quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

Money, Money, Money, ...


Money, Money, Money, ...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Ah, a desfaçatez política nacional! Enquanto se arrasta no “toma lá, dá cá” as votações para a PEC (Proposta de Emenda Constitucional)1 da Transição, os nobres congressistas de Brasília não titubearam em aprovar o “aumento de salário para presidente, ministros e parlamentares”, cujo “projeto aprovado na Câmara e no Senado, em quatro anos, estabelece um reajuste que será de 37,32% a 50%, dependendo do cargo” 2.

Pois é, mesmo “ ‘Esperança’ tendo sido eleita a palavra do ano de 2022 pelos brasileiros” 3, algo continua podre no Reino do Brasil. Aprovar algo dessa natureza, diante de um cenário de empobrecimento explícito de uma gigantesca parcela da população, às vésperas do Natal, é de uma indiferença e insensibilidade total. Na verdade, a paga inversamente proporcional ao apoio recebido através dos votos de seus eleitores.

Caro (a) leitor (a), que não reste mais dúvidas, o Brasil não é empático, não é fraterno, não é humano! Daí o fato de que a alternância democrática de poder não significa que o ranço histórico colonial, a nutrir a ultradireita no país, irá desaparecer. A representação político-partidária, há tempos, não vê mais sentido em dissimular o que de fato defende e ostenta, porque de um jeito ou de outro ela acaba se elegendo ou encontrando meios para permanecer nos bastidores do poder nacional.

E assim, de migalhas em migalhas vão cevando aqueles que lhes garantem tamanhas regalias, privilégios e posições, ou seja, o cidadão eleitor. Cevando esperanças vãs! Aliás, é importante destacar aqui o tamanho do desvirtuamento semântico que a classe política operacionaliza em relação à esperança. Transformaram elementos constitutivos dos direitos sociais do brasileiro – saúde, educação, alimentação, segurança, emprego, previdência social, transporte, cultura lazer - em objetos depositários de esperança, por parte de um expressivo contingente da população, dada a inacessibilidade imposta pelas conjunturas político-econômicas.

Pois é, a esperança brasileira foi alçada ao plano de expectativa de sobrevivência! Esperança no pão nosso de cada dia. Esperança de um teto para morar. Esperança de poder estudar. Esperança de um trabalho. Esperança de retornar vivo para casa. Esperança... Mas, sobretudo, esperança de que um dia, toda aquela quantidade de impostos pagos, diariamente, se converta em uma vida de menos aflição e mais dignidade, para quem vive as aventuras e as desventuras do cotidiano nacional.

E se ter esperança parece bom, parece saudável, lamento, mas não é bem assim. Não há instrumento mais poderoso para a vigilância e o controle social do que o excesso de esperança. Pessoas esperançosas costumam ser cordatas. Como se a esperança fosse um emaranhado de fios que cada um que se esgarça, que se rompe, ainda resta uma possibilidade de se prender a outro e tocar a vida adiante. Desse modo, ela cria uma aura de coragem, de bravura, de heroísmo que ajuda a nutrir as almas mais desesperadas, mais aflitas, trazendo um certo tipo de domesticação e submissão social. Como escreveu Clarice Lispector, “Prescindir da esperança significa que eu tenho que passar a viver, e não apenas a me prometer a vida” (A Paixão Segundo G.H.)

Entende, agora, por que é tão acintosa a construção política nacional? Mesmo as migalhas são dadas com uma mão e tiradas com a outra, por aqueles que dizem representar o povo. Sobre a esperança, melhor nem comentar! Aquele “sonho do homem acordado”, de Aristóteles, os representes político-partidários brasileiros conseguiram extinguir, corrompendo-a de todas maneiras. A tal ponto de que, hoje, ela não passa de um estado de transe, no qual se tenta desesperadamente anestesiar a alma diante de tantas decepções e sofrimentos. Não é mais uma esperança verde, viçosa, bonita. É só uma esperança sem cor, autômata, blasé.