Desse
lado ou do outro. Em cima do muro não dá!
Por
Alessandra Leles Rocha
É plenamente compreensível a
singularidade que reveste o atual governo. As conjunturas do país, sejam elas
políticas, sociais ou econômicas, não são nem de longe as mesmas de 12 anos
atrás, quando se encerrou a segunda gestão do Presidente Lula. A flagrante
busca pela ascensão da ultradireita, mundo afora, chegou ao Brasil também. De modo
que a beligerância atravessou os espaços, os discursos, os comportamentos, as
ideologias, promovendo um verdadeiro rebuliço e tensionamento no país.
Daí as tentativas de pisar em
ovos para não agravar ainda mais, o que já está relativamente grave. E um dos
caminhos encontrados para colocar em prática esse distensionamento foi buscar
na habilidade da dialogia político-partidária os nomes para a composição do
governo. Acontece que nessa seara política, lobos e cordeiros se mimetizam de
maneira surpreendente, a tal ponto que conseguem dissimular as suas verdadeiras
ideias e intenções, em uma constante tentativa de se equilibrar em cima do
muro, aguardando o momento ideal para abdicar da sua persona.
Ocorre que no Brasil essa postura
nunca logra bom êxito. Nossos políticos são demasiadamente afoitos e
desajeitados para se manterem, por muito tempo, em cima do muro. Acometidos pela
verborragia clássica nacional, ou pelo narcísico desejo de visibilidade e de notoriedade,
ou pela pura convicção de esperteza na arte da política, eles acabam traídos por
sua genuína irreflexão e imprevidência. Haja vista a constante dança das
cadeiras entre os partidos, dado o constante desajustamento apresentado por
seus filiados.
Talvez, por isso, se torne tão difícil
estabelecer escolhas para construir uma governança minimamente susceptível a
erros, como os já cometidos em outros tempos. No entanto, diante da
disseminação maciça da direita e de seus matizes, mais ou menos radicais, no
último governo; bem como, todo o processo antidemocrático por ela fomentado, há
uma necessidade de separar o joio do trigo para evitar boicotes, obstáculos,
entraves desnecessários ao processo de reconstrução do país. As repugnantes e
absurdas práxis de outrora precisam ser efetivamente banidas do contexto
brasileiro para que se possa almejar uma perspectiva de futuro, de progresso,
de desenvolvimento.
Por isso é que, em dois meses de
governo, muitas mudanças foram tomadas nesse sentido. No entanto, cabe
ressaltar que ainda soam desconfortáveis certos episódios, os quais podem sim,
vir a representar um desgaste imenso para a imagem pública nacional e
internacional do governo 1. Razão
pela qual não há espaço para lançá-las sob o tapete da história, incorrendo no
risco de que os desdobramentos se tornem ainda piores do que os fatos em si.
Aliás, daqui e dali já se vê
sinais de fumaça, indicando a presença desconfortante do ideário da direita e
seus matizes, que marcou o ex-governo. Veja, por exemplo, o caso da lista de
nomes para o Conselho da Petrobrás, o qual foi alterado à revelia do próprio
governo, pelo Ministro de Minas e Energia, desalinhando ao perfil que poderia
atender a certos objetivos como a mudança na política de preços dos combustíveis,
a distribuição de dividendos, o processo de venda de ativos.
Para surpresa geral, o Ministro
que havia participado intensamente da campanha eleitoral vitoriosa do
Presidente da República, agora, indicava nomes ligados ao mercado financeiro e
totalmente favoráveis à privatização. Aliás, segundo veículos de comunicação e
informação, Bruno Bianco (Ex-Advogado Geral da União, no governo passado), atual
gerente sênior de relações do banco BTG Pactual, “foi responsável por articular junto ao Centrão e ao Ministro de Minas
e Energia, a lista de indicados do governo ao Conselho de Administração da
Petrobrás” 2. Fato que acabou
gerando total insatisfação no governo e adiando a assembleia de acionistas 3.
É preciso entender que a última
eleição brasileira colocou sobre a mesa nacional dois projetos de governança diametralmente
opostos, cujos resultados práticos podem ser aferidos junto às páginas recentes
da história nacional. Pois é, venceu a Democracia, a Cidadania, o Estado de
Direito, a Economia Verde, a Sustentabilidade Socioambiental, a Ciência, a Saúde,...
Então, tendo em vista que ninguém é obrigado a concordar ou defender essas
pautas, quem se sentir incomodado ou desajustado a elas no governo, deveria
sair, deveria se posicionar com dignidade e clareza a respeito. Ser oposição é
legítimo, desde que seja exercida no espaço correto. É preciso entender que uma
orquestra só dá espetáculo, só encanta a plateia, quando músicos e instrumentos
tocam afinados.