Quanto
custam os placebos de última geração???
Por
Alessandra Leles Rocha
É... você
não acredita em Papai Noel, Coelhinho da Páscoa, Fada do dente, Mula
sem cabeça e outras figuras; mas, insiste em acreditar que Cloroquina
ou Hidroxicloroquina, Azitromicina e Ivermectina possam
prevenir, e até tratar, o Sars-COV-2, apesar de todos os principais centros de
pesquisa médica no mundo, incluindo a própria Organização Mundial da Saúde
(OMS), dizerem se tratar de fármacos ineficazes para a doença e com potenciais
riscos de agravamento da mesma. Por quê? Qual a motivação para acreditar nisso?
Afinal, a humanidade ainda tem inúmeras lacunas a respeito desse novo vírus,
para que alguém se arvore de tamanha convicção diante do absurdo
infundado.
Disse
Paracelso, médico e físico suíço-alemão, no século XVI, que “a
diferença entre o remédio e o veneno está na dose”; mas, hoje, a ciência
demonstra na prática que é bem mais do que isso. Os fármacos são desenvolvidos com o
propósito de debelar uma patologia específica; portanto, eles não são
“chaves-mestras” que solucionam problemas diversos.
Eventualmente,
pode ser que a partir de ajustes refinados em torno de dosagens e diluições,
eles possam atingir esse efeito dentro de um espectro, como acontece com alguns
antibióticos que são sensíveis a diferentes tipos de bactérias, não somente a
uma. No entanto, esses achados demandam décadas de pesquisa para consolidar a
validação de alguma resposta para uso comercial.
Além disso,
o perfil orgânico das faixas etárias é sempre um fator de análise
importantíssimo. A liberação ou restrição para crianças, jovens, adultos ou
idosos é muito criteriosa e decorre, também, da dosagem a ser administrada. Às
vezes a restrição é total para um determinado grupo, independentemente da
quantidade proposta para administração. Outras, os cuidados decorrem do tipo de
entrega do fármaco para o paciente, ou seja, se comprimidos, xaropes, cápsulas,
injeções, inalações, pomadas, cremes ou adesivos.
E nem sempre
uma medicação aprovada pelos sistemas de vigilância sanitária e epidemiológica
chega as prateleiras das farmácias e drogarias para a aquisição direta do
consumidor final. Muitas são de uso restrito ao ambiente hospitalar, por
demandarem acompanhamento e vigilância dos corpos de saúde durante e
pós-administração dos mesmos, em razão da possibilidade de efeitos colaterais
severos e/ou letais. É o caso, por exemplo, de soros antiofídicos, soros
antiescorpiônico e antiaracnídico e de medicações a base de Nitroglicerina,
Haloperidol, Norepinefrina, Atropina e outros.
Daí a
questão, por quê fazer pouco da Ciência? Por quê afrontar as orientações e as
recomendações das mais importantes autoridades médicas? Por quê optar pelo
risco de complicações e agravamento da infecção pelo Sars-COV-2? Se o sistema
de saúde, na sua integralidade, está em situação de colapso. Faltam leitos,
equipamentos, equipes de saúde, medicamentos, oxigênio ... enquanto pessoas
estão morrendo sem atendimento, em filas de espera que só fazem aumentar e
sobrecarregar o sistema.
Se as novas
variantes virais trouxeram um novo panorama das infecções no que diz respeito à
gravidade, nível de contaminação e disseminação social e, perfil etário; o fato
das pessoas se disporem a utilizar drogas inadequadas e ineficazes ao tratamento
da infecção pelo Sars-COV-2 amplia a incidência de intercorrências médicas e,
por consequência, o período de internação. De modo que essa junção de fatores
implica na lentidão da liberação de leitos hospitalares para dar vazão as
listas de espera.
Isso quer
dizer que não se trata de uma escolha pessoal, de uma decisão particular. Os
usuários de Cloroquina ou Hidroxicloroquina, Azitromicina e Ivermectina estão
desconsiderando a pressão que o uso dessas medicações está ocasionando no
sistema de saúde como um todo. E isso não tem apenas um custo material; mas, um
custo ético e moral incomensuráveis.
Afinal de
contas, o país está perdendo mais de 2 mil vidas diariamente. Sem contar o
efeito alienante que essas drogas produzem socialmente, levando milhares de
pessoas a desacreditar na aplicação correta das medidas sanitárias vigentes –
uso de máscaras, distanciamento social, higienização constante das mãos – e a
imunização pelas vacinas já disponíveis.
Talvez, seja
hora de começarem a pensar seriamente que “suas bombas não matam nossa
fome, mas alimentam a nossa destruição”1.
Portanto, não faz mais sentido essa apologia à ignorância voluntária travestida
de Cloroquina ou Hidroxicloroquina, Azitromicina e Ivermectina.
Já são mais
que visíveis os prejuízos humanos e materiais até aqui, com toda essa dinâmica
surreal de desconexão e insuficiência, para se compreender que toda essa
irracionalidade, defendida com unhas e dentes por alguns, lançou o país em um
poço sem fundo. Embora, isso só tenha acontecido porque “se você não sabe onde quer
ir, qualquer caminho serve” 2.
1 Citação do filme V de Vingança (V for Vendetta),
de 2005.
2 Citação do livro Alice no País das Maravilhas, escrito
por Lewis Carroll, em 1865.