O
futebol sob melancólica nostalgia
Por
Alessandra Leles Rocha
É assim, à revelia da vontade
humana que a vida se cumpre. Num piscar olhos pessoas se apagam da retina; mas,
não da história. Portanto, com o futebol não poderia ser diferente! Lentamente as
estrelas das lendárias décadas de ouro do futebol vão ganhando espaço em uma
outra dimensão.
Hoje, foi a vez de Roberto
Dinamite 1. Ídolo do Club de Regatas Vasco da
Gama, no Rio de Janeiro. Mal tínhamos nos recuperado da partida de Pelé e a
notícia chega trazendo tristeza e lembrança sob um misto de pura nostalgia; mas,
também, muita reflexão.
Não se trata apenas de talento,
de genialidade, de brilhantismo nato, o que constitui essa parte fundamental do
futebol brasileiro. Havia sim, uma relação totalmente diferente entre os
atletas e o esporte, que nem de longe respira a profissionalização que se deu
na recente contemporaneidade.
Eram tempos instintivos. Poucos recursos.
Quase nada de tecnologia. A medicina desportiva engatinhava e não conseguia impedir
que muitas promessas ficassem pelo caminho por conta de graves lesões. Centros
de treinamento adequados eram um sonho pouco viável para época. Enfim,
tratava-se de uma interface entre o amadorismo e o profissionalismo, isenta de
toda a pompa e circunstância do glamour, do mundo high tech que se desfruta atualmente.
Talvez, por isso, os atletas
acabavam tecendo uma ligação afetiva profunda com os clubes que os revelavam. Como
se a ética do coração não lhes permitisse a frivolidade de novos amores. A camisa
tinha mesmo o peso de um manto sagrado e, por isso, era difícil que eles se
rendessem aos apelos capitais, os quais na época não passavam nem perto das
vultosas quantias de agora.
Não, eles não trocavam de camisa
a seu bel-prazer, existia fidelidade. Daí muitos deles terem associado e marcado
à sua história futebolística a um determinado time. Bastava dizer o nome para
saber qual o escudo ele ostentava. Pelé do Santos. Garrincha do Botafogo. Zico
do Flamengo. Reinaldo do Atlético Mineiro. Roberto Dinamite do Vasco. ...
Pois é, tempos de um futebol que
era arte. O esporte estava acima de qualquer outra coisa. Então, eles se
jogavam de corpo e alma nas partidas, davam o sangue, a raça pelos gramados. Era
nítida a disposição de encantar, de hipnotizar o público, com jogadas que
pareciam tiradas da cartola de um mágico, fazendo do impossível algo plenamente
possível.
Dizia João Guimarães Rosa que “As pessoas não morrem, ficam encantadas”.
Bem, não quero contradizê-lo, mas abro um parêntese para acrescentar que só
algumas encontram essa dádiva, por conta do legado significativo e relevante
que conseguiram imprimir à sua existência. O que no caso dos futebolistas
nacionais diz respeito àqueles inseridos no rol das lendárias décadas de ouro
do futebol. O que, por exemplo, é o caso de Roberto Dinamite.
Portanto, a morte é incapaz de apagar a história, dada a profundidade com a qual ela se escreveu. Um ícone não é só uma imagem, uma marca, uma ideia, um produto, ele é acima de tudo, e para sempre, uma referência. Seja para o bem. Seja para o mal. Não é à toa que Milan Kundera escreveu “O homem pode pôr fim à sua vida, mas não à sua imortalidade”. Afinal, para o etéreo, o subjetivo, o abstrato, não há barreiras, não há fronteiras, não há amarras, não há limites que possam detê-lo na sua obstinação de permanecer existindo.