Quem
paga pelos prejuízos?!
Por
Alessandra Leles Rocha
É triste, muito triste, perceber
como a população brasileira não se incomoda em enxergar a vida a partir de uma
perspectiva tão limitada. Como se cada um se restringisse a considerar, apenas,
aquilo que está dentro dos seus limites, de modo que os problemas deixassem de
ser de todos para cair no rol das individualidades. No entanto, não é assim que
as coisas funcionam!
Ao não se preocupar com os
caminhos da Educação brasileira, por tabela as pessoas se esquecem da Ciência. Sim,
para ser cientista e fazer Ciência são necessários longos anos de estudo,
dentro de uma base sólida e eficiente de Educação, que seja capaz de
desenvolver habilidades e competências suficientes para atingir os objetivos
almejados.
Acontece que se não há Educação,
também, não há Ciência e, nem tampouco, o cotidiano contemporâneo como se
conhece. Pois é, ninguém acorda pela manhã e começa a enumerar os benefícios trazidos
pela Educação e pela Ciência; porém, eles estão lá. Nos alimentos, nos eletrodomésticos,
no combustível, no veículo de transporte, no asfalto da rua, na edificação das residências,
na medicação de uso contínuo, no vestuário, nos calçados, nos cosméticos; enfim
...
Por trás de todas as cadeias
produtivas de qualquer país estão milhares de cientistas trabalhando
diariamente pelo conforto, segurança, bem-estar, redução do tempo, para o
consumidor final, que somos nós. Enquanto milhares de professores se ocupam em
garantir a renovação do elenco de novos cientistas e pesquisadores.
Pena, que tantas pessoas não
enxerguem a dimensão que tudo isso representa e não só desdenham a Educação e a
Ciência, como consideram desnecessários e não importantes os investimentos
públicos para esses dois setores. Isso porque, infelizmente, no Brasil, há uma
compreensão equivocada, por parte de 6% da população, a elite, de que o
arcabouço dos investimentos públicos só atende aos pobres do país. Portanto, eles,
no alto do seu poder aquisitivo, não estariam recebendo nenhum retorno.
Mas, por mais que suas vidas estejam
condicionadas a aquisição de produtos importados, o simples fato de viverem
nesse país não os isenta de participar dos benefícios oriundos da Educação e da
Ciência nacionais. Aliás, essa consciência impacta, também, os importados, cujo
desenvolvimento se deu pela Educação e Ciência de seus respectivos países.
Ah! E como poderiam ser mais
expressivos esses benefícios! Há décadas o país vem negligenciando e sucateando
a Educação e a Ciência brasileiras. Uma verdadeira sabotagem ao progresso e ao
desenvolvimento nacional. Mas, nos últimos 2,5 anos isso se operacionalizou de
maneira drástica.
Somente em relação a ministros, a
pasta da Educação passou por 5 nomes diferentes, até o momento, o que
obstaculizou severamente o planejamento e o desenvolvimento das ações no setor.
Sim, porque não há somente impactos externos, ou seja, repercutidos junto à
população; mas, também, impactos internos dentro dos Ministérios.
Tanto na educação quanto na
Ciência houve uma reestruturação organizacional que comprometeu inúmeras ações
do governo, incluindo a extinção de algumas secretarias e órgãos de apoio,
repercutindo na exoneração de quadros técnicos experientes e fundamentais ao
bom andamento das pastas.
O pior é que a razão de tudo isso
foi baseada em especulações ideológicas; visto que, a atual gestão sempre considerou
as respectivas áreas, como reduto de pessoas de visão “esquerdista”. Portanto,
a ideia era apenas destruir e acabar com o incômodo; o que seria feito em
substituição para dar continuidade ao fluxo natural dos trabalhos, isso ninguém
se preocupou. Eles não dispunham de nenhum planejamento a respeito.
Em suma, o resultado levou a prejuízos
tanto de ordem humana quanto econômica. A redução dos recursos foi tamanha que inúmeros
projetos foram interrompidos pela inviabilização, ou seja, a ideia foi parar a Educação
e a Ciência.
Dentro desse contexto, o Brasil ampliou
a estatística das perdas cientificas. Seus professores e cientistas mais
renomados estão se deslocando para outras universidades, mundo afora, para
desenvolverem seus trabalhos. Vejam só, a que ponto chegamos!
Depois de o Brasil investir na
educação e na formação científica desses indivíduos, o país os entrega “de
bandeja” para que outros usufruam de seus conhecimentos e descobertas. Sem contar,
que é assim, dessa forma, que o país deixa de receber milhões em royalties de patentes de diferentes produtos
e se vê obrigado a importar, pagando verdadeiras fortunas.
Então, apesar de absurdo o “apagão”
nos serviços do Ministério da Ciência e Tecnologia, particularmente, em relação
à Plataforma Lattes, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq), que armazena os dados dos pesquisadores brasileiros 1, ele se explica no contexto de como a Educação
e a Ciência estão abandonadas.
Bem, para quem se escandaliza, ou
se preocupa, com o mau uso do dinheiro público e com a ineficiência dos
serviços cotidianos, essa breve reflexão traz mais uma razão para a sociedade se
importar e parar de pensar que a Educação e a Ciência, no Brasil, não lhes dizem
respeito. Diz sim; diz muito. Porque esse dinheiro sai da enxurrada de impostos
e tributos que todos os cidadãos pagam por ano.
Por essa razão, deveriam estar
resultando em benefícios para todos. Se não estão, é uma pena, porque todos
continuam pagando e, certamente, pagarão mais e mais. De modo que, se a Educação
e a Ciência estão perdendo, os cidadãos também. Daí a necessidade de cobrar e
de exigir mais responsabilidade, transparência e retorno.
No fim das contas, a situação da
Educação e da Ciência, no Brasil, traduz na prática a fábula, A Ratoeira,
de Esopo;
pois, “na próxima vez que você ouvir
dizer que alguém está diante de um problema e acreditar que o problema não lhe
diz respeito, lembre-se que quando há uma ratoeira na casa, toda a fazenda
corre risco. O problema de um é um problema de todos” 2.
Afinal, depois do imponderável materializado por essa Pandemia, a incerteza
pode varrer o amanhã de qualquer um, democraticamente, sem cerimônia.
1
Tratam-se de informações sobre a produção acadêmica, as pesquisas em andamento
ou já finalizadas, os artigos publicados, as bolsas de pesquisa, entre outros
detalhes.