Promessas,
prioridades, necessidades... O impasse da LDO/2023
Por
Alessandra Leles Rocha
Enquanto muito se falou a
respeito do chamado Orçamento Secreto, ou Emenda do Relator, a Lei de
Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2023 passou bem mais despercebida pela
maioria da população. Acontece que é através dela que se tem o orçamento
disponível para a gestão do país. O que significa que as engrenagens da máquina
pública funcionam de acordo com o que ela permite.
Eis, então, que passado o pleito
eleitoral emergiu uma fragorosa discussão em torno da referida lei, agora sim,
apontando claramente para o tamanho da sua insuficiência para suprir as
promessas de campanha mais emergenciais do candidato vitorioso. Êpa! Como
assim? Fosse quem fosse o eleito, essa é uma questão que afetaria o novo
Presidente da República, ou não?
Independentemente se A, B ou C, o
problema estava posto desde agosto deste ano quando foi sancionada, com diversos
vetos, pelo governo federal. Todos sabiam e aceitaram aprovar uma LDO nesses
moldes absurdos, sob o pretexto de não extrapolar os limites de gastos; mas, se
permitindo ferir o cumprimento de gestão de áreas essenciais, tais como Saúde e
Educação.
Sem contar que promessas
eleitorais fizeram parte de todas as campanhas, sendo que muitas delas foram
semelhantes como, por exemplo, o caso da manutenção do Auxílio Brasil de R$600
e o aumento do salário mínimo, o qual foi motivo de muitos ruídos na reta final
das eleições. Promessas que colocaram em xeque urgentes demandas da população
frente a notória imprevisibilidade de recursos.
Pois é, aprovaram uma lei que
flagrantemente afetaria o cotidiano de milhões de brasileiros, enquanto,
mantinha intacto nas suas linhas, por exemplo, os recursos para o Orçamento
Secreto, o qual destina-se a custear projetos definidos por parlamentares sem
quaisquer identificações a respeito. Em suma, sem transparência.
Assim, o que, agora, no momento
da transição, se levanta em relação a LDO de 2023 como uma bomba fiscal é
preciso admitir que foi construída mediante a anuência de diversos atores da
gestão ainda em curso. Talvez, eles acreditassem que ela só explodiria nas mãos
da população, quando tivessem que pagar por tamanha imprevidência,
irresponsabilidade e descaso, por meio de medidas que lhes fossem ainda mais
amargas e cruéis, sem que nada pudessem fazer.
Portanto, me parece minimamente
razoável que parta deles, os atores envolvidos diretamente nesse processo, a mea culpa e a solução para todo esse imbróglio.
Assim como a gestão que foi democraticamente eleita nesse último pleito, aquela
que foi eleita em 2018 tem um compromisso constitucional assumido até 31 de
dezembro com a população brasileira. Isso significa que está com eles a
responsabilidade de desativar essa bomba e mitigar os agravos.
A total desatenção para o fato de
que o modo com o qual a LDO foi redigida e pensada ocasionaria,
inevitavelmente, o travamento da gestão pública e, por consequência, do desenvolvimento
socioeconômico do país, só faz reafirmar por si só a existência de dois Brasis,
nesses últimos quatro anos, ou seja, um real e um Brasil idealizado. Como se
isso pudesse ser possível, não é?!
Infelizmente, a maneira aviltante
com a qual a Constituição Brasileira de 1988 e demais legislações importantes foram
tratadas nessa atual gestão sinaliza o enviesamento e o acirramento da
desigualdade nacional. A verdadeira polarização que recrudesceu no país nesse período
foi entre ricos e pobres, ou os que têm direitos e os que não têm. De certa
forma, ela é, portanto, a síntese dessa LDO.
Criaram um documento disforme que
para alcançar alguma funcionalidade teria que ser remendado daqui e dali. Mas, como
dizia o poeta português Bocage 1, “pior a emenda que o soneto”! Afinal, a
questão é muito mais complexa do que se imagina. Não se restringe apenas aos
aspectos socioeconômicos nacionais; mas, sobretudo, aos internacionais. O mundo
não sinaliza com menos turbulência para 2023. A inflação ronda. A recessão
ameaça. A desaceleração industrial acena. Enfim...
Acontece que tudo isso não é
notícia de última hora! Todos já sabiam, ou ao menos deveriam saber, quando se
debruçaram a escrever a LDO. Quando se permitiram devanear de maneira tão
irresponsável. Aliás, um tipo de irresponsabilidade que foi requentado várias
vezes ao longo dessa gestão pública e referendado pelos mesmos atores. Não é à
toa que se chegou a esse resultado bizarro!