terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

As caras e as caretas do Nazifascismo no Brasil


As caras e as caretas do Nazifascismo no Brasil

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Os ódios contidos, ao longo de décadas, saíram do anonimato, dos véus de hipocrisia sob os quais se invisibilizavam. Bastou uma centelha de legitimidade discursiva, dentro do meio político nacional, para sentirem-se à vontade o suficiente. Não importa se as leis vigentes pregam o contrário, se o consenso de uma maioria significativa faz total oposição as suas investidas, fato é que agora eles resolveram, literalmente, barbarizar de cara lavada.

Com o total apoio das células fascistas espalhadas pelo mundo, através da direita e suas vertentes extremistas, o nazismo vem ganhando destaque nos veículos de informação e comunicação; bem como, nas mídias sociais. Há poucos dias, li a notícia de que “Blogueiro alemão condenado por negar Holocausto se abriga no Brasil” 1. Agora, foi a vez de um apresentador de podcast defender a existência de um partido nazista no Brasil que fosse reconhecido por lei 2.

Acontece que esses não são os primeiros e nem, tampouco, serão os últimos episódios, porque o problema não se resume a um conjunto limitado de indivíduos, em qualquer tempo. É preciso entender que se essas ideias estão se propagando é porque estão encontrando interlocutores disponíveis, afins.

Mas, além disso, não estão percebendo quaisquer iniciativas de controle e punição por parte dos órgãos do judiciário a esse respeito, o que faz do silêncio, nesse caso, um passaporte, e tanto, para a disseminação de prática delituosa tão grave.

Afinal de contas, se a lei n. º 7.716/1986, alterada pela lei n. º 9.459/1997, estabelece que “Serão punidos, na forma desta lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional” (art. 1º), considerando que houve a prática, a indução ou a incitação a tais crimes (art.20), a base delituosa para o nazismo já se configura.

Mas, se acrescido o parágrafo 1º do referido art. 20, ou seja, “Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo”, aí não resta mais dúvida.

Agora, tentar entender as razões que levam seres humanos a esse caminho é de uma vastidão complexa inatingível. Poder. Dinheiro. Notoriedade. Influência. São apenas algumas das pistas que auxiliam nessa busca. Então, me parece mais lógico e prático concentrar apenas no fato de que há gente sim, com tais pensamentos, transitando por aí e persuadindo mais e mais seguidores para suas intenções.  

Aliás, buscando mostrar isso pelo viés da ficção, o livro “Inferno” (2013), de Dan Brown, depois adaptado para o cinema em 2016, é um excelente ponto de partida. Uma leitura pelas entrelinhas da história, na perspectiva da personagem Bertrand Zobrist, torna possível traçar um paralelo interessante entre a ficção e a realidade contemporânea.

Aqui e ali, as raízes mais radicais e extremistas do mundo estão sempre tentando coaptar pessoas para os seus planos de poder. Suas narrativas, seus argumentos, suas teorias conspiratórias, se analisadas superficialmente são até aceitáveis; mas, é nas entrelinhas delas que está a chave do problema.

Porque essa é uma leitura que poucos se dispõem a fazer; portanto, eles são envolvidos por algo que não é exatamente o que pensam ser, tornando-se massas de manobra para projetos nada éticos ou morais.

Na verdade, as pessoas são pegas no contrapé das suas fragilidades, dos seus desafios, das suas agruras cotidianas, então, elas têm em si um flanco aberto para serem manipuladas à revelia de uma eventual resistência.

O curioso é que em relação ao Nazismo, ao Fascismo, eles já foram desnudados pela história. Suas intenções, seus planos, suas estratégias, suas conquistas e derrotas são de conhecimento público.

Portanto, o chamado elemento surpresa não funciona mais, tendo em vista que as conjunturas contemporâneas são outras e o registro pregresso dota a sociedade atual de informações, as quais não necessitam mais do que um piscar de olhos para gerar repulsa e indignação, até pelos mais crédulos e simplórios.

Não é à toa, então, que eu sempre saliento a importância das entrelinhas, porque é nelas que se concentra sempre o cerne da questão. Quando se fala em pós-verdade, por exemplo, nada se aproxima mais da ideologia nazifascista do que ela.

Ora, essas pessoas são experts em criar e modelar a opinião pública, desde os tempos das duas Grandes Guerras Mundiais - 1914-1918 e 1939-1945 -, a tal ponto que os fatos passam a ter menos importância ou influência que os apelos às emoções, às crenças e aos valores pessoais.

E não é isso, que as Fake News têm buscado avidamente, em pleno século XXI? Então, elas estão a serviço de quem? Se você respondeu das células nazifascistas espalhadas pelo mundo, através da direita e suas vertentes extremistas, então, BINGO! Pena que essas “mentirinhas” são só o ponto de partida desse ideário que tenta se reconsolidar.

Assim, embora eu, particularmente, considere esse movimento de restauração nazifascista como uma tentativa vazia, apenas mais um jeito de promover a alienação e a perda de foco sobre as prioridades contemporâneas através do medo, o que já acontece diariamente por outras vias do próprio cotidiano, uma coisa é fato, ele não perde o caráter da ilegalidade e precisa, por essa razão, ser contido nos rigores da lei.

Porque, infelizmente, já se sabe muito bem que as células nazifascistas não se contentam apenas com a manifestação discursiva, levando as suas expressões de ódio até as últimas consequências. Eles não se constrangem em atentar contra a lei, contra a ordem, contra a civilidade, contra a vida. Daí o perigo de deixá-los confortáveis e seguros para agir.

Queiram ou não admitir, por trás das estatísticas e das análises científicas contidas no último Atlas da Violência, publicado em 20213, pode-se extrair dos resultados traços marcantes da influência nazifascista que ronda o país. Racismo, Xenofobia, Misoginia, Sexismo, Aporofobia, Gordofobia, Intolerância religiosa, Homo e Transfobia são sim, expressões do radicalismo e do extremismo dos grupos ultraconservadores presentes no nazifascismo, que tentam se justificar por teorias como a Eugenia 4.

Por isso, preste atenção, “não viva no passado, não sonhe com o futuro, concentre a mente no presente” (Sidarta Gautama – Buda), porque é nele que tudo de bom ou ruim está próximo de acontecer a você. Os nazifascistas têm sempre um bom pretexto para destilar o seu ódio sobre qualquer um.

Então, enquanto colocam as pessoas focadas e absorvidas pelas questões disseminadas pelas suas células de ação, elas deixam de questionar e refletir sobre o que realmente importa. Elas ficam, então, sob o controle subliminar nazifascista. Temporariamente alijadas das suas obrigações, responsabilidades, escolhas e decisões, presas ao devaneio de tempos que deveriam ter ficado restritos as amareladas páginas da história.   

Assim, quando refletir sobre o Nazifascismo pense no que disse o poeta Mário Quintana, ou seja, “Na convivência, o tempo não importa. / Se for um minuto, uma hora, uma vida. / O que importa é o que ficou deste minuto, / desta hora, desta vida ... / Lembra que o que importa / ... é tudo que semeares colherás. / Por isso, marca a tua passagem, / deixa algo de ti, ... / do teu minuto, / da tua hora, / do teu dia, / da tua vida. ”.  Afinal de contas, “O mundo não foi feito no tempo, mas sim com o tempo” (Santo Agostinho).