quinta-feira, 20 de junho de 2024

Dia Mundial do Refugiado (World Refugee Day 2024)


“Não rejeitamos realmente os estrangeiros se são turistas, cantores ou atletas famosos, rejeitamos se eles são pobres, imigrantes, mendigos, sem-teto, mesmo que sejam da própria família.”  

Adela Cortina

(Filósofa espanhola e criadora do termo “aporofobia” — que significa rejeição ao pobre)

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segunda-feira, 17 de junho de 2024

Período sabático...


Período sabático...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Por mais limites que eu tenha estabelecido, em relação às Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs), é cada vez mais difícil não se deixar afetar pela avalanche de informações que nos chegam a todo instante.

Consciente de que somos energia, na medida em que tudo são átomos aglutinados, esse excesso é sim, muito desgastante. Afinal de contas, nem toda energia dissipada ou consumida é boa.

Basta uma breve passada de olhos pelos veículos de comunicação e de informação, para se ter a dimensão exata do perfil de notícias exibido. Nem tudo são flores! Aliás, temos muito mais espinhos!

E o que assistimos, o que lemos, o que refletimos, o que manifestamos a respeito, acaba também desempenhando um papel nessa contabilidade energética. Algo que não pode nos passar indiferente ou despercebido.

Foi, então, que decidi tomar uma decisão importante. Desde 2004, quando comecei a me dedicar à escrita, colocar no papel minhas impressões e considerações sobre a vida, o ser humano, o cotidiano, o planeta, através de crônicas e poesias, tornou-se uma atividade primordial para mim.

Acontece que o prazer, a satisfação, o contentamento, também, demandam limites. Escrever se transformou em algo tão natural, tão fluido no meu dia a dia, que muitas vezes eu produzia um texto atrás do outro. Tamanho era o impulso de traduzir as ideias e compartilhá-las com meus leitores.

Entretanto, passadas duas décadas desse processo contínuo, me dei conta de que esse movimento tem impactado sobre a minha saúde física e mental. Comecei a observar com mais atenção a quantidade de horas dedicadas ao trabalho de tecitura literária e a correlação delas com o meu cansaço, o meu desconforto postural, os gatilhos para minhas dores de cabeça, enfim.

Aí entendi que era fundamental promover uma mudança de rotas a respeito. Decidi constituir um período sabático para o meu exercício literário. Descansar a mente e o corpo em relação ao turbilhão de ideias, de informações, de acontecimentos, de maneira profunda e restauradora.

Por mais que eu tenha conseguido ingressar na jornada da meditação diária, o meu cenário existencial mostrou-se tão avassaladoramente cansativo e fatigante, que a minha dedicação aos momentos de tranquilidade, equilíbrio e relaxamento já não estão se mostrando suficientes às minhas demandas.

Ora, queiramos ou não, ser humano é ser multitarefas. Os apelos do mundo são muitos. São muitas obrigações, deveres, tarefas, a serem cumpridas a tempo e a hora, na maioria das vezes. Então, se podemos, ao menos, em algum aspecto, minimizar o peso dessa situação, devemos fazê-lo, sem pestanejar.

Assim, em profundo respeito aos meus leitores, resolvi anunciar essa pausa literária. Não estabeleci nenhum prazo, justamente, para não criar expectativas sobre o meu mental.  Vamos e convenhamos que minha mente esteve a postos, basicamente, em atividades intelectuais. Escrita literária. Escrita acadêmica. Docência.

E por mais que o mundo, na maioria do tempo, não reconheça a consumição gerada por esse tipo de atividade, ela existe, é real e é devastadora. Você emprega toda a sua energia psíquica, ainda que voluntária e prazerosamente, no que está fazendo; mas, quando acaba se sente destruído, com vontade de se deitar, fechar os olhos e dormir, enquanto puder.

Como já dizia Carlos Drummond de Andrade, “A vida necessita de pausas”; por isso, sem mais a acrescentar, bora para o meu período literário sabático! Afinal, agora começo a entender que “Depois de todas as tempestades e naufrágios o que fica de mim e em mim é cada vez mais essencial e verdadeiro” (Caio Fernando Abreu).   

sábado, 15 de junho de 2024

O poder das palavras


O poder das palavras

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Quando um assunto ganha as páginas da imprensa e explode em discussão coletiva por todos os espaço geográficos possíveis, é um ótimo sinal. Chegou-se ao limite do silenciamento, do obscurantismo, do proibido, de algo que tanto sufocava e alimentava uma série de angústias e questionamentos sociais.  O que muitas vezes não se percebe, em um primeiro momento, é que esse grito de liberdade transcende ao seu próprio estopim deflagrador.

Aliás, vale aqui ressaltar a seguinte reflexão: “Ora, todo discurso já traz em si a definição – mais, ou menos, precisa – de lugares ou de posições subjetivas a serem ocupados por este ou aquele indivíduo, segundo as relações políticas e sociais e, portanto, ideológicas admitidas e construídas num dado momento histórico-social, num dado discurso – sempre em formação -, determinantes da (s) verdade (s) a ser (em) assumida (s). É claro que essas posições podem sofrer modificações, mas jamais repentinas: muitas vezes, passam imperceptíveis, até que algum acontecimento as evidencie” (CORACINI, 2005, p.30) 1.

Por isso, a repugnância social despertada pelo Projeto de Lei (PL) 1904/2024 tem um amplo espectro de razões legítimas e incontestáveis. Mas, o ponto nevrálgico de todas elas, está na histórica objetificação feminina atravessada pelo patriarcado, a qual, não raras as ocasiões, é sufocada pela forçosa abstenção da sua discussão, em razão do peso da assimetria das relações de poder.

É, não basta que as mulheres representem 51,5% (104.548.325) 2 da população brasileira. O fiel dessa balança não é estatístico! As rédeas do mundo permanecem em mãos masculinas, apesar de todos os pesares. Portanto, há milênios, se construiu a ideia objetificante da figura feminina que permite legitimar a sua desumanização sob as mais diversas formas e conteúdos.

Tratada como objeto, como coisa, pela sociedade, a mulher é despida da sua dignidade humana, a fim de se tornar submissa, obediente, respeitosa e subordinada, a quaisquer decisões ou determinações estabelecidas pelas figuras do poder masculino. O que significa que essa recente discussão, no Brasil, trouxe à tona a reflexão em torno do patriarcado, ou seja, a existência histórica de um sistema sociopolítico que coloca majoritariamente os homens em situação de poder, de controle, de punição e de decisão.

A objetificação feminina é, portanto, um instrumento manejado pelo patriarcado. O que significa que não importa se estamos no século XVI ou no século XXI, se as influências dogmáticas religiosas são católicas ou protestantes, se a ciência merece respeito ou não, ... Esse ideário é parte integrante e integrada da identidade nacional, do Brasil. Em maior ou em menor escala, o patriarcado se expressa continuamente na sociedade brasileira; sobretudo, reafirmando a manutenção das assimetrias de direitos e deveres.

Entende agora, os motivos de impor uma lei que criminaliza a mulher, a partir da revitimização reverberante da violência (o estupro) por ela sofrida?  Entende agora, os motivos que privilegiam e atenuam a responsabilização de um estuprador, atribuindo-lhe, inclusive, o status da paternidade de um filho gerado pela mais abjeta violência?  ... No patriarcado o poder pertence aos homens, em todas as suas expressões, ou seja, na política, na justiça, na religião, na cultura.

Simplesmente, porque esse sistema se sustenta sem precisar se impor pela força numérica dos seus representantes, do ponto de vista demográfico. Está na própria organização social os fundamentos que favorecem o gênero masculino em detrimento ao feminino. Com atenção especial ao homem branco, cisgênero e heterossexual, tendo em vista o modelo eurocêntrico colonial. 

Por isso, a perpetuação das violências, do isolamento, da estigmatização e de todas as desigualdades deve ser entendida como uma política de afirmação da objetificação feminina, dentro dos diferentes espaços sociais brasileiros. A intenção de que não haja ruptura da estabilidade histórica de regalias, privilégios e poderes do gênero masculino, no Brasil, é o que está posto em qualquer discussão objetificante da mulher. É sobre isso.

Bem, “[...] se alargarmos a concepção de leitura e a considerarmos uma possibilidade de perceber o espaço social, então ler passa a significar lançar um olhar à nossa volta e perceber o que nos rodeia. Isso pode ser feito apenas para confirmar nossos pontos de vista ou para problematizar, questionar o que, aparentemente, não pode ou não deve ser questionado... “(CORACINI, 2005, p.39). De modo que é preciso aproveitar o momentum, quando a energia dos acontecimentos está em pleno ímpeto, em pleno impulso, em plena pujança, para FALAR, ARTICULAR, DIZER, EXPRESSAR, PRONUNCIAR, DIALOGAR, sobre a leitura que fazemos do contexto atual.

Afinal, parece não restar mais dúvidas de que “A língua envolve todas as ações e pensamentos humanos e possibilita ao indivíduo exercer influências ou ser influenciado pelo outro, desempenhar seu papel social na sociedade, relacionar-se com os demais, participar na construção de conhecimentos e da cultura, enfim, permite-lhe se constituir como ser social, político e ideológico [...]” (COELHO; MESQUITA, 2013, p.25-26) 3.



1 CORACINI, M. J. R. F. Concepções de Leitura na (Pós-) Modernidade. In: LIMA, R. C. de C. P. (Org.). Leitura: múltiplos olhares. Campinas: Mercado de Letras; São João da Boa Vista: Unifeob, 2005. p.15-44.

2 Dados do Censo Demográfico (2022) realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

3 COELHO, L. P.; MESQUITA, D. P. C. de. Língua, Cultura e Identidade: Conceitos intrínsecos e interdependentes. ENTRELETRAS, Araguaína/TO, v.4, n.1, p.24-34, jan./jul.2013.   

sexta-feira, 14 de junho de 2024

Foi uma grata notícia ...


Foi uma grata notícia ...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Foi uma grata notícia perceber que a alienação contemporânea não destruiu completamente o intelecto humano. Pois é, tudo parecia calmo até que ... milhares de cidadãs e cidadãos brasileiros foram para as ruas protestar contra o Projeto de Lei (PL) 1904/2024, que busca equiparar o aborto ao homicídio, inclusive, com pena mais severa para uma vítima de estupro, do que a pena prevista para o estuprador.

Essa movimentação que se capilarizou pelas mídias sociais, pelos veículos de comunicação e de informação, tradicionais e alternativos, por anônimos e famosos, pelas Organizações Não-Governamentais (ONGs), pelas personalidades científicas, ... na verdade, disse mais do que poderia supor.

Lamento informar que a dinâmica recente do Congresso Nacional brasileiro não tem sido vista e entendida de maneira correta. Uma passada de olhos pelas notícias para ver como o burburinho histriônico da oposição ao governo, diz respeito a uma série de pautas que repercutiram negativamente sobre os seus próprios planos, em razão do falatório popular.

A princípio, nada mais pertinente ao histórico colonial do país. Nesses pouco mais de 500 anos de história, as elites dominantes nacionais se acostumaram a fazer e a acontecer, sem precisar dar satisfação de absolutamente nada, ao restante da população. Todo os poderes estavam sob o seu guarda-chuva de domínio e comando, o que significa que estava estabelecida e consolidada uma relação de poder assimétrica.

Daí o erro, em não perceber que o mundo girou, girou, girou, ... e as relações sociais passaram por profundas metamorfoses à revelia das vontades e quereres dessa elite dominante nacional. Aos trancos e barrancos, brasileiros e brasileiras foram adquirindo vez e voz para reafirmarem a sua cidadania. O que afetou diretamente o equilíbrio de forças no tabuleiro do país.

O que torna curioso o comportamento do Congresso Nacional, quando decide tensionar e afrontar o governo eleito democraticamente, em 2022, apostando no desgaste político da figura presidencial. Antes de suas pautas serem de interesse, ou de importância, para o Executivo, seria de bom tom apurar em que medida elas mexem com as expectativas e demandas de, pelo menos, 50,83% dos votos que se colocaram em alinhamento ao progressismo nacional.

Aliás, porque tendo em vista as históricas ironias da política brasileira, o comportamento do eleitorado é bastante controverso. Ele não ajusta as suas escolhas representativas de maneira ideal. Haja vista que o Congresso vigente tem maioria contrária ao Executivo. No entanto, dependendo se o cenário compromete os seus interesses mais caros e sensíveis, esse eleitorado não se furta em romper laços de apoio com os seus representantes. Um sinal claro de que os ventos mudam e as pretensões eleitorais também.

Por mais que estes sejam tempos de uma realidade político-social bastante particular; sobretudo, em razão das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs), o ser humano ainda guarda a percepção consciente, e inconsciente, sobre o que afeta a sua vida. Apesar de todas as investidas do projeto necropolítico de poder, que as elites dominantes trabalham arduamente para consolidar, as sementes de resistência se dispersam em esforço contínuo.  

Como dizem, por aí, “quem faz barulho, bate palma, bate panela e grita bem alto a sua indignação”! Ou seja, fazem de tudo para deixar em evidência a sua oposição, a sua insatisfação, a sua frustração e, talvez, quem sabe, a sua indisposição em repetir o mesmo voto de apoio, em outro pleito. Diante de uma quebra de confiança, de uma ruptura desleal, emerge sempre um desconforto difícil de ser superado. Traições no campo político-partidário costumam ser comuns aos participantes; mas, para parte do eleitorado, a situação toca de uma maneira bem diferente.

Por isso, me parece tão bizarro o comportamento da oposição legislativa nacional. Entubar goela abaixo as suas vontades e quereres, a fim de construir o seu Brasil idealizado, é um risco político muito alto a se pagar. Depois de tudo que a humanidade experenciou até aqui, é simplesmente inconcebível acreditar que alguém irá aceitar, pacífica e entusiasticamente, retrocessos que imponham quaisquer domesticações à sua liberdade, aos seus direitos já adquiridos. Tá de brincadeira, né?!

Pode ser que muitos não tenham grandes aspirações para uma transformação social ousada, radical. Mas, que não queiram retrocessos, sob diferentes formas e conteúdos, isso me parece totalmente verdadeiro e plausível. Especialmente, depois da pandemia da COVID-19, a dimensão das perdas sociais foi dissecada e amplificada, de tal forma, que as pessoas não querem mais experimentar nada parecido.

Então, quando os veículos de comunicação e de informação se colocaram a exibir as imagens das pessoas nas ruas protestando, exteriorizando as suas emoções e sentimentos mais legítimos, um tipo de satisfação esperançosa me invadiu. De repente, vi materializada em suas figuras, o que um dia Jean-Paul Sartre falou: “O importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós mesmos fazemos do que os outros fizeram de nós”. Não nos esqueçamos disso!   

Dia do Doador de Sangue - 14/06

“A solidariedade é o sentimento que melhor expressa o respeito pela dignidade humana”.

Franz Kafka

Hemocentros no Brasil - https://www.gov.br/saude/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/doacao-de-sangue/hemocentros-no-brasil

Registro Brasileiro de Doadores Voluntários de Medula Óssea (REDOME / Instituto Nacional do Câncer) –

quinta-feira, 13 de junho de 2024

A tragédia humana em linguagens e números


A tragédia humana em linguagens e números

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Olhando para o Brasil se descobre que

§  104.548.325 (51,5%) cidadãos são mulheres e 98.532.431 (48,5%) são homens 1;

§  Mais de 700 mil presos estão em regime fechado 2;

§  Mais de 140 mil adolescentes cumprem medidas de liberdade assistida, semiliberdade, internação estrita ou prestação de serviços à comunidade 3;

§  Mais de 30 mil crianças e adolescentes em situação de acolhimento no país 4;

§  Mais de 2 milhões de crianças sem vagas em creches 5;

§  Mais de 9 milhões de pessoas analfabetas com 15 anos ou mais de idade 6;

§  Mais de 9 milhões de alunos não conseguiram terminar o Ensino Médio – 58,1% (homens) e 41,9% (mulheres) 7;

§  Quase 700 mil crianças e jovens, de 6 a 14 anos, fora da escola em 2023 8;

§  Quase 600 mil crianças de 0 a 4 anos e 1,765 milhão de crianças e adolescentes, de 5 a 17 anos, atingidas pela insegurança alimentar grave (fome) no país 9;

§  Mais de 260 mil pessoas vivem nas ruas do país 10; ...

Mahatma Gandhi perguntava: “O que destrói o ser humano? Política sem princípios, prazer sem compromissos, riqueza sem trabalho, sabedoria sem caráter, negócios sem moral, ciência sem humanidade, oração sem caridade”. Para uns e outros, por aí, a frieza bruta das estatísticas pode não dizer absolutamente nada. No entanto, isso não apaga, não invisibiliza, não diminui, o seu significado e a sua importância. Ao contrário do que possam imaginar, a linguagem expressa por esses números dialoga muito além.

Cada número em si mesmo já carrega o ônus da tragédia humana, da perversidade social embutida nas suas linhas e entrelinhas, as perspectivas e expectativas do futuro do país, enfim. Acontece que não para por aí. O olhar precisa decompor as inúmeras camadas presentes, para perceber como vivemos a esbarrar em pontas de iceberg, os quais desconhecemos, ou optamos por não conhecer, a devida dimensão.

Antes de Cristo, Platão, um filósofo e matemático grego, considerava que “Não há nada de errado com aqueles que não gostam de política, simplesmente serão governados por aqueles que gostam”. Mas, em pleno século XXI, a questão merece ser revista, na medida em que esse não gostar tem levado ao contexto político-partidário representativo, figuras que também não dispõem de apreço pela discussão política e, nem tampouco, pelo seu exercício.

O exemplo mais recente, a respeito, foi dado, ontem, quando o Projeto de Lei (PL) n.º 1904/2024 11, teve a tramitação aprovada em regime de urgência, na Câmara dos Deputados, em votação simbólica relâmpago, em apenas 23 segundos, sem maiores debates ou referências  ao tema. O que não significa que essa apresentação dos fatos consiga sintetizar a inteireza da infâmia parlamentar. Afinal, nem os silêncios, nem abstenções, nem as desculpas esfarrapadas, conseguem esconder o grau de ignorância, seja ela voluntária ou não, de certos membros do parlamento.

Os (as) nobres deputados (as) desconsideraram um princípio básico da dinâmica social. A vida é recortada e atravessada por questões diversas o tempo todo. Então, quando se pensa na proposta de equiparar o aborto ao homicídio, não dá para se desconsiderar, por exemplo, as estatísticas apresentadas no início dessa reflexão. Simplesmente, porque o impacto de uma decisão assim, sobre a dinâmica do país, é gigantesca e reverbera, por gerações, os problemas e desafios que passam a ser constituídos e acrescidos aos que já existem e, como se vê, não foram resolvidos.

Fica, então, visível o grau de despreparo dos (as) nossos (as) legisladores (as). Eles (as) parecem realmente acreditar que o seu papel representativo é retirar ideias mirabolantes da cartola, como fazem os mágicos no circo. Depois de uma longa e árdua jornada para a consolidação do exercício cidadão, através do voto, é profundamente decepcionante o nível de distanciamento dos representantes do povo em relação ao compromisso de atuar pelos interesses do eleitor, sem exceções de quaisquer naturezas, como prega a Constituição Federal.  

No entanto, o que se vê, cada vez com mais frequência, é exatamente o contrário. O ser político, no Brasil, está cada vez mais ensimesmado no seu individualismo narcísico. São eles (as) em primeiro lugar. Os seus interesses. As suas prioridades. O que significa que as mazelas seculares desse país vão se aprofundando de maneira abissal e sem nenhuma esperança de melhoria, de uma transformação positiva.  

Diante do exposto, lembremos das palavras de Eduardo Galeano: “Hoje as torturas são chamadas de ‘procedimento legal’, a traição se chama ‘realismo’, o oportunismo se chama ‘pragmatismo’, o imperialismo se chama ‘globalização’ e as vítimas do imperialismo se chamam ‘países em via de desenvolvimento’. O dicionário também foi assassinado pela organização criminosa do mundo. As palavras já não dizem o que dizem ou não sabemos o que dizem” 12.

E esse não saber é o sinal, mais claro, de como estamos presos às teias necropolíticas. No mundo das aparências que travestem a realidade, para torná-la mais digerível, mais palatável, o ser humano é induzido a não perceber como o uso do poder político e social, age ou se omite, a fim de determinar as importâncias e as desimportâncias em uma sociedade, na qual alguns podem permanecer vivos e outros devem morrer.



1 Dados do Censo Demográfico (2022) realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

7 Idem 6.

8 Idem 6.

9 Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua: Segurança Alimentar 2023, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

12 GAELANO, E. De Pernas pro Ar: a escola do mundo ao avesso. Porto Alegre: L&PM, 1999.  

quarta-feira, 12 de junho de 2024

Entre perspectivas e realidades


Entre perspectivas e realidades

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

É lamentável que se faça pouco da história brasileira, quando se analisa a realidade atual. Os absurdos mais estarrecedores da nossa contemporaneidade não são obra do acaso. Há uma lógica operando sobre os acontecimentos, que não deixa a menor dúvida a respeito.

Contrariando as expectativas dos mais crédulos de que a eleição de 2022 conseguiu formular uma frente ampla, os fatos falam por si. Há pouco mais de 500 anos, o Brasil é controlado pelas forças direitistas. Gerações e gerações das elites nacionais garantem a manutenção não só de suas regalias e privilégios históricos, bem como, da ocupação dos poderes.

A ascensão da esquerda brasileira, em 2002, foi um golpe certeiro na vaidade direitista. Eles jamais contaram com essa possibilidade. Era tanta certeza, tanta convicção, de que detinham o controle do país, e acabaram surpreendidos pelo resultado das urnas. Ali começa a ser gestado o sentimento de ódio, de revanchismo, por parte da direita e seus matizes, mais ou menos radicais.

Apesar dos pesares, os direitistas permaneciam no topo da pirâmide social, o que significa, do ponto de vista socioeconômico, em uma posição favorável de influência e de condições materiais para manipular a dinâmica dos acontecimentos, no sentido de retomada da sua posição mandatária no país.

Assim, fizeram. Considerando que, do ponto de vista político-partidário nacional, a presença majoritária é masculina, não é difícil entender o nível de resistência existente em relação ao protagonismo feminino nesse setor. Então, o primeiro movimento se deu na derrubada do governo liderado por uma mulher. A organização das forças opositoras trabalhou no sentido de desestabilizar e tensionar o governo, até que lhe fosse imputado o impeachment.

Não satisfeitos, eles partiram para o ataque contra a representação de esquerda que poderia ser um entrave aos seus interesses na eleição seguinte, em 2018. Mais uma vez, eles contaram com um plano ardilosamente arquitetado, que parecia perfeito, até que as pontas soltas, embebidas em doses generosas de arrogância e de vaidade, começaram a aparecer e revelar os segredos mais inconfessáveis da República.

Desde então, os direitistas não se conformam com a falência do seu plano. E o que deriva disso faz parte de todo o acervo registrado pelos veículos de comunicação e de informação, tradicionais e alternativos, nacionais e estrangeiros. Pode-se dizer que eles rasgaram as fantasias e a beligerância, em estado bruto, se apresentou nas praças, nas esquinas, nas ruas, por todos os lugares do país.

E não foi só isso. Entre 2019 e 2022, o desmantelamento das instituições nacionais representou uma ação de cautela, se houvesse a menor intenção da esquerda retornar ao poder. Ora, um país desorganizado, desestruturado, comprometido economicamente, representaria um obstáculo concreto a uma plataforma de governo progressista alinhada ao desenvolvimento social e econômico.

Acontece que, tendo sido surpreendidos, no contexto do recorte temporal entre 2002 e 2016, os direitistas decidiram sistematizar as suas estratégias antiesquerda, valendo-se da facilidade de capilaridade e persuasão das ferramentas digitais. O seu discurso de ódio, a sua manipulação social, o seu enviesamento discursivo através de Fake News, mobilizou e arregimentou sua bolha de apoiadores e simpatizantes, promovendo uma fratura no equilíbrio social.

Diante desse cenário, fica evidente que a ideia da frente ampla não passou de mais um artifício da direita e seus matizes, mais ou menos radicais. Ela ascendeu ao poder nos bastidores da legalidade democrática e não tardou a mostrar a sua face e suas pretensões no Executivo e no Legislativo. O que causa estranheza, para não dizer perplexidade, é a ausência de contraposição a tudo isso, por parte do governo eleito com 50,83% dos votos válidos, em 2022.

Portanto, a frente ampla nunca existiu. Os reveses que o atual governo vêm enfrentando desde o início desse mandato falam por si. Uma frente ampla, de fato e de direito, se colocaria disposta e ativa no distensionamento com o Congresso Nacional, cuja maioria dos eleitos é oposição ao governo. Só que não. Nem os cargos. Nem as verbas. Nem os espaços institucionais. Nada promove o equilíbrio e a dialogia entre oposição e situação, porque não há interesse da direita e seus matizes, mais ou menos radicais, em uma eventual pacificação.

Desde quando, na história desse país, elite e proletariado estiveram do mesmo lado, defendendo as mesmas causas, a mesma visão de país? Só nas Diretas Já 1 e, mesmo assim, a emenda constitucional Dante de Oliveira foi derrotada por forças direitistas, da época. A defesa da Democracia, da Cidadania, do Estado de Direito, não se consolidou na eleição de 2022.

Dia após dia, à revelia do desenvolvimento e do progresso, o Brasil caminha a passos largos para o retrocesso, emoldurado por uma perspectiva Teocrática fundamentalista, autoritária e conservadora 2. Infelizmente, depois da avalanche de atrasos, os quais passou o país, desde 2017, o atual governo não está materializando a reconstrução progressista esperada por seus eleitores. A realidade está muito aquém das expectativas, como se remasse, literalmente, a favor dos interesses da direita. O que não tarda lhe render, nas eleições, o rótulo da decepção.

terça-feira, 11 de junho de 2024

Sobre meninas e mulheres


Sobre meninas e mulheres

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Apesar de todas as conquistas, a construção ideológica histórica em torno do feminino ainda é um obstáculo para a pacificação social. Os números das violências cometidas contra mulheres fala por si. Violência física. Violência psicológica. Violência sexual. Violência moral. Violência patrimonial.

E diante de todo um movimento, dentro da própria sociedade, para que se mantenha esse status quo que alija as mulheres da sua importância e da sua participação social, lendo a matéria intitulada “Como poluição faz meninas menstruarem precocemente” 1 vi a necessidade de ampliar a reflexão.

Os resultados da pesquisa científica citada na reportagem, ainda que não sejam totalmente conclusivos, possibilitam acender um sinal de alerta importante sob vários aspectos sociais. Meninas atingindo a puberdade, cada vez mais cedo, estão sim, sendo expostas a uma realidade social bastante complexa, começando pela dignidade menstrual 2.

Segundo informações da Organização das Nações Unidas (ONU), “o cenário da pobreza menstrual ainda é desolador no mundo, dessa forma, cerca de 12,8% das pessoas que menstruam vivem nessa situação. Além disso, mais de 1 bilhão de pessoas em todo o mundo não possuem acesso a um banheiro seguro” 3.

Isso significa que essas meninas e adolescentes são diretamente afetadas no seu processo educacional e psicossocial, pela inacessibilidade aos produtos de higiene e de banheiros adequados, o que promove ansiedade e preocupação no contexto da socialização, das brincadeiras e das atividades físicas no ambiente escolar. Além disso, a estigmatização sociocultural em torno da menstruação gera bullying e afeta a inserção delas nos mais diferentes espaços sociais.

Depois, a questão da puberdade em si. Ora, corpo e mente passam por uma profunda transformação que exige, por parte da família e da sociedade, uma atenção e cuidados especiais com essas meninas e adolescentes. Entretanto, isso nem sempre acontece. Seja por negligência, descaso ou ignorância.

Fato é que, do ponto de vista científico, já se sabe muito bem que “A puberdade precoce pode ter impactos prejudiciais, especialmente para as meninas, que passam a ter maior risco de depressão, ansiedade, abuso de substâncias e outros problemas psicológicos. Além disso elas também podem ter maior predisposição de desenvolver câncer de mama ou uterino na idade adulta” 4.

Contudo, o viés mais importante desse impacto na saúde pública e suas políticas, diz respeito aos abusos e violências sexuais contra essas meninas e adolescentes. A puberdade precoce lhes expõem de maneira irreversível aos olhares perversos e cruéis, do ambiente social. Portanto, elas estão sim, mais vulneráveis ao risco de uma gravidez precoce. Uma situação que se somatiza, do ponto de vista psicoemocional, ao turbilhão natural de emoções e sentimentos que elas vivem a partir dessa transformação biológica.

Isso significa que o mundo está diante de uma realidade feminina bastante preocupante. Embora, ainda não se possa cravar quais são os elementos deflagradores dessa aceleração do desenvolvimento humano, o fato de ele estar acontecendo merece análise e reflexão, tendo em vista os desdobramentos e reverberações que ele trará para o coletivo social.

Afinal de contas, estamos falando de uma significativa mudança na dinâmica das populações, sob a ótica de um mundo que já vive conflitos graves, deslocamentos humanos forçados, empobrecimento, fome, insalubridade, eventos extremos do clima, ...  É fundamental que se reconheça que essa não é uma questão restrita aos núcleos de poder; mas, de caráter amplamente social, porque afeta diretamente o coletivo.

O bem-estar e a dignidade não deveriam jamais estar condicionados às questões de gênero; mas, simplesmente, de humanidade. Se nos silenciarmos diante dessa descoberta da ciência, nos abstivermos de discutir e pensar a respeito, estaremos sim, admitindo que “A linguagem é o repositório de nossos preconceitos, de nossas crenças, de nossos pressupostos” (Chimamanda Ngozi Adichie) e que estamos confortáveis com a nossa carência de alteridade, de empatia e de solidariedade.  

segunda-feira, 10 de junho de 2024

As sombras eurocêntricas ...


As sombras eurocêntricas ...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Não é de hoje que se fala a respeito das investidas da ultradireita no mundo. Semelhante a uma rede de arrasto, ela vai sim, capturando a maior diversidade possível de indivíduos, dentro do tecido social, para fortalecer o seu projeto de poder. Exatamente como se viu acontecer, agora, nas eleições da União Europeia (UE).

E isso acontece por quê? Simples. Ao contrário da esquerda e seus matizes, mais ou menos radicais e extremistas, a direita, nas últimas décadas, retomou a consciência elementar de que “a união faz a força”.

Partindo para uma padronização estratégica global, que tem como principal aliada as mídias sociais, a direita em todo o seu espectro, e sobretudo, os mais radicais e extremistas, vem conseguindo agregar cada vez mais apoiadores e simpatizantes para o seu ideário.

O cerne desse sucesso está na construção de um diálogo constante e próximo com a população. Vamos e convenhamos, o ser humano gosta de atenção, gosta de ser lembrado, gosta de ser ouvido, e durante muito tempo, as forças político-partidárias mantiveram uma relação assimétrica com o seu eleitorado, se lembrando dele apenas em tempos de conveniência e de interesse.

Agora, não. A comunicação entre os direitistas e seus nichos sociais é fluida, é contínua. A todo instante lhes chegam mensagens, notícias, ainda que tendenciosamente manipuladas ou inverídicas, pelos grupos organizados em mídias sociais.

O que mantém a chama do controle social acesa ininterruptamente. Os interlocutores se transformam, à revelia de sua própria consciência, multiplicadores a serviço daquela ideologia. Simplesmente, porque eles encontram eco naquelas ideias.

O movimento abrupto do governo francês, ao propor a dissolução do Parlamento para a antecipação das eleições, então, sinaliza como um termômetro importante das tensões na Europa. Afinal de contas, é preciso apurar com mais precisão os humores dos cidadãos.

De que lado eles estão? O que querem? Talvez, poucos, de fato, se recordem que as investidas da ultradireita no mundo não trouxeram outra coisa senão a destruição e o caos. Portanto, a ideia de mudança nem sempre significa uma transformação para melhor.

Daí a necessidade da esquerda e seus matizes, mais ou menos radicais e extremistas, não só estreitarem o diálogo com a população; mas, alinharem adequadamente os seus discursos. É preciso construir consensos para fortalecer os seus trabalhos. As demandas do mundo passam por questões comuns. Há mais semelhanças do que diferenças entre o que demanda a realidade contemporânea.  Aliás, as emergências socioambientais são o ponto de partida dessas análises e discussões.

Entretanto, estranhamente, essas são pautas que sempre passam à margem dos discursos direitistas. Décadas após décadas, elas vêm sendo lançadas ao rol dos alarmismos, do negacionismo, da invisibilização, como aspectos menores ou desimportantes dentro dos caminhos de desenvolvimento e progresso mundial. O que, em linhas gerais, significa que são entendidas como entraves às ambições políticas e econômicas dos direitistas.

Não nos esqueçamos de que eles são exatamente a descendência direta das elites poderosas da história. Por suas mãos e cabeças passam as decisões do mundo, nas mais diferentes instâncias da sociedade. Então, eles trabalham exclusivamente em favor dos seus interesses e da manutenção dos seus espaços de poder e de influência. Do alto da pirâmide social, eles optam por não enxergar o que está abaixo dos seus pés, o que inclui o próprio planeta.

Portanto, não é à toa que eles tenham sempre uma justificativa, na ponta da língua, para persuadir sua massa de apoiadores e simpatizantes. Sobretudo, em relação aos sinais apocalípticos que atravessam a realidade contemporânea.

Inclusive, enaltecendo a capacidade científica e tecnológica para lidar e vencer com tais adversidades, como se isso fosse realmente possível. Mas, não é. Haja vista a notícia, publicada ontem, “‘Não cabíamos mais’: moradores de ilha no Caribe são ‘expulsos’ por elevação do nível do mar” 1.

Aos que ainda se recusam a entender, o que está por trás das investidas direitistas no mundo; sobretudo, da ultradireita, é o poder sobre a geografia global, no sentido de resguardar espaços que possam garantir a sua sobrevivência.

Eles não se importam com os desafios socioambientais porque acreditam na blindagem que seu poder capital é capaz de oferecer-lhes. A realidade contemporânea associa a ocupação territorial ao poder de aquisição material desses lugares. Por consequência, a sobrevivência humana se condiciona a esse cenário.

Algo que diz muito sobre o acirramento da xenofobia na Europa. Portanto, o ódio, o receio, a hostilidade e a rejeição, em relação aos estrangeiros; sobretudo, aos mais frágeis e vulneráveis socioeconomicamente, que se tem visto em diversos países europeus, tem relação direta com as emergências socioambientais em curso.

Os direitistas, especialmente da ultradireita, temem que o aumento do contingente populacional na Europa possa fortalecer uma insurreição contra o agravamento das desigualdades, promovendo uma ruptura do controle que empregam sobre o tecido social. Algo que os faria perder a perspectiva da segurança de manutenção de suas históricas regalias e privilégios.

Afinal, muitos dos deslocamentos forçados, das migrações contemporâneas, têm suas raízes fincadas nos processos de colonização e neocolonização empregados por países europeus, em outros continentes. Há uma herança histórica, perversa e cruel, que não foi e, talvez, nem será reparada; mas, apesar disso, não deixa de existir e de se visibilizar.

Assim, considerando o provérbio espanhol, “Quando você vir as barbas do seu vizinho pegarem fogo, coloque as suas de molho”, entenda, de uma vez por todas, que os recentes acontecimentos no mundo nos mostram como ele é um todo indivisível. Não dá para compartimentalizar ou dissociar os acontecimentos. Eles repercutem. Eles reverberam.

A grande questão é que, na maioria das vezes, sequer estamos preparados para enfrentar a situação. Então, é melhor rever os conceitos e ajustar as rotas dentro das novas circunstâncias, antes que os grandes dissabores venham bater à nossa porta.   

domingo, 9 de junho de 2024

Um girassol ...


Um girassol ...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Às portas do Dia dos Namorados decidi escrever a respeito do assunto; mas, distante da costumeira convencionalidade. Queria algo que pudesse impactar às profundezas da reflexão; mas, também, pudesse trazer um ar de leveza e descontração envolvente.

E enquanto me debruçava sobre essas questões, eis que uma imagem surgiu na minha mente, um girassol. Não, não é brincadeira! Um girassol. Com toda a sua pompa e circunstância amarela. Non sense?! Muito pelo contrário! Vou explicar.

Sei que Pixinguinha nos toca o coração com a poesia de sua Rosa 1 e que é essa a espécie favorita dos enamorados; mas, colocando bastante reparo, um girassol impõe presença. Basta um, para sintetizar o seu esplendor, a sua grandeza, a sua genuína alegria, o que imediatamente nos remete ao amor.

Pois é, o maior dos sentimentos. O mais importante. E nada representa melhor a vida do que o amor, energia tão forte quanto a do astro-rei. O amor que aquece o coração, que faz a alma pulsar, transcender. O Sol que movimenta o girassol, que garante a vida em suas mais diversas formas. O que significa que precisamos de amor tanto quanto precisamos do Sol.

Portanto, caro (a) leitor (a), o girassol é sim, uma tradução desse simbolismo sagrado. Simplesmente, porque tem a ver com alegria, com felicidade, com as melhores emoções e sentimentos. Girassol fala de Vida, fala de Sol, fala de Amor, através da simbiose que estabelece com o nosso olhar. Um único girassol é suficientemente capaz de expressar o que há de mais belo, de mais puro e de mais divino, nesse mundo.

Acontece que, para segurar a onda de ser tudo isso, o girassol precisa ser mais do que uma flor. E ele é. Bem, essa estrutura belíssima que se assemelha e atua como uma única flor, é cientificamente denominada pseudanto (falsa flor). A fim de facilitar a polinização e a manutenção da sua espécie, cada ‘pétala’ deriva de uma flor na borda da estrutura e de outras, na parte central, responsáveis pela produção dos frutos e sementes.

É, ser encantador dá trabalho! Por trás do amor que move a vida há uma engenhosidade perfeita. Natureza. Sol. Vida. Amor. Insetos. Passarinhos. Seres humanos. Um conjunto de elementos meticulosamente organizados para promover o bem, sob diferentes formas e conteúdos.

Vejam que incrível! Até Van Gogh pintou girassóis 2! Até ele conseguiu ver que a beleza de um girassol poderia transcender a dureza da realidade e imprimir amor a uma vida embrutecida! Até ele conseguiu nos arrebatar pela força do amarelo!

E foi com base nesses pensamentos que o amor se faz amarelo para mim! Na figura de um imenso girassol que sorri, que ilumina, que aquece, que desperta o lado mais belo do meu consciente (e do meu inconsciente). Como escreveu Caio Fernando Abreu, “Amor a gente não procura. É assim: você deixa a porta meio aberta, se distrai plantando girassóis e ele entra. Ele adora contrariar”.

Assim, espero que, de agora em diante, o seu amor seja amarelo também! Plante girassóis. Dê girassóis. Receba girassóis. Faça da sua vida, do seu amor, um campo repleto de girassóis. Afinal, “A vida é curta, viva. O amor é raro, aproveite. O medo é terrível, enfrente. As lembranças são doces, aprecie” (Caio Fernando Abreu). Combinado?! Feliz Dia dos Namorados!