terça-feira, 8 de novembro de 2022

Manifestações Antidemocráticas. Uma elegia à desordem e ao retrocesso.


Manifestações Antidemocráticas.

Uma elegia à desordem e ao retrocesso.

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

As notícias que chegam sobre focos de antidemocracia, presentes no cotidiano nacional, após o fim do pleito eleitoral, me fazem pensar.  Estamos diante de maus perdedores! Nada muito além disso! Afinal, atitudes golpistas tendem a receber a resposta que merecem das leis, na medida em que se sustentam em bases ilegais, criminosas. Mas, de qualquer forma, elas fazem pensar; sobretudo, do ponto de vista socioeconômico que é exatamente o alicerce para o desenvolvimento e para o progresso.

Foi, e ainda é, irritante ver uns e outros, por aí, se apegando na pandemia como pretexto suficientemente forte para justificar a crise econômica que se estabeleceu no Brasil. Ora, não tivesse sido a política econômica desenhada tão errática, tão enviesada, tão fora da realidade, a essas alturas do campeonato, ainda que o vírus Sars-Cov-2 esteja circulando livremente entre a população, a situação seria bem menos cruel e perversa.

Toda vez que saio de casa me deparo com a tristeza de ver centenas de estabelecimentos comerciais fechados e seus imóveis para alugar, e fico pensando sobre quantas famílias aquela realidade dura se abateu. Sim, porque comerciantes, empresários, industriais, constroem sua sobrevivência e seu patrimônio com a ajuda de inúmeros funcionários, cada um desempenhando uma função importante no movimento das engrenagens do capital.

Acontece que essa dinâmica não existe somente dessa perspectiva. Fatores externos, nacionais e estrangeiros, podem impactar de maneira positiva ou negativa os diferentes ramos da economia nacional, num piscar de olhos. Nesse sentido, as instabilidades políticas têm sim, um papel relevante para deterioração do país tanto no campo da microeconomia quanto da macroeconomia.

Do mesmo modo que as questões socioambientais, quando nos deparamos com o recrudescimento cada vez mais amiúde dos eventos extremos do clima, os quais afetam diretamente a produção de alimentos e alocação de seres humanos sobre o planeta. Algo que, para o Brasil, deveria ser um assunto bastante familiar, considerando a importância da teia de atividades econômicas que sustenta o agronegócio nacional e, por consequência, os números do seu Produto Interno Bruto (PIB).

Daí a necessidade de um país equilibrado, com planejamento consistente, confiável, dialógico, para minimizar os riscos e os possíveis solavancos do caminho a fim de evitar prejuízos de ordem tão grandiosa que afetarão por décadas o seu desenvolvimento, o seu progresso e a sua participação no cenário globalizado. E se muitos fecharam as portas, imagine quantos não estão se virando do avesso para não seguir o mesmo caminho, hein?

Ocorre que muito daquilo que foi apresentado como cenário de melhora, nos últimos meses, não tinha bases efetivamente sólidas e tende a se desconstruir pela força das conjunturas; sobretudo, aquelas internacionais. De modo que o prognóstico para os próximos anos não é tão alvissareiro como se gostaria que fosse. O mundo deve enfrentar a perda de postos de trabalho, o acirramento da precarização laboral, a limitação na oferta de produtos, a instabilidade nas exportações e, particularmente, uma redução acentuada na arrecadação de impostos e tributos.

Pois é, não é hora de idealizações, de chiliques, de ataques histéricos ou de birra! Temos, por enquanto, uma guerra promovida pela Rússia contra a Ucrânia; mas, que já está inspirando outros atores a colocar as manguinhas de fora e acenar com beligerância a seu modo.

Temos um deslocamento humano cada vez mais acentuado, em razão das adversidades climáticas e dos conflitos armados. Temos fome. Temos miséria. Temos epidemias, ensaiando para se tornarem novas pandemias. Temos um mundo empobrecendo e impondo uma desconstrução paradigmática sobre o consumismo. ... E isso nos afeta. O Brasil não está imune ou isento das reverberações desses movimentos.

Então, será mesmo que são empresários, ou pseudoempresários, estes que já se descobriu estarem capitaneando os tais atos antidemocráticos 1, hein? Porque para carregar esse status eles deveriam ser mais bem informados, mais alinhados com a realidade contemporânea, para não colocar em risco o seu lugar social, o seu patrimônio, a sua influência, o seu poder. O dinheiro pode muito; mas, não pode tudo!

Inclusive, pensando na possibilidade de que, talvez, muitos deles, tenham um telhado de vidro imenso no que diz respeito ao modus operandi que aplicam sobre a gestão de seus negócios. Ora, não é difícil pensar que se eles propõem insuflar e manipular pessoas para desrespeitar as leis e as instituições do país, poderiam também, facilmente, fazer o mesmo no seu ambiente de atuação. Aliás, o Brasil é um país pródigo em manter na sua tradição histórica colonial os chamados criminosos do colarinho branco.

Porque impregnado no inconsciente coletivo nacional está a ideia de que tudo nesse país se resume e se resolve pelo fato de ter ou não dinheiro. De preferência, muito dinheiro. Talvez, isso até explique os motivos de o país ter embarcado no delírio alucinógeno de uma realidade paralela.

Afinal, a perspectiva que essas pessoas nutrem em relação ao cotidiano não condiz com a verdade dos fatos. Por isso, eles não respeitam nada e nem ninguém. O que lhes desagrada, lhes aborrece, lhes incomoda é, então, sumariamente invisibilizado, negado, desqualificado, desprezado e, se preciso for, afrontado até as raias da violência.

E diante de tudo o que temos visto, devo concordar com o Professor Milton Santos sobre o fato de que “A força da alienação vem dessa fragilidade dos indivíduos, quando apenas conseguem identificar o que os separa e não o que os une”. O Brasil não sabe ser inteiro. O Brasil é país, não é nação. Há 500 anos ele se arrasta aos pedaços sob o peso das desigualdades, das diferenças.

De modo que a síntese que se esconde nas entrelinhas dessa antidemocracia contemporânea é simplesmente que “Nunca na história da humanidade houve condições técnicas e científicas tão adequadas a construir o mundo da dignidade humana, apenas essas condições foram expropriadas por um punhado de empresas que decidiram construir um mundo perverso” (Milton Santos). Portanto, pense a respeito!