Fama
e notoriedade por linhas tortas
Por
Alessandra Leles Rocha
É lastimável que muitos veículos
de comunicação e de informação se permitam contemporizar os atos terroristas
que culminaram no episódio de 8 de janeiro, em Brasília/DF. É um erro
gravíssimo chamar de minoria os simpatizantes da ultradireita nacional, como se
eles pudessem ser resumidos ao contingente que formou a horda de vândalos que
se viu depredar os prédios dos poderes na capital federal.
Porque isso seria negar os 49,10%
dos votos válidos 1 recebidos pelo candidato
à presidência da república, o qual representa a ultradireita no país. O que indica
claramente uma posição ideológica favorável ao que defende esse segmento político-partidário.
A escolha de um candidato não passa a margem dos fatos, não apaga o que ele disse
ou fez ao longo da sua trajetória, de modo que ao manifestar apoio a ele, o
eleitor referenda o histórico político e cidadão daquele indivíduo. Não nos
esqueçamos de que se peca por atos; mas, também, por omissões.
E é contando com esse público que
não esteve presente nos atos terroristas e que está espalhado Brasil afora, que
a ultradireita conta para manter alta a chama da instabilidade no país. Somente
dessa forma, ela vai se manter na mídia, manipulando o inconsciente coletivo para
o fanatismo político. É através desses milhões de rostos desconhecidos pelos
serviços de inteligência, polícias e judiciário, que eles pretendem perseverar
na disseminação em massa de Fake News, gerando assunto e discussão para não
permitir que o seu ideário caia no ostracismo.
Infelizmente, o sentimento de
indignação e repulsa pelos atos terroristas não foi compartilhado por todos os
cidadãos brasileiros. Toda regra tem exceção, não é mesmo? Vejam, por exemplo, que
8 senadores da República decidiram votar contra a intervenção na Segurança
Pública do DF, “ignorando que a própria instituição
a que pertencem foi atacada nos eventos que levaram ao decreto presidencial” 2. Enquanto Brasília padecia os horrores
do vandalismo, três torres de transmissão de energia foram derrubadas, duas em
Rondônia e uma no Paraná 3. Já se
sabe, também, que há convocações antidemocráticas visando “bloquear o acesso de caminhões-tanque nas bases das empresas
distribuidoras de combustíveis” 4. ...
Por isso é tão perigosa a
ingenuidade de tentar convencer a opinião pública de que se trata mesmo, de uma
minoria, tomando como base apenas os milhares de indivíduos que tocaram o
terror em Brasília. Fossem só estes, não teria sequer havido uma eleição presidencial
em dois turnos. Eles são muitos. São barulhentos. São dissimulados. São verdadeiros
lobos em pele de cordeiro. E estão devidamente instruídos para desestabilizar a
ordem pública, para instituir no país a desordem e o retrocesso, custe o que
custar. Sem contar que estão sendo devidamente financiados para esse propósito.
Porque a ultradireita não tem
quaisquer compromissos a não ser com ela mesma. Tanto que eles não estão nem aí
para a repercussão internacional negativa dos seus atos. Como se o Brasil não
dependesse do mundo para mover as engrenagens da sua economia. Esse esticar de
corda pode representar respostas contundentes no campo diplomático, tais como, a
redução ou remoção de laços, cancelamento ou limitação de visitas
governamentais, fechamento de embaixadas, retirada ou expulsão de missões,
sanções militares, embargos econômicos e bloqueio das relações comerciais.
E não é difícil estimar a
dimensão desses impactos, relembrando o quão difícil foi a situação brasileira
durante o auge da Pandemia do Sars-Cov-2 e suas variantes, em que as medidas
restritivas impostas pela condição sanitária global, impediu o acesso imediato de
produtos médico-hospitalares e farmacêuticos produzidos por outros países.
Além de disputar a concorrência, que
se fazia generalizada naquele momento, a questão da interrupção produtiva
industrial e de exportações/importações impôs um cenário crítico de
desabastecimento de insumos e produtos. Acontece que essa foi uma situação
excepcional, uma emergência sanitária. Agora, imagine lidar com uma situação
que foi constituída pela própria irresponsabilidade do país, como está
incitando a ultradireita nacional.
Diante de tudo isso, penso que
seria interessante rever o modo de noticiar os acontecimentos, evitando dar
publicidade e notoriedade a quem só tem o interesse de prejudicar a ordem e o
progresso nacional, e buscando nomear os fatos pelos nomes que lhes competem
receber. Em meio ao fanatismo ideológico político é preciso romper com as
adorações, as mitificações, as idolatrias. Elas só fazem reafirmar as heranças
malditas da nossa desigualdade, instituída nos tempos coloniais, afetando
severamente a estabilidade democrática e republicana nacional.
1 https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2022/Outubro/100-das-secoes-totalizadas-confira-como-ficou-o-quadro-eleitoral-apos-o-2o-turno
2 https://veja.abril.com.br/coluna/radar/quem-sao-os-oitos-senadores-que-votaram-contra-a-intervencao-no-df/