Surpresa
zero!
Por
Alessandra Leles Rocha
Surpresa zero! A expressão maior
da incivilidade brasileira sobre os Três Poderes na capital federal foi gestada
durante pouco mais de quatro anos. Qualquer um podia acompanhar o que se
desenrolava nos sobressaltos diários da República e acirrados em momentos como
o do 7 de setembro de 2021. Era muito fácil perceber que a estupidez ignorante
inflamada por mentiras e discursos de ódio levaria inevitavelmente a algo da
natureza que se viu em 12 de dezembro de 2022 e agora.
Lamento, mas a ingenuidade empregada
para contemporizar o curso dessa tragédia anunciada é inadmissível. Concordo que
a diplomacia é sempre preferível ao confronto; mas, isso quando ela cabe no
contexto. Quando o diálogo franco e inteligível existe. Caso contrário, rapapés
e mesuras esticam a corda da tolerância sem que se chegue a bom termo das
situações. E a ultradireita nunca, na história da humanidade, jamais quis o diálogo,
a diplomacia, a sensatez, o respeito, a democracia.
Brasília, o Brasil e o mundo
assistiram hoje a um cenário de guerra. Destruição por todos os lados dentro
dos centros dos poderes republicanos. Absurdo. Desnecessário. Infame. Prejuízos
materiais e imateriais inestimáveis. Em síntese, a imagem do país lançada na
latrina da história contemporânea. Pois é, um constrangimento que poderia ter
sido evitado.
E o que é pior, evidenciou de
forma clara e objetiva o despreparo de nossas autoridades no que diz respeito a
avaliação das conjunturas. Afinal, muitos não souberam discernir entre divergência
política e antidemocracia terrorista deslavada. De observação individual aos
registros feitos pelos veículos de comunicação e informação, nacionais e
estrangeiros, estava posto que o comportamento dos simpatizantes da
ultradireita não tinha nenhum vestígio de pacifismo.
Em plena era das Tecnologias da
Comunicação e Informação (TICs) e ninguém se mobilizou para rastrear as
mensagens trocadas entre os integrantes dos acampamentos montados diante dos
quarteis generais Brasil afora. Para identificar os mentores intelectuais da
antidemocracia em curso. Para apontar os investidores da façanha golpista. Deram
a eles todas as regalias e privilégios para não serem incomodados,
constrangidos ou despejados dos seus postos de vigília fanática.
Agora, como escreveu Carlos
Drummond de Andrade, em 1942, “E agora, José?
”, quem vai se responsabilizar por permitir que a destruição fosse levada a
termo? Quem vai arcar com as custas da reconstrução? Saberemos quem são os
traidores ofensivos da República? Serão eles punidos, nos rigores da lei? Afinal,
não atentaram apenas contra a subjetividade democrática. Atentaram contra cada
um de nós, como se nossas casas, nossos lares, tivessem sido invadidos e arruinados
por uma horda de vândalos. Atentaram contra nossas memórias, nossa identidade
nacional.
E pensar que tudo isso podia ter
sido evitado! Dói fundo pensar a respeito. Dói fundo pensar que se desacreditou
nos fatos para acreditar que tudo não passava de blefe, de fanfarronice, de
bravata. Já alerta o próprio evangelho para jamais subestimar o inimigo. E a explicação é simples, ninguém conhece a si
mesmo, então, como acreditar que se conhece o outro em plenitude? Sobretudo quando
se trata de uma inimizade forjada no campo ideológico do poder político, onde
os interesses falam mais alto do que os valores e os princípios das relações humanas.
Não se esqueçam de que o assunto
não se limitará as fronteiras do próprio país. Muito pelo contrário! Já ganhou
as manchetes internacionais. Já despertou a manifestação das mais importantes
lideranças globais. Portanto, a cobrança não será exclusivamente de ordem
interna; mas, de ordem externa, por conta da estabilidade democrática no
planeta e das alianças em favor da sustentabilidade socioambiental. Algo que o
Brasil figura como importante player internacional.
Portanto, é hora de falar sério! Não nos esqueçamos de que “Justiça tardia nada mais é do que injustiça institucionalizada” (Rui Barbosa). Certamente, estamos diante do maior desafio apresentado a um recém-iniciado governo brasileiro e que a ele impôs a árdua tarefa de não poder errar nas soluções. O que vem acontecendo no país, e que culminou nessa catástrofe, neste domingo, é muito grave! Não há espaço para transigir, ou ceder, ou condescender, ou tolerar a anticidadania, a antidemocracia. Há inúmeras questões de ordem prática para serem atendidas em favor da população, que não podem esperar pela atenção destinada aos desvarios alucinados de uns e outros.