É melhor
prevenir do que remediar?
Por Alessandra
Leles Rocha
É melhor prevenir do que remediar.
Assim diz o provérbio. Mas por aqui, em Terra Brasilis parecemos não levar
muito a sério essas palavras e acabamos por viver em constante apagar de
“incêndios”.
Sim, em maior e em menor escala, o
brasileiro não é um sujeito precavido. O amanhã, o depois, sempre lhe parece a
melhor solução para tudo. Aí, quando a coisa não dá certo e a situação aperta,
só lhe resta posar de vítima das circunstâncias e choramingar suas pitangas,
como se não tivesse nenhuma parcela de responsabilidade sobre o assunto.
Vejam a Febre Amarela que assola alguns
estados brasileiros e o corre-corre que se formou para a vacinação. Este é um
grande exemplo da nossa displicência imprevidente. Como diz a canção,
"Moro num país tropical / Abençoado por Deus / E bonito por natureza (mas
que beleza)..."1;portanto, deveríamos (nós e nossos governantes) nos atentar para o fato
de que essa tal "tropicalidade", também, acarreta certo número de
doenças, tais como: MALÁRIA, DENGUE, DOENÇA DE CHAGAS, LEISHMANIOSE,
ESQUISTOSSOMOSE, TUBERCULOSE, HANSENÍASE 2.
Algumas dispondo de
vacinação preventiva, outras não; mas, a verdade é que se existem há sempre um
risco iminente de surto 3 e/ou epidemia 4, principalmente pelo descontrole dos agentes
transmissores e do estreitamento das faixas limítrofes entre as zonas urbanas e
rurais, o que facilita o trânsito da doença. Em busca de água, abrigo e
alimento, é cada vez mais comum o aparecimento, proliferação e adaptação dos
agentes transmissores para as regiões mais urbanizadas do país.
Por isso, deveríamos
nos atentar mais a essas questões. Mas, o que se percebe é que nem mesmo os
profissionais de saúde dispõem de uma formação que contemple com mais seriedade
a chamada Medicina Tropical, aquela voltada para as infecções ou moléstias
tropicais. Na verdade, quando se trata da trivialidade médica do país, nossos
profissionais parecem estar diante do mais inusitado. Quantos são realmente
capazes de identificar um acidente ofídico, por exemplo, apenas pelo sinal da
mordida do animal? Sabe, isso é importantíssimo nos serviços de emergência,
porque nem sempre a vítima tem como descrever ou apresentar in loco o
animal, para que possa receber os cuidados e o soro antiofídico apropriado.
Quantos conhecem na prática os sintomas e repercussões evolutivas das
doenças tropicais? Basta ver a confusão que houve quando a Dengue, a
Chikungunya e a Zika disputaram palmo a palmo o espaço no cenário
epidemiológico nacional e a dificuldade de se estabelecer um diagnóstico
preciso era evidente entre os profissionais de saúde. Então, diante de um
quadro típico para a realidade do país, a população enfrenta tamanho desafio e
acaba por padecer na falta de assistência adequada, em pleno século XXI.
Um século depois da
Revolta da Vacina 5, ocorrida pela disseminação da
ignorância da população, o que dizer sobre o que vivemos agora? Talvez, uma
pequena porcentagem ainda possa se abrigar no argumento da ignorância; mas, e o
restante? Pesa sobre a maioria a ideia condicionada de que estamos no século
XXI e este nos trouxe a proteção necessária e suficiente contra esses males do
passado, deixando nas páginas da história o seu registro.
Há sempre quem
argumente que a carência de fármacos e técnicas específicas para o combate das
doenças no passado era a causa das epidemias devastadoras, como se quisessem se
abster da responsabilidade sanitária que compete a cada um em particular.
Quando na verdade, o sucesso do controle epidemiológico depende de cada elo
envolvido no processo, ou seja, cidadãos, profissionais de saúde, técnicas e
tecnologias, medicamentos, instrumentos de análise, profilaxia e
controle.
Assim, não é o fato de estarmos em pleno século
XXI, rodeados pelos mais modernos aparatos da ciência e da tecnologia, que
doenças (sobretudo, as tropicais) são coisas do passado. As demandas de uma
sociedade com mais de 207,7 milhões de pessoas, no caso do Brasil, contribuem
inevitavelmente com o processo de impacto ao meio ambiente. A cada passo que a
urbanização, a expansão das fronteiras agrícolas e a industrialização avançam,
o processo de estruturação social esbarra no equilíbrio ecológico e nos expõem
aos riscos de doenças, as quais estavam, até então, confinadas aos ambientes
naturais, ou seja, áreas de matas e florestas. Diante da ação antrópica no
ambiente, a prevenção das doenças deveria, portanto, ser uma prioridade
contínua e não esporádica como vem sendo tratada ao longo das
décadas.
Aliás, a realidade
contemporânea vem impondo, não só ao Brasil, mas ao mundo inteiro, desafios
imensos em relação ao que se entende por vigilância epidemiológica (agravos e
doenças), vigilância sanitária (agentes químicos, físicos e biológicos que
possam ocasionar doenças e agravos) e vigilância ambiental (monitoramento da
exposição de indivíduos ou grupos populacionais a um determinado agente
ambiental, considerando os efeitos subclínicos ou pré-clínicos por ele
causados). A globalização, o crescimento do fluxo migratório voluntário e
involuntário, a existência de armas químicas e biológicas de destruição em
massa, tudo isso coloca todos os seres humanos em risco iminente.
O fato de sermos
capazes de produzir vacinas e/ou medicamentos, de dispormos de equipamentos,
tecnologias e mão-de-obra para o combate dos agentes transmissores, não
representa motivos para nos vangloriarmos como vimos até agora. As medidas de
controle e fiscalização de fronteiras é que precisam ser periodicamente
revistas e aprimoradas; bem como, aquelas voltadas à educação e a
conscientização da população. Saúde pública é parte de uma educação cidadã, a
qual se sabe não existe em nosso país. Se fôssemos mesmo cidadãos, saberíamos o
valor da prevenção e sempre trabalharíamos por ela. Não precisaríamos ser
convocados, lembrados, estimulados; isso já faria parte da nossa consciência,
do nosso compromisso individual e coletivo. Então, o melhor remédio é
educar!
3 Surto: acontece quando há o aumento repentino do
número de casos de uma doença em uma região específica. Para ser considerado
surto, o aumento de casos deve ser maior do que o esperado pelas
autoridades.... - Veja mais em https://educacao.uol.com.br/disciplinas/geografia/surto-epidemia-pandemia-e-endemia-entenda-qual-e-a-diferenca-entre-eles.htm?cmpid=copiaecola.
4 Epidemia: a epidemia se caracteriza quando um
surto acontece em diversas regiões. Uma epidemia a nível municipal acontece
quando diversos bairros apresentam uma doença, a epidemia a nível estadual
acontece quando diversas cidades ... - Veja mais em https://educacao.uol.com.br/disciplinas/geografia/surto-epidemia-pandemia-e-endemia-entenda-qual-e-a-diferenca-entre-eles.htm?cmpid=copiaecola