Rei
morto, Rei posto
Por
Alessandra Leles Rocha
Enquanto muita gente, por aí,
aponta a aprovação da Reforma Tributária, pela Câmara dos Deputados, como mais uma
fragorosa derrota do Ex-Presidente da República, nas últimas semanas, eu não penso
que as considerações a respeito recaiam exclusivamente sobre ele.
O que se viu, ontem, foi
exatamente a velha máxima do “Rei morto,
Rei posto”. Acontece que pela ótica da política partidária nacional, ela é
muito mais abrangente do que se pensa, porque é a exibição clara da fragilidade
das relações sociais. Isso quer dizer que as certezas, as convicções, estão
fincadas em terrenos movediços, extremamente instáveis. Então, uma hora é fulano
que se dá mal, outra é beltrano, lá na frente é sicrano, e por aí vai.
Porque a política não estabelece relações
sólidas, profundas, inabaláveis. Nela não se fazem amigos, se fazem aliados,
segundo os interesses, as circunstâncias, as necessidades. E as perspectivas costumam
sempre trazer nuances importantes de diferença entre os envolvidos. As partes
nem sempre estão olhando para o mesmo lado, o mesmo viés. Sem contar que, de
repente, surge um outro elemento na história para impor uma outra análise, uma
outra consideração.
E é esse movimento que cria
conjunturas inesperadas no caminho. Diariamente tenho visto os veículos de
informação e comunicação, tradicionais e alternativos, conjecturando
possibilidades daqui e dali sobre o futuro político do país, e considero isso
muito engraçado. Há muita água para rolar por debaixo das pontes até que se
cheguem ao tempo dos novos pleitos eleitorais. Há muitas camadas de escombros a
serem descobertas nesse ciclo de reconstrução nacional, que podem fazer emergir
coisas do arco da velha, que ninguém nem poderia imaginar. Aliás, essa possibilidade
não pode nunca ser descartada, no Brasil!
Então, do mesmo modo que puxaram
o tapete do Ex-Presidente da República ao não satisfazerem a sua vontade,
outros podem provar do mesmo gosto da traição republicana em outras circunstâncias.
Muita gente ainda não entendeu que os poderes não são absolutos. Há neles uma
dose de relatividade fenomenal. E basta sair da crista da onda, por algum
motivo, para ver as certezas esfacelando no chão.
Dizem que o meio político é a
seara da esperteza. Ora, mas sempre tem alguém que é mais esperto do que o
outro! E é nessas horas que o poder, por si só, se mostra insuficiente para dar
conta de segurar o cidadão no seu trono. Não é à toa que eles aprendem, desde
cedo, a brilhante arte de pisar em ovos e evitar, ao máximo, criar
indisposições e animosidades desnecessárias. Mas, tem sempre alguém que se
irrita fácil, que não aceita seguir os protocolos, que só age em nome dos próprios
interesses. Aí já viu?
É por essas e por outras que
considerei demasiadamente inoportuna a quantidade de comentários ácidos e
ferinos, dedicados ao Ex-Presidente da República, quando tem tanta gente na
fila, aguardando para ser a bola da vez. Sim, ninguém no espectro político
nacional pode se considerar a salvo de constrangimentos, de decepções, de
traições, ... Na verdade, o problema de uma imensa maioria deles não se refere
necessariamente ao que fizeram nos verões passados; mas, sobre o que pode vir a
reverberar a respeito, no presente. Vai que alguém puxa o fio da meada...
Assim, essa reflexão aproveita os
recentes acontecimentos para sinalizar a importância de não nos esquecermos de
que a Terra gira ininterruptamente e o fluxo da vida não segue estritamente os
nossos desejos. Afinal, não somos ilhas! Na maior parte do tempo estamos
submetidos ao árduo exercício de alcançar um denominador comum, para as nossas
necessidades, ambições, projetos, aspirações, com milhares de pessoas. Assim,
os nossos pequenos ou pseudopoderes são totalmente relativizados, por infinitas
questões que escapolem ao nosso controle.
Nosso excesso de individualismo, de narcisismo, de egoísmo contemporâneo, só vale até a página dois! Daí por diante, a vida como ela é segue seu curso. Ora vencedores, ora vencidos. Refletindo as dicotomias da existência que fazem parte do manual de qualquer vivente com os pés fincados no planeta. Não se esqueça, a crista da onda é só o alerta de que, em algum momento, o caldo será inevitável.