segunda-feira, 29 de agosto de 2022

O ponto alto do debate eleitoral: CORRUPÇÃO


O ponto alto do debate eleitoral: CORRUPÇÃO

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Caro (a) leitor (a), por favor, não se engane com a beleza paradisíaca da geografia brasileira. Aqui não é o Céu! Aqui não vivem anjos com asas e auréolas! Talvez a beleza tenha vindo de brinde para ajudar a realidade a ser um pouco mais palatável e menos difícil de lidar! Mas é só. A grande verdade é que o dia a dia por aqui não é missão para qualquer um.

Dito isso, nos deixemos invadir pelas reflexões a respeito do dia seguinte ao primeiro debate eleitoral entre os presidenciáveis, ocorrido na noite de ontem 1, tomando por assunto principal a corrupção. Sim, porque daqui e dali ela apareceu na boca de todos eles, como se estivessem tratando de uma questão puramente contemporânea, o que não é fato.

Vamos estudar história, minha gente! Há pouco mais de 500 anos, essa terra nunca viveu sob ares dissociados de quaisquer vestígios dessa praga social! Chego a pensar que ela veio escondida em alguma nau e, por aqui, encontrou água, alimento e abrigo para viver e se multiplicar. Pois não há momento na história brasileira em que a corrupção não se faça presente como protagonista ou coadjuvante. Mudam-se os cenários, os roteiros, as personagens, o momento..., mas, lá está ela, como uma das atrizes mais importantes da companhia.  

Então, precisamos rasgar o verbo e colocar os pingos nos is! É parte das relações sociais brasileiras o velho hábito de lançar sobre ombros alheios as responsabilidades e obrigações, que não se pretende assumir ou resolver. De modo que a culpa de tudo aquilo que dá errado, que foi mal feito, que gerou problema, é “dos otro”. Esse sujeito genérico, sem rosto, sem identidade, que veste bem a qualquer um que esteja em linha de colisão com o remetente interlocutor.

E assim, cada geração tem o rol “dos otro” composto por figuras próprias de sua época. A questão é que a corrupção só ganha corpo no Brasil, ou melhor, só cai na boca do povo, quando os malfeitos escapolem e alcançam à luz do Sol.

Ora, já deveriam saber que não há crime perfeito! E se não há, mais dia menos dia, ele ganha as páginas dos veículos de informação e comunicação através do ato falho de algum participante mais imprevidente ou da divulgação de alguma investigação policial que chegou a termo. Resultado, o corre-corre ferve na sociedade! Afinal, ninguém quer estar no rol “dos otro”.

De modo que o contexto da corrupção acaba caindo na formatação de seriado de TV. Cada temporada tem seu núcleo de corrupção definido e é sobre ele que recaem todo tipo de comentários, maledicências, acusações, como se fossem o mais absurdo retrato da excepcionalidade da realidade nacional.

Êpa! Mas, não são! Mas, imbuídas em fazer parecer que sim, as narrativas são esquentadas e requentadas inúmeras vezes com o único propósito de conter a disseminação totalitária dos casos; pois, isso representaria o caos completo no país. Um verdadeiro balaio de gatos!

E enquanto alguém aponta a corrupção “dos otro", se esquece de todos os outros dedos que apontam para si. Simples de entender, quando se olha para as últimas décadas brasileiras. No entanto, há algo de mais podre nesse reino brasileiro, que remonta também das nossas heranças coloniais.

O fato de que o poder e a governança no país estiveram majoritariamente, transitando, ao longo desses mais de 500 anos, dentro de um padrão que partiu de um berço monárquico, depois caiu nos braços de sua descendência burguesa republicana até chegar na elite ideologicamente estruturada nos vieses da direita. Então, é claro que eles não querem se colocar em risco.  

Portanto, a solução oportuna, que veio a calhar perfeitamente para a direita nacional, foi a presença de um governo de esquerda no país. A novidade faria com que a população prestasse atenção neles e desconsiderasse o resto da história.

Como se pudessem tecer a corrupção por uma trama indissociada à esquerda, cujo resultado inevitável estivesse alicerçado por esse arcabouço ideológico. Tudo para não admitirem as marcas da corrupção da direita e, nem tampouco, a insatisfação de terem temporariamente sido preteridos do poder, o qual sempre acreditaram lhes pertencer.   

Bizarro? Bizarríssimo. Porque a corrupção não tem partido, não tem bandeira, não tem ideologia. Corrupção é um comportamento humano. Pessoas promovem corrupção e/ou se deixam corromper. Fraqueza de caráter? Sim. Ambição desmedida? Sim. Ganância? Sim. Fazer da vida um jogo? Sim. ...

São muitas as possibilidades; mas, todas elas perpassam pela condição existencial humana. É esse ser estranho e complexo que, vez por outra, se deixa enredar pelos caminhos tortuosos e delirantes da vida para sentir correndo nas veias a adrenalina do poder.

E esse movimento prospera tão bem nos campos da política porque encontra neles um terreno para florescer, ou seja, o fisiologismo. Um país de profundas desigualdades, de uma frágil consciência identitária e cidadã, como não seria inevitável que certos representantes e servidores públicos não viessem a luzir a ideia de satisfazer seus interesses pessoais, individual ou coletivamente, a partir da obtenção de vantagens e benefícios ainda que em detrimento do bem comum?

É por isso que a corrupção não é privilégio nacional! Há corrupção em todo o mundo. Em alguns lugares mais. Em outros menos. Portanto é preciso romper com essa ingenuidade, esse puritanismo de ocasião, e enfrentar os fatos como são. O ponto é, como pretendemos lidar com essas práxis tão arraigadas historicamente?

Quais as nossas propostas para romper com esses ares de perplexidade a cada novo escândalo de corrupção, quando sempre estivemos cientes de que ela se escondia quieta sob nossos olhos? Pretendemos ser mais vigilantes? Pretendemos punir os responsáveis? Pretendemos cobrar as restituições materiais e imateriais da corrupção?

Veja bem, se não fomos ainda corrompidos pelos moldes das práticas fisiológicas vigentes, fomos corrompidos com o nosso silêncio, a nossa inação, a nossa dissociação em relação ao senso cidadão. Quando banalizamos, naturalizamos, trivializamos as corrupções nacionais a tal ponto de considerarmos algum tipo de gradação ou estratificação para elas.

Ora, ora! Acontece que corrupção é corrupção. Não tem maior ou menor. Não tem pior ou melhor. Não tem de esquerda e nem de direita. E o que é pior, infelizmente, sempre haverá o risco de ela existir. Afinal, onde há seres humanos haverá sempre a possibilidade ameaçadora de a corrupção acontecer. Entendeu agora?