Janeiro Branco
Por Alessandra
Leles Rocha
Lamento; mas, não há como
dissociar a influência tecnológica do esgotamento e deterioração da saúde física
e mental contemporânea. Daí ser tão importante falar sobre esse assunto, ao
invés de lançá-lo sob o tapete da negligência, do desrespeito e da
desumanização. Afinal de contas, saúde é
coisa seríssima!
Sim, a maioria das doenças manifestas
pelo corpo surgem a partir da simbiose mente e alma. Quando em estado de paz,
tranquilidade, serenidade, elas têm um papel fundamental na manutenção do equilíbrio
orgânico. Haja vista como o estresse, a depressão e/ou os transtornos alimentares,
por exemplo, afetam diretamente o corpo humano.
Mas, por que as mentes e as almas
têm andado fora do prumo? Essa pergunta merece uma resposta franca e honesta; pois,
ela não é uma pergunta banal. Ao contrário de todas as promessas feitas pela
Revolução Industrial, incluindo mais tempo livre, menos sobrecarga laboral,
mais equilíbrio financeiro, ... o que se viu na prática foi exatamente o oposto.
De modo que a cada versão desse
movimento industrializante, pior ficaram as condições existenciais dos seres
humanos. Porque além de serem a força motriz do sistema produtivo, as pessoas também
são obrigadas a desempenhar o papel consumidor. E isso exige uma
compatibilização entre trabalho e renda que é, naturalmente, obstaculizada pela
desigualdade social.
Para a grande massa da população
é exigido um malabarismo cotidiano extenuante para conseguir sobreviver. Longas
jornadas de trabalho, ainda assim, não garantem a renda necessária para custear
o essencial e o supérfluo, conforme estabelecido pela sociedade de consumo. Mas
não para por aí, o tempo todo, o ser humano vem tendo sua atenção absorvida
pelas tecnologias e o midiatismo.
Com a tecnologia ao acesso das
mãos, o ser humano chega ao ponto de sofrer crise de abstinência, quando
impedido de interagir com o mundo virtual. Simplesmente, porque essa realidade
vem criando um cenário cotidiano em que míseros fiapos de tempo, restantes da cansativa
jornada real dos indivíduos, são destinados às mídias tecnológicas.
Isso significa que as pessoas
estão comprometendo a qualidade do seu sono, da sua alimentação, do seu consumo
de informações, do seu lazer, ... sob diferentes aspectos.
O que, inevitavelmente, vai afetar
a sua saúde mental, pela manifestação de doenças. Ansiedade. Síndrome do
Pânico. Depressão. Síndrome de Burnout. ... Porque os limites de
tolerabilidade fisiológica são corrompidos pelo excesso de atividades mentais simultâneas.
A máquina humana também tem seus
limites. Respeitá-los e aceitá-los é imperioso para garantir qualidade de vida,
ou seja, o equilíbrio entre corpo, mente e alma.
Mas, o condicionamento do
inconsciente coletivo pelas forças sociais, ao longo do tempo, estabeleceu esse
quadro. O ser humano foi automatizado a seguir pelo fluxo das imposições
estabelecidas dentro do próprio coletivo social que ele pertence.
Assim, a maioria das pessoas só
se dá conta dos prejuízos físicos e emocionais, quando a situação já está fora
de controle e as consequências já estão materializadas. É desse contexto que
emerge a exacerbação da agressividade, da violência, da intolerância, da
indisposição dialógica.
Todos querem ter razão para não
ter que despender energia argumentativa, para não se cansarem ainda mais. Por isso
elas querem soluções rápidas para tudo, o tempo todo.
Ora, mas sabemos que a vida real
não funciona dessa maneira! Daí os embates, as afrontas, as confusões, as
quais, no fim das contas, contribuem na proliferação do adoecimento populacional.
Não é à toa, por exemplo, que em
2022, segundo dados da Organização Mundial da Saúde, soube-se que “mais de
700 mil pessoas morrem por ano devido ao suicídio, o que representa uma a cada
100 mortes registradas” 1. Portanto,
mais do que à beira de um ataque de nervos, o ser humano está, cada vez mais, à
beira da morte.
Nessa história, não há um
individuo sequer que não tenha um bocado de responsabilidade a respeito. Começando
pelo fato de que cuidar de si, que é o pontapé inicial para cuidar do mundo. Você
só pode fazer algo pelo outro, quando está bem consigo mesmo.
Eu sei que as conjunturas
externas, do mundo, estão caminhando para se tornar mais e mais hostis, difíceis,
ameaçadoras; mas, se não exercermos alguma pitada de egoísmo e fazermos em prol
de nós mesmos, nenhum governo, ou empresa, ou quem quer que seja, vai fazer.
Infelizmente, há uma tendência global
de tornar o ser humano desimportante, o que nos obriga a agir em nosso favor.
Basta observar como a dinâmica contemporânea está dilapidando, dia a dia, os
seus parcos direitos, a sua dignidade.
E, apesar disso, você continua no
mesmo ritmo frenético, consumido pelas mesmas aspirações e desejos, como se
pudesse suplantar as adversidades e vencer o jogo. Acontece que isso está longe
de ser verdade.
Então, pede a prudência, a
lógica, o bom senso, que você se realinhe à uma realidade, a qual você possa realmente
caber, se sentir confortável e ser feliz.
É hora de começar a questionar o
mundo, suas engrenagens, suas ordens, para definir os seus próprios caminhos, em
nome do seu bem-estar, da sua saúde física, mental e espiritual. Hora de sair
dessa bolha massificante, extenuante, opressora, que não está nos levando a
lugar nenhum.
Veja bem, por excelência cada um
de nós é único. Somos iguais só até a página dois! Portanto, temos que viver
segundo nossos próprios valores, crenças, princípios, e não os dos outros.
Se engana quem pensa que
subordinar-se a qualquer violência de natureza psicoemocional vai lhe fazer pertencer
ao mundo de maneira plena. Não vai. Haverá sempre uma porta fechada, uma cara
amarrada, um senão.
Não se esqueça de que “Não é
sinal de saúde estar bem adaptado a uma sociedade doente” (Jiddu Krishnamurti).
Por isso, cuide de você. Preserve a sua
identidade para que seja possível conseguir garantir a sua dignidade. Isso é cuidar
da saúde mental, física e espiritual!
Não temos que correr atrás das
perspectivas e expectativas de ninguém; mas, das nossas. É com esse olhar que,
de repente, vamos nos encontrar pertencentes a uma tribo, cujas ideias coadunam
com as nossas. E assim, nos sentiremos felizes,
alegres, renovados, inspirados e motivados, para viver as aventuras e as
desventuras de nossa condição humana.