“Mens
sana in corpore sano” 1
Por
Alessandra Leles Rocha
Acompanho
a corrente humana que tem se preocupado com a saúde mental da população, nesta
Pandemia. Razões não faltam para acender as luzes de alerta sobre o assunto.
Especialmente, aquilo que se verbaliza nas silenciosas entrelinhas da
convivência humana. Sim, porque muito além da angústia provocada pelo
isolamento, pela depressão, pela carência do afeto corpóreo, a sanidade mental
também sofre severos desajustes a partir dos discursos e narrativas
disseminados, particularmente, pelos meios de comunicação virtual.
Situações
extremas tendem a fazer as pessoas buscarem sentido para suas existências. Como
os limites desta são muito tênues, não é difícil, de repente, que determinadas
construções dialógicas sejam, no fundo, um flerte com diferentes formas de radicalismo,
de extremismo exacerbado.
E
não há como negar a existência de um contexto de fragilização e vulnerabilidade
consumindo o equilíbrio da população. Então, sem que se dê conta, determinadas
palavras podem sim, ser decodificadas de uma maneira não ideal, não produtiva,
expondo a população a riscos graves e desnecessários.
Ora,
a maneira como a comunicação humana é desenvolvida determina seus vieses seja
para o Bem seja para o Mal. Quando, como e por quem as informações são
dispersadas são variáveis importantíssimas no resultado final. Mas, não é o
suficiente, porque o receptor precisa sentir-se confortável, aberto e
disponível a recebê-las; caso contrário, nada feito.
Entretanto,
é curioso como em plena Pandemia, proliferaram-se os golpes. São correntes
financeiras, aqui. Bilhetes premiados, ali. Prêmios a depender de dados
pessoais, acolá. Basta uma olhada, diária, na mídia para perceber como a
esperteza de alguns tem desgastado e prejudicado a vida de muita gente, por aí.
Parece que a legião de susceptíveis anda em franca expansão. Fruto da
desatenção? Talvez. Mas, pode ser imprevidência genuína, boa-fé demasiada ou,
atribuindo méritos ao espertalhão, uma boa lábia refinada.
O
problema é que a situação pode se estreitar e ir parar mais longe, saltar da
ronda policial e ir parar sobre as mesas das instâncias do Judiciário; quando a
dialogia começa a transitar inadvertidamente pelos meandros ameaçadores da
polarização político-ideológica. Infelizmente, esse não é um processo restrito
ao Brasil. Já anda se espalhando por muitos países e, por onde quer que vá,
acaba causando problemas muito sérios.
Havemos
de concordar que a realidade Pós-Moderna já não vinha ajudando muito na
manutenção de uma disposição reflexiva. É muito trabalho. Muita correria. Muita
intensidade da vida. Então, as pressões do cotidiano somadas a quantidade de
informações disponibilizadas por segundo no universo virtual, vieram
transformado os seres humanos em debatedores superficiais, de baixa qualidade
argumentativa, quase que meros leitores de títulos e manchetes.
O
que os torna um alvo perfeito para as investidas de discursos e narrativas
persuasivas que venham lhes garantir essa zona de conforto, a qual estão
habituados. Não há questionamentos sobre a qualidade da informação, a fidedignidade
das informações; portanto, não há interesse de checagem das mesmas. Então,
antes do que se imagina, elas circulam livres dentro de um espaço de
concordância, quase velada, por parte de muitos receptores.
Assim,
do discurso para a prática, a ação, é um pulo. Quantos desafios mortais
divulgados em redes sociais levaram à morte milhares de pessoas ao redor do
mundo? Muitos jovens, com certeza; mas, pessoas em outras faixas etárias também
morreram. É preciso entender que o tempo dispensado pela população nas
comunicações virtuais é cada vez maior. Agora, com a nova realidade imposta
pela Pandemia, a tendência é que seja mais intensificado. O que significa que
os discursos e narrativas persuasivas encontram um campo fértil e diversificado
para prosperar.
De
modo que as redes de tensão social já existentes tenderão a se estirar e as
consequências podem comprometer a estabilidade da população. E a necessidade em
se manter o equilíbrio nesse momento não é fundamental só do ponto de vista
imediato; mas, visando a Pós-pandemia. Criar e promover conflitos e desordens
desnecessárias é totalmente antiproducente para qualquer país. O mundo está
diante de um colapso médico-hospitalar. De um empobrecimento generalizado. De
uma lenta reorganização das matrizes econômicas. Enfim...
Por
isso, é preciso atenção à saúde mental na perspectiva da comunicação. Porque
ela tem potencial suficiente para desencadear um recrudescimento das violências
e promover a ruptura dos parâmetros de convivência e coexistência estabelecidos
pela humanidade.
O
mundo já possui mais de 2,7 milhões de mortos pela COVID-19. Isso já extrapolou
quaisquer limites que se pudesse tolerar para uma tragédia; ninguém precisa
conviver com mais instabilidade e temor rondando à espreita. Ninguém precisa de
violência mental.