As
caras e as caretas do Nazifascismo no Brasil
Por
Alessandra Leles Rocha
Os ódios contidos, ao longo de
décadas, saíram do anonimato, dos véus de hipocrisia sob os quais se
invisibilizavam. Bastou uma centelha de legitimidade discursiva, dentro do meio
político nacional, para sentirem-se à vontade o suficiente. Não importa se as
leis vigentes pregam o contrário, se o consenso de uma maioria significativa
faz total oposição as suas investidas, fato é que agora eles resolveram,
literalmente, barbarizar de cara lavada.
Com o total apoio das células
fascistas espalhadas pelo mundo, através da direita e suas vertentes
extremistas, o nazismo vem ganhando destaque nos veículos de informação e
comunicação; bem como, nas mídias sociais. Há poucos dias, li a notícia de que “Blogueiro alemão condenado por negar
Holocausto se abriga no Brasil” 1.
Agora, foi a vez de um apresentador de podcast
defender a existência de um partido nazista no Brasil que fosse reconhecido por
lei 2.
Acontece que esses não são os
primeiros e nem, tampouco, serão os últimos episódios, porque o problema não se
resume a um conjunto limitado de indivíduos, em qualquer tempo. É preciso
entender que se essas ideias estão se propagando é porque estão encontrando
interlocutores disponíveis, afins.
Mas, além disso, não estão
percebendo quaisquer iniciativas de controle e punição por parte dos órgãos do
judiciário a esse respeito, o que faz do silêncio, nesse caso, um passaporte, e
tanto, para a disseminação de prática delituosa tão grave.
Afinal de contas, se a lei n. º 7.716/1986,
alterada pela lei n. º 9.459/1997, estabelece que “Serão punidos, na forma desta lei, os crimes resultantes de
discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência
nacional” (art. 1º), considerando que houve a prática, a indução ou a
incitação a tais crimes (art.20), a base delituosa para o nazismo já se
configura.
Mas, se acrescido o parágrafo 1º
do referido art. 20, ou seja, “Fabricar,
comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos,
distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de
divulgação do nazismo”, aí não resta mais dúvida.
Agora, tentar entender as razões
que levam seres humanos a esse caminho é de uma vastidão complexa inatingível.
Poder. Dinheiro. Notoriedade. Influência. São apenas algumas das pistas que
auxiliam nessa busca. Então, me parece mais lógico e prático concentrar apenas
no fato de que há gente sim, com tais pensamentos, transitando por aí e persuadindo
mais e mais seguidores para suas intenções.
Aliás, buscando mostrar isso pelo
viés da ficção, o livro “Inferno”
(2013), de Dan Brown, depois adaptado para o cinema em 2016, é um excelente
ponto de partida. Uma leitura pelas entrelinhas da história, na perspectiva da
personagem Bertrand Zobrist, torna possível traçar um paralelo interessante
entre a ficção e a realidade contemporânea.
Aqui e ali, as raízes mais
radicais e extremistas do mundo estão sempre tentando coaptar pessoas para os
seus planos de poder. Suas narrativas, seus argumentos, suas teorias
conspiratórias, se analisadas superficialmente são até aceitáveis; mas, é nas
entrelinhas delas que está a chave do problema.
Porque essa é uma leitura que
poucos se dispõem a fazer; portanto, eles são envolvidos por algo que não é
exatamente o que pensam ser, tornando-se massas de manobra para projetos nada
éticos ou morais.
Na verdade, as pessoas são pegas
no contrapé das suas fragilidades, dos seus desafios, das suas agruras
cotidianas, então, elas têm em si um flanco aberto para serem manipuladas à
revelia de uma eventual resistência.
O curioso é que em relação ao Nazismo,
ao Fascismo, eles já foram desnudados pela história. Suas intenções, seus
planos, suas estratégias, suas conquistas e derrotas são de conhecimento
público.
Portanto, o chamado elemento
surpresa não funciona mais, tendo em vista que as conjunturas contemporâneas são
outras e o registro pregresso dota a sociedade atual de informações, as quais
não necessitam mais do que um piscar de olhos para gerar repulsa e indignação,
até pelos mais crédulos e simplórios.
Não é à toa, então, que eu sempre
saliento a importância das entrelinhas, porque é nelas que se concentra sempre
o cerne da questão. Quando se fala em pós-verdade, por exemplo, nada se
aproxima mais da ideologia nazifascista do que ela.
Ora, essas pessoas são experts em criar e modelar a opinião
pública, desde os tempos das duas Grandes Guerras Mundiais - 1914-1918 e
1939-1945 -, a tal ponto que os fatos passam a ter menos importância ou
influência que os apelos às emoções, às crenças e aos valores pessoais.
E não é isso, que as Fake News têm buscado avidamente, em
pleno século XXI? Então, elas estão a serviço de quem? Se você respondeu das
células nazifascistas espalhadas pelo mundo, através da direita e suas
vertentes extremistas, então, BINGO! Pena que essas “mentirinhas” são só o ponto
de partida desse ideário que tenta se reconsolidar.
Assim, embora eu, particularmente,
considere esse movimento de restauração nazifascista como uma tentativa vazia,
apenas mais um jeito de promover a alienação e a perda de foco sobre as
prioridades contemporâneas através do medo, o que já acontece diariamente por
outras vias do próprio cotidiano, uma coisa é fato, ele não perde o caráter da
ilegalidade e precisa, por essa razão, ser contido nos rigores da lei.
Porque, infelizmente, já se sabe
muito bem que as células nazifascistas não se contentam apenas com a
manifestação discursiva, levando as suas expressões de ódio até as últimas
consequências. Eles não se constrangem em atentar contra a lei, contra a ordem,
contra a civilidade, contra a vida. Daí o perigo de deixá-los confortáveis e
seguros para agir.
Queiram ou não admitir, por trás
das estatísticas e das análises científicas contidas no último Atlas da
Violência, publicado em 20213, pode-se
extrair dos resultados traços marcantes da influência nazifascista que ronda o
país. Racismo, Xenofobia, Misoginia, Sexismo, Aporofobia, Gordofobia,
Intolerância religiosa, Homo e Transfobia são sim, expressões do radicalismo e
do extremismo dos grupos ultraconservadores presentes no nazifascismo, que
tentam se justificar por teorias como a Eugenia 4.
Por isso, preste atenção, “não viva no passado, não sonhe com o
futuro, concentre a mente no presente” (Sidarta Gautama – Buda), porque é
nele que tudo de bom ou ruim está próximo de acontecer a você. Os nazifascistas
têm sempre um bom pretexto para destilar o seu ódio sobre qualquer um.
Então, enquanto colocam as
pessoas focadas e absorvidas pelas questões disseminadas pelas suas células de
ação, elas deixam de questionar e refletir sobre o que realmente importa. Elas
ficam, então, sob o controle subliminar nazifascista. Temporariamente alijadas
das suas obrigações, responsabilidades, escolhas e decisões, presas ao devaneio
de tempos que deveriam ter ficado restritos as amareladas páginas da
história.
Assim, quando refletir sobre o Nazifascismo
pense no que disse o poeta Mário Quintana, ou seja, “Na convivência, o tempo não importa. / Se for um minuto, uma hora, uma
vida. / O que importa é o que ficou deste minuto, / desta hora, desta vida ...
/ Lembra que o que importa / ... é tudo que semeares colherás. / Por isso,
marca a tua passagem, / deixa algo de ti, ... / do teu minuto, / da tua hora, /
do teu dia, / da tua vida. ”. Afinal
de contas, “O mundo não foi feito no
tempo, mas sim com o tempo” (Santo Agostinho).