segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

Surpresa zero!


Surpresa zero!

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Surpresa zero! A expressão maior da incivilidade brasileira sobre os Três Poderes na capital federal foi gestada durante pouco mais de quatro anos. Qualquer um podia acompanhar o que se desenrolava nos sobressaltos diários da República e acirrados em momentos como o do 7 de setembro de 2021. Era muito fácil perceber que a estupidez ignorante inflamada por mentiras e discursos de ódio levaria inevitavelmente a algo da natureza que se viu em 12 de dezembro de 2022 e agora.

Lamento, mas a ingenuidade empregada para contemporizar o curso dessa tragédia anunciada é inadmissível. Concordo que a diplomacia é sempre preferível ao confronto; mas, isso quando ela cabe no contexto. Quando o diálogo franco e inteligível existe. Caso contrário, rapapés e mesuras esticam a corda da tolerância sem que se chegue a bom termo das situações. E a ultradireita nunca, na história da humanidade, jamais quis o diálogo, a diplomacia, a sensatez, o respeito, a democracia.

Brasília, o Brasil e o mundo assistiram hoje a um cenário de guerra. Destruição por todos os lados dentro dos centros dos poderes republicanos. Absurdo. Desnecessário. Infame. Prejuízos materiais e imateriais inestimáveis. Em síntese, a imagem do país lançada na latrina da história contemporânea. Pois é, um constrangimento que poderia ter sido evitado.

E o que é pior, evidenciou de forma clara e objetiva o despreparo de nossas autoridades no que diz respeito a avaliação das conjunturas. Afinal, muitos não souberam discernir entre divergência política e antidemocracia terrorista deslavada. De observação individual aos registros feitos pelos veículos de comunicação e informação, nacionais e estrangeiros, estava posto que o comportamento dos simpatizantes da ultradireita não tinha nenhum vestígio de pacifismo.

Em plena era das Tecnologias da Comunicação e Informação (TICs) e ninguém se mobilizou para rastrear as mensagens trocadas entre os integrantes dos acampamentos montados diante dos quarteis generais Brasil afora. Para identificar os mentores intelectuais da antidemocracia em curso. Para apontar os investidores da façanha golpista. Deram a eles todas as regalias e privilégios para não serem incomodados, constrangidos ou despejados dos seus postos de vigília fanática.

Agora, como escreveu Carlos Drummond de Andrade, em 1942, “E agora, José? ”, quem vai se responsabilizar por permitir que a destruição fosse levada a termo? Quem vai arcar com as custas da reconstrução? Saberemos quem são os traidores ofensivos da República? Serão eles punidos, nos rigores da lei? Afinal, não atentaram apenas contra a subjetividade democrática. Atentaram contra cada um de nós, como se nossas casas, nossos lares, tivessem sido invadidos e arruinados por uma horda de vândalos. Atentaram contra nossas memórias, nossa identidade nacional.

E pensar que tudo isso podia ter sido evitado! Dói fundo pensar a respeito. Dói fundo pensar que se desacreditou nos fatos para acreditar que tudo não passava de blefe, de fanfarronice, de bravata. Já alerta o próprio evangelho para jamais subestimar o inimigo.  E a explicação é simples, ninguém conhece a si mesmo, então, como acreditar que se conhece o outro em plenitude? Sobretudo quando se trata de uma inimizade forjada no campo ideológico do poder político, onde os interesses falam mais alto do que os valores e os princípios das relações humanas.

Não se esqueçam de que o assunto não se limitará as fronteiras do próprio país. Muito pelo contrário! Já ganhou as manchetes internacionais. Já despertou a manifestação das mais importantes lideranças globais. Portanto, a cobrança não será exclusivamente de ordem interna; mas, de ordem externa, por conta da estabilidade democrática no planeta e das alianças em favor da sustentabilidade socioambiental. Algo que o Brasil figura como importante player internacional.

Portanto, é hora de falar sério! Não nos esqueçamos de que “Justiça tardia nada mais é do que injustiça institucionalizada” (Rui Barbosa). Certamente, estamos diante do maior desafio apresentado a um recém-iniciado governo brasileiro e que a ele impôs a árdua tarefa de não poder errar nas soluções. O que vem acontecendo no país, e que culminou nessa catástrofe, neste domingo, é muito grave! Não há espaço para transigir, ou ceder, ou condescender, ou tolerar a anticidadania, a antidemocracia. Há inúmeras questões de ordem prática para serem atendidas em favor da população, que não podem esperar pela atenção destinada aos desvarios alucinados de uns e outros.