De
certezas em certezas... o mundo nunca foi tão incerto!
Por
Alessandra Leles Rocha
Pelo menos em tese, a construção ideológica
da contemporaneidade permitiu aos indivíduos acreditarem em uma vida sem
limites, na mais plena liberdade. A grande questão é que o ideário não cabe na
prática! Aqui e ali, na dinâmica do cotidiano, os limites, as restrições, os
impedimentos, aparecem para nos trazer de volta à realidade, inclusive, furando
a bolha do individualismo para nos confrontar coma existência coletiva, ampla e
plural.
Então, é muito curioso percorrer
pelas trilhas dos veículos de informação e comunicação e me deparar com um
conjunto de boas análises em meio a um mar de variáveis desestabilizadoras das
certezas. São tantos os gatilhos prontos a deflagrar a desconstrução das evidências,
das convicções; mas, passam despercebidos, invisibilizados, por conta de um narcísico
movimento de quereres e vontades que se estabelece por aí.
Apesar de o planeta continuar seu
ritmo incessante de rodopios em volta do próprio eixo e da sua estrela maior, o
Sol, a velocidade de transformações impostas pela própria dinâmica das relações
sociais é simplesmente absurda. Da manhã para tarde, da tarde para noite, da
noite para a madrugada, as informações vão sendo ajustadas e revisadas em uma
intensidade demasiadamente frenética. A tal ponto que, muitas vezes, torna-se
impossível acompanhar minuto a minuto o que acontece no mundo. O imponderável se
apropriou do tempo!
Acontece que em meio a toda essa
liberdade fluida, etérea, o seu excesso parece pesar e uma busca por algum
norte de estabilidade, de segurança, de equilíbrio, tem sido presença constante
no dia a dia do ser humano. Afinal, incertezas assustam, desestabilizam! É preciso
ter um lugar para se apoiar. Não dá para manter o equilíbrio, a serenidade,
transitando à deriva na vida, sujeito ao que der e vier. Pois o viver não se dissociou
de certas cláusulas pétreas. Temos necessidades fundamentais que não podem ser comprometidas.
Tanto que a fronteira entre a vida e a morte é uma linha muito tênue.
E nessa busca, todos os veículos de
informação e comunicação se tornam referências em nome de um ponto de apoio, como
um farol. As pessoas, então, se apegam àquelas palavras, àquelas ideias, àquelas
pseudocertezas, como uma boia de salvação. Daí eu me pergunto se realmente elas
acreditam nisso, se aquelas informações lhes trazem realmente algum sentimento
pacificador. Antigamente, os jornais tinham vida útil de um dia, depois iam
para o lixo, para embalar coisas na feira. Hoje, o volume e a intensidade de
notícias resistem a algumas horas. Exceto, aquelas de extrema relevância e
impacto social.
Em geral, a efemeridade é quem
dita as cartas! Decisões são tomadas e reconsideradas em um piscar de olhos. A pressa
em correr atrás do relógio, das obrigações, da vida, tem gerado uma superficialidade
nociva a todo o conjunto de crenças, valores, princípios, convicções, que
estruturam a identidade humana. Fazendo as pessoas se sentirem inadequadas para
caber nas conjunturas diante de transformações tão abruptas. Isso leva ao estresse,
à melancolia, ao desalento, à ansiedade, a um adoecimento social generalizado.
Afinal, o amanhã, o futuro, que
sempre pareceu uma perspectiva de realizações, de conquistas, de melhoras, de
repente foi lançado a uma vala de desespero, de insegurança, de instabilidade. Como
confiar? Como acreditar que tudo irá transcorrer dentro do planejado? A
expressão “Mas, e se...” é um
fantasma que assombra a sociedade contemporânea, cada vez mais furioso e
perverso. Como se conduzisse a todos para pisar sobre um imenso tablado feito de
ovos. Um pequeno deslize, um ato em falso, e tudo desaba! A vida sob a iminência
da reconstrução, do recomeço, num contínuo de novas bases.
Em algum momento da história a
vaidade humana chegou a acreditar que tinha em seu poder todas as respostas,
todas as soluções, todos os pulos dos gatos. Só que não. O fio da meada se
perdeu e nos enredamos na nossa própria teia, o que permitiu nos tornarmos frágeis
e vulneráveis aos elementos do desconhecido. Postos de joelhos diante da nossa
demasiada altivez. Aliás, isso me faz lembrar Caio Fernando Abreu, quando disse
“As pessoas falam coisas, e por trás do
que falam há o que sentem, e por trás do que sentem há o que são e nem sempre
se mostra”.
Por isso, não é de surpreender
que de repente digam A, depois B, em seguida A novamente. No fim das contas, o
imponderável da vida é uma trama de desconhecidos internos, externos, determinados
ou aleatórios, que se unem para atravessar os espaços e nos despir de todas as
certezas. E assim, nos deparamos com uma das grandes obviedades da existência humana,
“Só sei que nada sei” 1.
1 Frase atribuída ao filósofo grego Sócrates.