domingo, 14 de janeiro de 2024

A contemporaneidade e seus pesos e medidas...


A contemporaneidade e seus pesos e medidas...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Albert Einstein tinha mesmo razão, o tempo é relativo! Para muitas coisas ele parece rápido, adiantado; mas, para outras, ele parece lento, imóvel, preso ao passado. O que torna, muitas vezes, difícil de compreender o que querem ou esperam as conjunturas sociais, em seus mais diversos contextos.

Em alguns momentos prevalece a máxima do preto no branco, tudo direto, claro e objetivo. Em outros, emergem, sabe-se lá de onde, interpretações variadas para ajustarem-se aos interesses de uns e outros. De modo que ficamos sem ter acesso a verdade dos fatos. Sem saber se é isto ou aquilo, diante da presença de uma enigmática terceira margem para o rio.

Vejam, por exemplo, que há tempos o Brasil vive a realidade da escassez de professores. Ano após ano, o número de docentes dispostos a enfrentar a gama de desafios presentes no sistema educacional brasileiro, se reduz drasticamente.

Nem considero a possibilidade de afirmar que esses (as) professores (as) perderam seu apreço e interesse pela profissão. Na verdade, foram as agruras cotidianas que impuseram tantos desgastes e decepções, que não houve outro caminho senão abdicar do ensino-aprendizagem. De modo que as pesquisas na área e as matérias jornalísticas dão conta desse gargalo que se formou no setor.

Especialmente, na rede pública de ensino, a carência de profissionais cria lacunas significativas na construção do conhecimento e contribuem para a evasão escolar e os baixos desempenhos dos alunos, em sistema avaliativos como, por exemplo, o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA) e o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).

Contudo, apesar desse cenário, é curioso quando profissionais que se dispõem a estar em sala de aula não sejam selecionados pelos critérios estabelecidos por escolas públicas e privadas. No caso de escolas públicas, por exemplo, os critérios se dividem entre concursos públicos e designações anuais e/ou eventuais.

No caso dos concursos, a isonomia presente no edital garante que os pretensos candidatos sejam aprovados de acordo com o seu desempenho em prova e eventuais análises curriculares, quanto à qualificação em Especializações, Mestrado e Doutorado. Pelo menos, em tese, as habilidades e competências docentes estão sendo, de fato, avaliadas e analisadas para a contratação do profissional, mediante a sua própria apresentação durante o concurso público.  

Já, nas designações anuais e/ou eventuais, exige-se dos candidatos uma inscrição prévia que gera um número classificatório, o qual leva em consideração o tempo de serviço prestado na rede pública. Assim, não é incomum, por exemplo, que esses professores não sejam, necessariamente, licenciados para exercerem à docência.

Na verdade, somente em casos de empate é que entram em cena outros critérios. É verificado se o candidato está pleiteando a posse do cargo mediante aprovação por concurso, se o candidato já foi designado em outra escola, se o candidato dispõe de certificado da licenciatura compatível ao cargo, se o candidato dispõe de certificado de pós-graduação, se o fator etário é maior ou menor, ...

E apesar desse cenário, muitos profissionais designados abandonam a vaga, mesmo sob pena de alguma punição burocrática, obrigando as escolas a repetirem o processo novamente. Mas, vejam só, que curioso! Um candidato que não tenha tido oportunidade de fazer sua inscrição para a designação, entra em desvantagem direta no processo designatório.

Porque não importa se ele tem um currículo que satisfaça plenamente ao exercício do cargo. Não importa o tempo que demore para uma nova designação. Não importa que inúmeras turmas fiquem sem aulas daquele conteúdo. Não importa. Isso não é levado em consideração. O que importa é o número de classificação gerado pela inscrição.

Bem, e se todo o exposto acima lhe gera, no mínimo, reflexão, imagine o que está por vir, na rede privada.  Nela incidem duas possibilidades de contratação, ou seja, entrega direta de currículos para análise ou sistemas de seleção próprios. Isso, teoricamente, porque na prática os trâmites podem envolver, por exemplo, o chamado networking, que nem sempre está explícito ao candidato.  

A grande questão é que o processo nem sempre transcorre com a transparência desejada e, muitas vezes, culmina em mensagens, contendo frases do tipo “Neste momento, você não foi selecionado para seguir nas próximas etapas”. De modo que o candidato não sabe se o seu currículo estava acima das expectativas ou abaixo delas, ele simplesmente foi recusado sem maiores esclarecimentos.  O que é muito decepcionante, especialmente, para aqueles que têm plena consciência das suas habilidades, competências e qualificações para o cargo.

Portanto, a Educação brasileira é só um viés de como os tempos contemporâneos são frios, insensíveis e covardes, no trato das relações sociais. Sem coragem de olhar nos olhos, de dar um feedback pessoal, responsáveis pelos departamentos de contratação e recursos humanos se escondem em frases feitas, em recursos tecnológicos, para não apresentarem os verdadeiros argumentos de suas escolhas e, nem tampouco, permitir o direito de exercer a réplica pelos pretensos candidatos.

Se nesse instante, você, caro (a) leitor (a), ainda considera tudo isso normal, compatível à realidade contemporânea, lamento muito! Seja na Educação ou em quaisquer outras profissões, o ser humano tem sido cobrado avassaladoramente e depois medido, pesado e julgado insuficiente, sem direito a contestações. O que explica, de certa forma, porque os índices de desemprego no Brasil, e no mundo, não são obra do acaso, ou de uma passividade voluntária, ou da mera incompetência das pessoas. 

Bom, enquanto estamos discutindo sobre a perspectiva desse cenário, a Inteligência Artificial (I.A.) já extingue milhões de oportunidades de trabalho, no planeta, à revelia das habilidades, competências e/ou qualificações para os cargos. Pois é, a frieza tecnológica anuncia, aos quatro cantos, que os seres humanos são dispensáveis, sem precisar, na verdade, enunciar uma só palavra.

Que muito menos gente, dentro da população ativa, terá espaço nessa nova ordem socioeconômica global. Inclusive, quem, hoje, pensa que está em posição de superioridade ou importância, quando exclui ou dispensa um trabalhador, tende a ser sumariamente surpreendido pela I.A.  

Na relatividade do tempo, as voltas que o mundo dá estão cada vez mais rápidas, não é mesmo? Se hoje, uns e outros pensam que não há problemas em serem frios, insensíveis e covardes, no trato das relações sociais; em breve, descobrirão o tamanho da insensibilidade tecnológica, à flor da pele.

Aí, então, vamos entender que Herbert de Souza, o Betinho, tinha mesmo razão, quando disse que “A tecnologia moderna é capaz de realizar a produção sem emprego. O diabo é que a economia moderna não consegue inventar o consumo sem salário”.  Bora pensar sobre isso!!!