Em
busca de um denominador comum ... ou não?!
Por
Alessandra Leles Rocha
Surpresa e, um tanto quanto,
decepcionada com a notícia 1 recente
de que o Movimento Brasil Livre (MBL) e o Vem Pra Rua (VPR) decidiram convocar
um ato pelo impeachment do Presidente
da República para 12 de setembro; mas, se colocando numa posição de divisão das
ruas com os movimentos de esquerda.
Afinal de contas, não cabe senão
as razões que retratam e justificam, sem contestação, a gravidade da situação brasileira
nesses últimos 2 anos e meio, o estímulo para que milhares de pessoas decidam manifestar
pacificamente a sua indignação a respeito.
Como já sabemos, de experiências pregressas,
as iniciativas de promover o exercício cidadão reivindicatório, quase sempre,
abrem espaços para que eventuais grupos políticos venham surfar, de carona, e
se apropriar de seus discursos e narrativas. Mas, vamos e convenhamos, dessa
vez, diante de uma conjuntura atual enlutada por mais de meio milhão de seres
humanos, isso perde totalmente o sentido.
Praças, ruas, avenidas são,
agora, um espaço catártico para amenizar a dor, o sofrimento e as dilapidações
profundas sofridas pela população brasileira. Por isso, mais do que nunca, elas
têm que ser apartidárias e estarem focadas nas demandas, as quais os cidadãos
desejam solução.
Elas devem ser, portanto, a
expressão materializada do alcance de um denominador comum do coletivo plural
brasileiro, conseguido a partir do distanciamento das alienações sociais. Porque,
“A força da alienação vem dessa
fragilidade dos indivíduos, quando apenas conseguem identificar o que os separa
e não o que os une” (Milton Santos – geógrafo, advogado e professor).
Infelizmente, o Brasil tem olhado
de maneira bastante equivocada, tendenciosa e ineficiente sobre sua própria história.
Pois é, a polarização trouxe consequências inimaginadas para o campo prático da
vida nacional. O brasileiro transformou o país em um jogo de torcidas
organizadas, altamente apaixonadas, inflamadas e divergentes, fazendo de cada
demanda ou mazela um cabo-de-guerra, para medir os limites e a intensidade do
seu poder. Pena, que se esqueceram do mais importante, daquilo que estava em
jogo, a nação.
Brigando na periferia dos
problemas, os polos, em franco conflito, deixam de ver as prioridades, suas
consequências, seus desdobramentos, seus impactos sobre a vida de milhões de
pessoas. E quanto mais olham para si mesmos, mais esquecida e abandonada se
torna a nação, na sua infinitude de vulnerabilidades. A tal ponto que, os
vetores desse embate acabam se anulando e as pseudovitórias se tornando cada
vez mais esparsas e inconsistentes.
Se não fosse esse imponderável (uma
Pandemia), sem precedentes, certamente a população brasileira iria continuar
tocando o cotidiano dentro de suas ínfimas possibilidades, comendo o pão que o
diabo amassou com um sorriso amarelo e maroto de quem fez bobagem; mas, nada
além disso. E as praças, ruas e avenidas não estariam sendo disputadas e
loteadas por ninguém, por nenhum grupo político, sob nenhuma pretensão de
trabalhar em nome da mudança, da transformação.
Não é à toa que os exemplos disso
estão distribuídos por todos os veículos de informação e comunicação, nos
retratos de uma deterioração acentuada e veloz dos indicadores sociais e das
políticas públicas. O país não reafirma seus discursos e narrativas
desenvolvimentistas, porque acaba preso nas teias das politicagens
fisiológicas, oriundas de uma representatividade política que não respeita a
própria sociedade que a elegeu.
O que me faz pensar sobre uma citação
do orador e político romano Cícero, que viveu antes de Cristo. “Uma nação pode sobreviver aos idiotas e
até aos gananciosos. Mas não pode sobreviver à traição gerada dentro de si
mesma. Um inimigo exterior não é tão perigoso, porque é conhecido e carrega
suas bandeiras abertamente. Mas o traidor se move livremente dentro do governo,
seus melífluos sussurros são ouvidos entre todos e ecoam no próprio vestíbulo
do Estado. E esse traidor não parece ser um traidor; ele fala com a
familiaridade a suas vítimas, usa sua face e suas roupas e apela aos
sentimentos que se alojam no coração de todas as pessoas. Ele arruína as raízes
da sociedade, ele trabalha em segredo e oculto na noite para demolir as
fundações da nação; ele infecta o corpo político a tal ponto que este sucumbe. Deve-se
temê-lo mais que a um assassino”.
Tomemos, então, cuidado com a
polarização, é ela quem vem traindo o país, exaurindo suas forças e energias em
um embate desnecessário, lançando, uns sobre os outros, as responsabilidades e
as culpas sobre os erros, os descaminhos, as tragédias, porque não tem nenhuma intenção
em resolvê-los.
Afinal de contas, não se pode
esquecer de que “A construção do ser
social, feita em boa parte pela educação, é a assimilação pelo indivíduo de uma
série de normas e princípios – sejam morais, religiosos, éticos ou de
comportamento – que balizam a conduta do indivíduo num grupo. O homem, mais do
que formador da sociedade, é um produto dela” (Émile Durkheim – sociólogo francês).