Há
5 anos...
Por
Alessandra Leles Rocha
Há 5 anos, a vereadora carioca
Marielle Franco e seu motorista Anderson foram mortos a tiros, na região
central do Rio de Janeiro. Mais um crime político para preencher as páginas da
história nacional? É o que tudo indica; mas, que ainda não se tem uma resposta
plena da justiça a respeito. De modo
que, por enquanto, orbita ao redor dele apenas a certeza de que a sua maior
motivação foi o ódio.
Não é de hoje que, no Brasil, o
ódio é marcado pelas mais diferentes formas de silenciamento. Silenciam pela
ameaça. Silenciam pelo discurso. Silenciam pela desqualificação. Silenciam pela
obstaculização e inacessibilidade. Silenciam pela violência. Pelo menos em
tese, tentam silenciar a tudo e a todos, que possam de algum modo lhes causar
desconforto, irritação ou contrariedade.
Porque “Quando é verdadeira, quando nasce da necessidade de dizer, a voz
humana não encontra quem a detenha. Se lhe negam a boca, ela fala pelas mãos,
ou pelos olhos, ou pelos poros, ou por onde for. Porque todos, todos, temos
algo a dizer aos outros, alguma coisa, alguma palavra que merece ser celebrada
ou perdoada pelos demais” (Eduardo Galeano). Por isso, nem mesmo a morte é
suficiente para silenciar.
No caso de Marielle, a voz se
transformou em eco. Seja pelo fato de que todo o ideário defendido por ela
tenha se tornado ainda mais intenso na materialidade das práxis cotidianas,
seja pelo fato de que o seu assassinato não foi devidamente respondido pela
justiça brasileira. Então, a voz contraria afrontosamente o silêncio para
reverberar sem fim. Marielle presente?
Sim. Sempre.
A verdade é que o silêncio não
quis entender, ou quem sabe admitir, que a voz de Marielle se tornaria a voz de
milhares de brasileiros. Gente que ela conhecia ou não. Gente que ela
representava ou não. Mas, gente que viu nela a humanidade que habita em cada um
de nós. Antes do rótulo de mulher, negra, bissexual, mãe, oriunda da periferia carioca,
ela ostentava o pavilhão de defensora dos direitos humanos, que abraça a
qualquer um que se reconheça munido dessa condição existencial.
A violência que tirou a vida de
Marielle se tornou, então, uma catapulta de visibilidade nacional e
internacional. A tentativa de silenciar Marielle a agigantou de uma maneira
inimaginada. Como escreveu Pablo Neruda, “E
a minha voz nascerá de novo, talvez noutro tempo sem dores, e nas alturas
arderá de novo o meu coração ardente e estrelado”. Para quem crê em
coincidências ou acasos, essas palavras mais parecem uma profética antecipação dessa
história, não é?
E como “Não há dores eternas, e é da nossa miserável condição não poder deter
nada que o tempo leva, que o tempo destrói: nem as dores mais nobres, nem as
maiores” (Florbela Espanca), a lenta ressignificação da vida, ao longo
desses 5 anos, colocou de pé seus familiares, seus amigos, seus colaboradores e
seus simpatizantes, a mover corajosamente as engrenagens do Instituto Marielle
Franco.
Liderado por sua irmã Anielle,
atual Ministra da Igualdade Racial, a organização sem fins lucrativos tem como
propósito fundamental “inspirar, conectar
e potencializar mulheres negras, pessoas LGBTQIA+ e periféricas a seguirem
movendo as estruturas da sociedade por um mundo mais justo e igualitário” 1.
O que significa que Marielle está
aí, viva, respirando, falando, sonhando e produzindo através de milhares de pessoas
e, de certa forma, trazendo nesse movimento um pouco de justiça a si mesma.
Pena que insuficiente para que a página triste possa ser, enfim, virada de vez.
Porque para isso a Justiça
precisa se cumprir por inteiro. Precisa falar todas as verdades, por mais podres
e indigestas que sejam, para completar o luto dessa história e, principalmente,
o luto de quem tem os dias presos, em suspenso, desde então. Pois, “A verdadeira paz não é apenas a ausência de
guerra, é a presença da justiça” (Jane Addams).