segunda-feira, 22 de março de 2021

Quanto custam os placebos de última geração???


Quanto custam os placebos de última geração???

 

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

 

É... você não acredita em Papai Noel, Coelhinho da Páscoa, Fada do dente, Mula sem cabeça e outras figuras; mas, insiste em acreditar que Cloroquina ou Hidroxicloroquina, Azitromicina e Ivermectina possam prevenir, e até tratar, o Sars-COV-2, apesar de todos os principais centros de pesquisa médica no mundo, incluindo a própria Organização Mundial da Saúde (OMS), dizerem se tratar de fármacos ineficazes para a doença e com potenciais riscos de agravamento da mesma. Por quê? Qual a motivação para acreditar nisso? Afinal, a humanidade ainda tem inúmeras lacunas a respeito desse novo vírus, para que alguém se arvore de tamanha convicção diante do absurdo infundado.  

Disse Paracelso, médico e físico suíço-alemão, no século XVI, que “a diferença entre o remédio e o veneno está na dose”; mas, hoje, a ciência demonstra na prática que é bem mais do que isso. Os fármacos são desenvolvidos com o propósito de debelar uma patologia específica; portanto, eles não são “chaves-mestras” que solucionam problemas diversos.

Eventualmente, pode ser que a partir de ajustes refinados em torno de dosagens e diluições, eles possam atingir esse efeito dentro de um espectro, como acontece com alguns antibióticos que são sensíveis a diferentes tipos de bactérias, não somente a uma. No entanto, esses achados demandam décadas de pesquisa para consolidar a validação de alguma resposta para uso comercial.

Além disso, o perfil orgânico das faixas etárias é sempre um fator de análise importantíssimo. A liberação ou restrição para crianças, jovens, adultos ou idosos é muito criteriosa e decorre, também, da dosagem a ser administrada. Às vezes a restrição é total para um determinado grupo, independentemente da quantidade proposta para administração. Outras, os cuidados decorrem do tipo de entrega do fármaco para o paciente, ou seja, se comprimidos, xaropes, cápsulas, injeções, inalações, pomadas, cremes ou adesivos.

E nem sempre uma medicação aprovada pelos sistemas de vigilância sanitária e epidemiológica chega as prateleiras das farmácias e drogarias para a aquisição direta do consumidor final. Muitas são de uso restrito ao ambiente hospitalar, por demandarem acompanhamento e vigilância dos corpos de saúde durante e pós-administração dos mesmos, em razão da possibilidade de efeitos colaterais severos e/ou letais. É o caso, por exemplo, de soros antiofídicos, soros antiescorpiônico e antiaracnídico e de medicações a base de Nitroglicerina, Haloperidol, Norepinefrina, Atropina e outros.  

Daí a questão, por quê fazer pouco da Ciência? Por quê afrontar as orientações e as recomendações das mais importantes autoridades médicas? Por quê optar pelo risco de complicações e agravamento da infecção pelo Sars-COV-2? Se o sistema de saúde, na sua integralidade, está em situação de colapso. Faltam leitos, equipamentos, equipes de saúde, medicamentos, oxigênio ... enquanto pessoas estão morrendo sem atendimento, em filas de espera que só fazem aumentar e sobrecarregar o sistema.

Se as novas variantes virais trouxeram um novo panorama das infecções no que diz respeito à gravidade, nível de contaminação e disseminação social e, perfil etário; o fato das pessoas se disporem a utilizar drogas inadequadas e ineficazes ao tratamento da infecção pelo Sars-COV-2 amplia a incidência de intercorrências médicas e, por consequência, o período de internação. De modo que essa junção de fatores implica na lentidão da liberação de leitos hospitalares para dar vazão as listas de espera.

Isso quer dizer que não se trata de uma escolha pessoal, de uma decisão particular. Os usuários de Cloroquina ou Hidroxicloroquina, Azitromicina e Ivermectina estão desconsiderando a pressão que o uso dessas medicações está ocasionando no sistema de saúde como um todo. E isso não tem apenas um custo material; mas, um custo ético e moral incomensuráveis.

Afinal de contas, o país está perdendo mais de 2 mil vidas diariamente. Sem contar o efeito alienante que essas drogas produzem socialmente, levando milhares de pessoas a desacreditar na aplicação correta das medidas sanitárias vigentes – uso de máscaras, distanciamento social, higienização constante das mãos – e a imunização pelas vacinas já disponíveis.

Talvez, seja hora de começarem a pensar seriamente que “suas bombas não matam nossa fome, mas alimentam a nossa destruição”1. Portanto, não faz mais sentido essa apologia à ignorância voluntária travestida de Cloroquina ou Hidroxicloroquina, Azitromicina e Ivermectina.

Já são mais que visíveis os prejuízos humanos e materiais até aqui, com toda essa dinâmica surreal de desconexão e insuficiência, para se compreender que toda essa irracionalidade, defendida com unhas e dentes por alguns, lançou o país em um poço sem fundo. Embora, isso só tenha acontecido porque “se você não sabe onde quer ir, qualquer caminho serve” 2.



1 Citação do filme V de Vingança (V for Vendetta), de 2005.

2 Citação do livro Alice no País das Maravilhas, escrito por Lewis Carroll, em 1865.