Como
uma “Matrioska” de problemas
Por
Alessandra Leles Rocha
Eu sei que a vida transita em
movimento de arrastão, levando tudo junto e misturado sob uma dinâmica de
acontecimentos intensa. Mas, isso não é pretexto para dar-lhe a forma de uma “Matrioska”, na qual um problema emerge
de outro, que emerge de outro e assim por diante, em um contínuo sem fim. Porque
é isso que torna tudo tão cansativo e extenuante. Não enxergar soluções, apenas
problemas. São tantos e ninguém estabelece uma lógica de prioridades!
Não, porque ela não exista. Mas,
simplesmente, porque essa efervescência é de algum modo conveniente. A desorganização
do mundo desorganiza a sociedade. São tantos vetores em direções opostas, que
as forças acabam se anulando e a inércia imobilizante prevalecendo. O que cria
um sentimento desalentado de impotência e extremo cansaço moral.
É sabido que as doenças
repercutem além dos pacientes, no ambiente em que eles convivem. Mas, acredito
que as mazelas sociais que nos rodeiam de maneira secular são muito mais
potencializadoras de enfermidades do que quaisquer patologias. A rudeza do
cotidiano suga as energias, destroça o bom ânimo e interrompe o impulso de
ação. O que causa um sofrimento tão intenso que abate até mesmo, quem se
considera um poço de fortaleza.
Sim, porque se uma doença tem o
dom do imprevisível tomando-lhe as rédeas, as mazelas do mundo não são
diferentes. Não está nas mãos do ser humano controlar toda a fúria das
adversidades do dia a dia. Então, cada dia se incumbe de proliferar as
preocupações. E são tantas! Obrigações ordinárias e extraordinárias que gritam
alto pela sua resolução.
São incertezas que só fazem
descompensar o ritmo do corpo. Coração em sobressaltos. Cabeça doendo. Estômago
revirado. E para isso não há vacina. Nem remédio. Nem tratamento. Porque a
causa não é essencialmente orgânica; é da vida. As notícias que chegam de todos
os lados, a cada segundo, desestabilizando as estruturas por ventos fortes de
preocupação. Cada um tenta se segurar de alguma forma para não se deixar levar;
mas, é só mais um esforço a acrescer ao desgaste.
E, de repente, se tem mesmo a comprovação
de que é “cada um por si e Deus por todos”.
Porque não parece existir boa alma que queira, ao menos, tentar mitigar os
problemas. Evitar que eles se proliferem tão intensa e desordenadamente. Ao contrário,
parece haver uma legião de gente que “advoga
para o Diabo”, querendo que a situação fique cada vez mais extrema e
difícil. De modo que os dias arrastam correntes pesadas por caminhos totalmente
tortuosos.
Resta saber, até quando a
população irá resistir. Afinal, tudo tem um limite, inclusive a dor. A vida vai
acontecendo e as conjunturas vão tramando o panorama do amanhã. Nem sempre é o
que se imagina. Um fio fora do lugar, um ponto apertado demais, ... e o
resultado insólito toma as pessoas pela total perplexidade.
Quanto a história do mundo já não
contou sobre isso? Aliás, ela conta todos os dias. O sol que chega pela manhã está
sempre embebido pelo novo e seus mistérios. Apesar da aridez causticante que
temos tido que enfrentar, é nessa consciência esperançosa que, talvez, tenhamos
que nos debruçar e aspirar um fiapo de alento para seguir em frente. Confiar na
mudança. Na transformação. Nos rodopios, sem nexo aparente, da vida.
Segundo John Dewey, “nós só pensamos quando nos defrontamos com
um problema”. Quem sabe não seja este o momento de resgatarmos quem somos,
nossas crenças, valores e princípios, para nos posicionarmos cidadãos mais conscientes,
hein?! Tudo o que a vida nos apresenta está implicitamente assinado por cada um
de nós, por nossas ações e omissões. Direta ou indiretamente, a existência de
uma gigantesca “Matrioska” de
problemas é consequência de como temos nos posicionado sobre cada assunto. Por
isso, “apressa-te a viver bem e pensa que
cada dia é, por si só, uma vida” (Sêneca – filósofo); caso contrário,
jamais conseguiremos romper esse círculo vicioso.