A arte de
lançar as sujeiras debaixo do tapete
Por
Alessandra Leles Rocha
Ao contrário do que muitos
pensam, os radicais e extremistas contemporâneos, que adoram apostar na
política do medo e da insegurança, quanto mais expostos às incertezas da vida
mais se exasperam e deixam evidentes as suas fragilidades e vulnerabilidades.
É simples, basta observar como as
situações críticas amplificam, por exemplo, o derrame de Fake News nas
mídias sociais. Sem saber como lidar com a gravidade e urgência dos fatos,
esses indivíduos apelam para práxis disruptivas da estabilidade social. Foi
assim durante a pandemia. É assim na catástrofe antrópico-climática do Rio
Grande do Sul. ...
Quaisquer assuntos ou
acontecimentos que afetem, direta ou indiretamente, os seus interesses é
motivo, mais do que suficiente, para lançarem mão das estratégias nefastas e irresponsáveis
disponíveis na contemporaneidade. Como se criar uma realidade paralela,
idealizada, pudesse, de algum modo, atenuar ou interromper definitivamente o
curso da história.
Só que não. Não são as suas
vontades e quereres que determinam os eventos do mundo. No máximo, o que essas
pessoas têm conseguido fazer é catalisar efeitos exatamente contrários às suas
expectativas. Dentro desse contexto, muito tem sido falado a respeito do
negacionismo. Pois é, cada vez mais, certos elementos da sociedade querem que a
realidade seja validada segundo as suas próprias perspectivas.
Bem, isso é uma escolha que não
gira, necessariamente, em torno de conhecimento ou de ignorância; mas, de pura
vaidade e excessivo ímpeto de liberdade, tão comuns em tempos contemporâneos. Seja
porque motivo for, o que importa é que a realidade permanece com suas verdades
desconfortáveis batendo à nossa porta.
Vejam, o não vacinar não impede
que o vírus Sars-COV-2 ou quaisquer outros vírus, para os quais já existem
imunizantes disponíveis, continuem circulando livremente, por aí. Portanto, a
negação não interrompe o ciclo de adoecimento, de mortes e de eventuais
sequelas, entre os seres humanos.
A desconstrução das legislações e
protocolos ambientais não impede que os episódios de emergências climáticas
assolem o planeta, de diferentes maneiras. Portanto, a negação não interrompe o
recrudescimento e a intensificação das enchentes, dos desmoronamentos, da
elevação das águas oceânicas, do desmatamento, ... que têm consequências
devastadoras para a humanidade.
A criminalização das drogas não
impede que os usuários busquem caminhos alternativos para satisfazer o seu vício,
como sempre aconteceu na história da humanidade. Portanto, a negação não
interrompe os gatilhos que impulsionam a deterioração da saúde mental das
pessoas, fazendo-as utilizar drogas, lícitas e ilícitas.
Enfim. Tudo isso só faz, ou
deveria fazer, perceber que a verdade é bem mais potente e resistente do que a
mentira, a ilusão. O mundo não deixa de ser o que é por isso ou por aquilo. O fluxo
da vida não deixa de seguir seus caminhos porque uns e outros não querem que
seja assim. Tentar represar a dinâmica do planeta é desconsiderar o poder da
sua fúria incontrolável.
Decisões, escolhas, opiniões, ...
só resistem até a página dois. As conjunturas da vida têm uma capacidade de se
impor e de fazer acontecer, inimaginável. Não há dinheiro, no mundo, que
consiga domar esse fato. É como dizia o célebre colunista Ibrahim Sued, “os
cães ladram e a caravana passa” (Ditado Árabe).
O fato de vociferarem, de
derramarem o seu fel odioso pelos veios das mídias sociais e pelas esquinas da
vida, não significa que serão satisfeitas as suas aberrações delirantes. Não. O
mundo segue o baile. Se inventa, se reinventa, se descobre, se transforma.
Sempre dentro do que melhor lhe convém, do que lhe é pertinente.
E, talvez, esse seja o ponto de
reflexão. Porque significa que o mundo não se curva para satisfazer as vontades
de ninguém. Então, todas as expectativas, sonhos, idealizações, do ser humano
acabam se esvaindo pelo ralo. Por mais que façam e aconteçam, o resultado acaba
distante, anos luz, das projeções.
A cada volta completa que os
ponteiros do relógio realizam, muitas águas correm por debaixo das pontes,
muitas ondas se formam e desaparecem no oceano, ... De modo que nada na vida é
taxativo. Há muito mais incertezas do que certezas nos rodeando. Sem contar que
as respostas, sobre tudo o que é mais importante, não chegam necessariamente
por palavras.
Bem, há quem esteja apostando
todas as fichas na sua própria ilusão. Não se permitindo ver a realidade como
ela é, ou perceber os sinais que evitam os tropeços, os fracassos. E essa
tormenta de inquietude tende a ser o caminho mais curto para que essas pessoas
alcancem a sua própria ruína.
Sim, porque “O que não enfrentamos em nós mesmos encontramos como destino”, ou seja, “O homem que não atravessa o inferno de suas paixões também não as supera. Elas se mudam para a casa vizinha e poderão atear o fogo que atingirá sua casa sem que ele perceba. Se abandonarmos, deixarmos de lado, e de algum modo esquecermo-nos excessivamente de algo, corremos o risco de vê-lo reaparecer com a violência redobrada” (Carl Gustav Jung). Pensemos a respeito!