas próprias conjunturas do processo eleitoral e de transição de
governo, que foram duramente inflexibizadas pela gestão que se findava. O que é
sim, um fator limitante para dar tratos à bola de um novo projeto.
Depois, apontem números que
contradigam aqueles, vexatórios da economia, no recorte entre 2019 e 2022. A
gestão econômica do antigo governo foi totalmente pautada para atender aos
interesses do mercado financeiro, tendo em vista as origens do próprio Ministro
e o Presidente do Banco Central (BACEN); bem como, de seus corpos técnicos de
assessores mais próximos. De modo que basta se debruçar por algumas horas sobre
matérias publicadas por veículos de comunicação e informação, tradicionais ou
independentes, para refrescar a memória desses tempos ariscos.
Por favor, se abstenham de tentar,
pela milionésima vez, lançar sobre os ombros da Pandemia todos os fracassos e
impossibilidades, porque ela não foi um evento exclusivo ao Brasil. O mundo
sofreu, e ainda sofre, seus desdobramentos e consequências; mas, coube a cada
país dentro da solidez da sua política econômica lidar e superar os desafios
emergidos. De modo que deu a lógica, os mais bem preparados enfrentaram de uma
forma muito melhor do que aqueles piores preparados, como foi o caso
brasileiro.
Mas, centrando foco mais precisamente
em 2022, o ano eleitoral, quando foi necessária toda uma articulação política
entre o governo vitorioso na eleição e o legislativo federal para que fosse
aprovada uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 2
para suprir não só demandas importantes de campanha, como o Bolsa Família, por
exemplo; mas permitir recursos iniciais para a governança, tendo em vista que
vários ministérios mal teriam dinheiro para pagar despesas operacionais, no
início de 2023.
Aliás, já se esqueceram dos
famigerados contingenciamentos de recursos para a Educação, Saúde e outros
ministérios, ocorridos entre 2019 e 2022? Enquanto a gastança corria solta em
setores privilegiados, sem quaisquer sinais de reprovação de A, B ou C. Portanto,
não estou entendendo como podem alguns cidadãos se mostrarem desentendidos ou
desinformados, quando a verdade dos fatos sempre esteve à disposição,
diariamente, a qualquer um minimamente interessado.
Em 03 de janeiro, eu já fazia uma
previsão de que esse movimento surgiria no ar, quando escrevi o texto “Seja paciente! ” 3.
A ideia era destacar que era preciso dar tempo ao tempo; pois, “Quem viveu o pós-guerra, ou quaisquer
outras catástrofes, sabe bem como esse é um processo lento e gradual, quando
são necessários muita paciência, muito planejamento, muito trabalho, para
reconstruir, plantar e começar a colher”.
E como nunca me deixei levar por
achismos, especulações, futurologia, ou simplesmente, maledicência oportunista,
a ideia da reconstrução nacional se viu amplificada de uma maneira surreal,
quando dos acontecimentos em 12 de dezembro e 8 de janeiro, na capital federal,
cujo teor antidemocrático e anticidadão, expôs a necessidade de investir tempo,
trabalho e recursos humanos e materiais do novo governo. Frente a inúmeras
demandas importantes, reais, urgentes, e o país obrigado a decompor, ainda
mais, seus esforços nessa linha de frente tão absurda.
Como cantava Raul Seixas, “Sonho que se sonha só / É só um sonho que
sonha só / Mas sonho que sonha junto é realidade”. Portanto, de que lado
estamos? Observado certos movimentos da elite brasileira, incluindo esse, de
colocar em xeque a confiabilidade do atual governo, a ideia me parece reafirmar
ruidosa e raivosamente que o Brasil do futuro deve ser de um futuro que nunca chega
4. Por isso, esticam a corda da
impaciência, plantando desconfianças aqui e ali, subestimando decisões,
imputando incompetência e incapacidade a torto e a direito, contrariando
radicalmente seus comportamentos na gestão anterior, quando eram a expressão
máxima da condescendência e da permissividade.
Cabe ao cidadão, então, lembrar-se
de que, “Aquele que não conhece a verdade
é simplesmente um ignorante, mas aquele que a conhece e diz que é mentira, este
é um criminoso” (Bertolt Brecht - A vida de Galileu, 1938). Assim, não se
preste ao papel de veículo multiplicador de nada que não esteja alinhado a
verdade dos fatos, a tudo aquilo que, de um jeito ou de outro, afeta e
atravessa a sua vivência cotidiana. Não se permita descansar à sombra do
ilusionismo retórico de plantão. Pense e reflita. Exercite sua autonomia
intelectual.