quinta-feira, 25 de abril de 2024

O progresso...


O progresso...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Um ciclo nada virtuoso. Talvez, essa afirmação seja a que melhor explique a dinâmica das Revoluções Industriais e a relação com o boom populacional que se estabeleceu depois delas.

Depois de ler duas matérias sobre o avanço das voçorocas no Brasil e a discussão delas como um problema global 1, eis que me deparo com a notícia do afundamento de cidades na China, em razão da “extração de água e do peso crescente com a rápida expansão imobiliária” 2.

Mas, não para por aí, quilombolas acionam Justiça britânica para barrar atividade de empresa mineradora em sua região, no Brasil, tendo em vista a “poluição e soterramento das nascentes de um rio, além de prejuízos à saúde causados pela poeira lançada no ar por explosões” 3.

Vejam, desde a segunda metade do século XVIII, as Revoluções Industriais não só demandaram um boom populacional para garantir seu contingente de mão de obra e seu mercado consumidor; mas, também, demandaram um uso e ocupação do solo que satisfizesse os seus interesses.

Mais pessoas, mais moradias, mais infraestrutura urbana, enfim... Tudo isso em uma crescente compatível ao progresso industrial. É certo que, no início desse processo, não havia um ordenamento jurídico que discutisse em profundidade os riscos e as medidas mitigadoras aos efeitos dessa dinâmica industrial. Demorou, então, um tempo significativo para que ele surgisse e fosse implementado.

Acontece que essa demora permitiu a consolidação dos agravos que se presenciam, agora, mais intensos na contemporaneidade. A negligência, em relação ao fato de que apenas do planeta é continental e que essa pequena fração ainda padece da limitação de não poder ser totalmente habitável, foi sim, decisiva para as consequências desse mau uso e ocupação.

Isso significa que a raça humana está reduzindo cada vez mais os espaços geográficos habitáveis, quando se preocupa exclusivamente com a manutenção do seu crescimento capital; sobretudo, para nutrir os veios do seu desenvolvimento científico e tecnológico. Ocupando. Explorando. Destruindo. Consumindo.  É sob esses princípios que o desenvolvimento da humanidade vem se mantendo alicerçado. Mas, até quando?

Não bastasse as profundas alterações geográficas na superfície terrestre, o planeta está diante do recrudescimento dos efeitos extremos do clima. Sim, as conjunturas urbanoindustriais afetaram também as condições climáticas, a partir de práxis como o desmatamento, a liberação de poluentes na atmosfera, a alteração dos cursos d’água, o uso excessivo de combustíveis fósseis.

Pois é, a concepção de progresso, a qual uma imensa maioria de pessoas permanece acreditando, como se vê apresenta um desequilíbrio real na sua relação custo/benefício. O progresso pelo progresso está ameaçando a sobrevivência e a existência da raça humana no planeta. A começar pelos episódios que têm ocasionado o deslocamento humano em massa.

Segundo a Agência da Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), “Pessoas refugiadas, deslocadas internamente e apátridas estão na linha de frente da crise climática. [...] “A mudança climática e o deslocamento estão cada vez mais interligados. À medida em que eventos climáticos extremos e condições ambientais pioram com o aquecimento global, eles contribuem para múltiplas e sobrepostas crises, ameaçando os direitos humanos, aumentando a pobreza e a perda dos meios de subsistência, tensionando as relações pacíficas entre comunidades e, em última análise, criando condições para deslocamentos forçados” 4.

A recente tempestade que atingiu Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, por exemplo, desperta um alerta nesse sentido. Haja vista que “o recorde de precipitação é consistente com a forma como o clima está mudando. Resumindo: o ar mais quente é capaz de reter mais umidade – cerca de 7% a mais para cada grau Celsius – o que pode, por sua vez, aumentar a intensidade da chuva”. Se tempestades cada vez mais intensas e amiúde começam a impactar a superfície terrestre, não é difícil imaginar que regiões com baixa cobertura vegetal ou impactadas pelo desmatamento/desertificação apresentem tendência de uma ação erosiva mais acentuada.

Dizia o escritor francês Victor Hugo que “O progresso roda constantemente sobre duas engrenagens. Faz andar uma coisa esmagando sempre alguém”. De fato, não se pode banalizar os efeitos nocivos do desenvolvimento humano. Infelizmente, os indivíduos foram arrastados pelas Revoluções Industriais sem a mínima possibilidade de uma análise, uma reflexão, um exercício crítico devidamente aprofundado, a respeito. Então, imersos nesse universo, vêm descobrindo da pior maneira que os benefícios, amplamente divulgados, não podem justificar os prejuízos. Afinal de contas, a verdade é que a humanidade foi solapada na sua dignidade e direitos, inclusive, no que diz respeito à sua própria sobrevivência.

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