quarta-feira, 3 de maio de 2023

A FÉ ... PÚBLICA ABALADA!


A FÉ ... PÚBLICA ABALADA!

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Vexatória. Deplorável. Indecorosa. ... São só alguns dos adjetivos para definir a notícia que caiu como uma bomba sobre os veículos de comunicação e informação, nacionais e estrangeiros, hoje. Segundo investigações da Polícia Federal (PF) teria havido fraude no Sistema do Ministério da Saúde em relação ao cartão de vacinação da Covid-19 em benefício do ex-Presidente da República e, por isso, foi deflagrada uma operação para aprofundar as apurações junto aos envolvidos 1.

Por si só, os fatos já seriam gravíssimos. Depois de uma resistência pública e notória à vacinação, no país, e de ter ajudado a contribuir com o mau exemplo, para a morte de milhares de cidadãos e a promoção de Fake News de caráter negacionista, a dúvida se houve ou não a vacinação por parte do ex-Presidente gera profunda indignação.

Mas, não bastassem todos os absurdos que atravessaram os momentos mais críticos e difíceis da Pandemia, tão bem retratados e documentados pela CPI da Covid-19, e que agora ganham mais esse adendo, a questão de uma adulteração no sistema de informação pública passa a ser o elemento principal de análise por todos os cidadãos brasileiros.

Não, porque seja de antemão um fato estarrecedor. Acontece que ele ultrapassa quaisquer limites do decoro, da responsabilidade, da credibilidade, institucional. Se por essa ou aquela razão, houve quem acreditasse que pudesse adulterar dados no sistema de Saúde, quem pode garantir, a partir da emergência desses fatos, que em outros sistemas públicos o mesmo não tenha ocorrido? Quantos dados públicos nacionais não podem ter sido maquiados fraudulentamente para atender a esse ou a aquele interesse? Haja vista quantos sigilos foram criados, não é mesmo?!

Lamento, mas essas perguntas devem (ou deveriam) estar pulsando freneticamente nas mentes de muitas pessoas, não somente dentro do Brasil; mas, fora dele também. Parece que alguém conseguiu macular a Fé Pública. Para quem não sabe, esse é o termo que trata da “confiança atribuída pelo estado democrático de direito aos agentes públicos para prática dos atos públicos, cuja veracidade e legalidade se presumem devendo ser exercida nas exatas limitações constitucionais e legais sob pena de responsabilização civil, administrativa e criminal” 2.

De certo modo, uma ruptura abrupta com a certeza para permitir pairar sobre o país uma névoa de desconfiança. Aliás, em plena efervescência das discussões sobre o PL das Fake News, os acontecimentos não deixam de se cruzar. Afinal, a avalanche de Fake News que vem se espalhando pelo Brasil, desde 2019, tem no seu rol de assuntos um negacionismo expresso sob diferentes formas e conteúdos que afeta diretamente a credibilidade do serviço público e de suas instituições.

Vimos isso, claramente, nas ofensivas contra o sistema eleitoral brasileiro. Na apologia que fez decrescer vertiginosamente a vacinação entre as crianças e a população em geral, no caso da Covid-19. Na afirmação ultraconservadora da pauta do Homeschooling. No desrespeito com as tradições de um Estado laico. Na resistência à realização ao Censo Demográfico. Enfim. Esses são apenas alguns exemplos de processos que vêm acontecendo, principalmente, através das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs), para desacreditar e fragilizar a dinâmica social do país.

Portanto, temos que elevar ao patamar da dúvida sim, se essa questão passa somente pelo movimento de difamação, de desqualificação, de violência, usando o campo tecnológico como facilitador para esse fim, ou se todos os trabalhos das instituições públicas, nos mais diferentes setores, também, foram atacados pelo uso de mecanismos tecnológicos de fraude e adulteração para corroborar com as narrativas e discursos que satisfizessem aos interesses de uns e outros.

Se essa compreensão não estiver muito bem elucidada, o país corre o risco de estar se enveredando por uma realidade paralela, ajustada para caber nas projeções e perspectivas idealizadas por certas ideologias. A natureza pública das informações, dos dados, dos históricos, passa a traduzir uma versão do Brasil e não, o Brasil. De modo que não estamos tratando só de uma desconstrução meramente imagética; mas, simbólica e identitária, a qual repercute ampla e maciçamente, inclusive, sobre discussões internacionais.

Como sentar a uma mesa de negociação, permitindo pairar no ar, quaisquer mínimas desconfianças sobre as informações prestadas, hein? E buscando na memória recente, sabemos que em muitos momentos o Brasil não se constrangeu diante do mundo, apresentando dados fictícios da sua realidade paralela. Especialmente, quando se permitia falar sobre Meio Ambiente.

Talvez, seja oportuno, então, aproveitar os recentes acontecimentos para expandir o olhar sobre tudo isso. Não estamos falando apenas de respeito com a Cidadania, com a Democracia, com o Estado de Direito, com a história nacional, ao apontar a importância da Fé Pública. Estamos falando de credibilidade, de estabilidade, de responsabilidade, com o país. E isso não é pouco. É tudo. Investimentos. Crescimento. Progresso. Desenvolvimento. ... Então, reflita a respeito!