Diante de
uma absoluta relativização numérica ...
Por Alessandra
Leles Rocha
Números apontam grandes cifras
produzidas e lucros astronômicos, no universo do agronegócio mundial. No entanto,
os números também apontam valores expressivos para o desmatamento, as
queimadas, a exaustão dos recursos naturais – tais como, água e solo, a insegurança
alimentar e o desperdício. Diante disso, a quais números devemos, de fato,
render reverências?
Cientes de que há no planeta, mais
de 8 bilhões de seres humanos e que a alimentação é necessidade básica de todos
eles, essa é uma pergunta fundamental. Há
séculos tem se visto ampliar as fronteiras agrícolas, o desenvolvimento de
novas técnicas de produção e o surgimento de insumos com alta base científica. A
primeira impressão é de total sucesso. Só que não.
Vejam, essas iniciativas
impactaram o equilíbrio natural dos biomas. Seja pela ruptura com a periodicidade
e volume de chuvas. Ou da umidade do ar. Ou com o balanço nutricional do solo. Ou
com o regime de ventos. Ou com as estações climáticas bem definidas. Enfim,
tudo o que é essencial para o agronegócio e não pode ser substituído por
avanços técnico-científicos.
Sem perceberem, o ciclo de
investimentos milionários para aumentar a produção e os lucros tornou-se uma
espiral que exige cada vez mais e devolve cada vez menos, dadas as imposições
conjunturais da própria natureza. E ao contrário de analisar crítica e
reflexivamente essas práxis, diversos produtores ainda insistem nelas.
O que significa que ao ampliar o nível
de desequilíbrio natural dos biomas, o agronegócio abre uma guerra contra si
mesmo, expondo suas produções às novas pragas, à intensificação das demandas químicas,
à contaminação da água e do solo e à própria dinâmica climática. Algo que já não
é bem-visto, pelos mercados consumidores estrangeiros, muitos deles franco
defensores das políticas sustentáveis da economia verde.
Porque gastar mais não significa
produzir mais e melhor. Aliás, esse alto custo de produção não tem impedido a ausência
de muitos produtos nas prateleiras dos mercados e supermercados, mundo afora;
bem como, o decréscimo da qualidade deles, quando disponíveis. Além disso, é
preciso pensar sobre o impacto que a lei da oferta e da procura traz ao
contexto da insegurança alimentar.
Se por um lado se vê, em pleno
século XXI, o amiúde desperdício de alimentos, a inacessibilidade a eles é uma
realidade triste e cruel. A indisponibilidade de produtos ou o seu alto custo
de aquisição impede que milhões de seres humanos supram a sua necessidade
fundamental de alimentação. Ao que se vê, ter ampliado as fronteiras agrícolas,
desequilibrado os biomas, tecnologizado a produção, investido em super insumos,
nada disso cumpriu o papel primaz do agronegócio, ou seja, nutrir os seres
humanos.
Sem contar que certos impactos
negativos, tais como o deflorestamento, têm sim, sua parcela de
responsabilidade na disseminação de importantes doenças, especialmente, as
arboviroses. Segundo estudo da Fiocruz, por exemplo, “a dengue vem se
espalhando para as regiões Sul e Centro-Oeste, onde a doença não era tão comum.
Isso está ocorrendo por conta do aumento na ocorrência de eventos climáticos
extremos, como secas e inundações. Além disso, outro fator decisivo seria a degradação
ambiental, especialmente no Cerrado, que vem sofrendo com o desmatamento, queimadas
e conversão de florestas em pasto” 1.
Lembre-se, “A primeira lei da
ecologia é que tudo está ligado a todo o resto” (Barry Commoner)! Daí a
necessidade de reflexão, quando se percebe a insuficiência ou a ineficiência da
economia para proteger a sobrevivência humana na Terra. Não se pode encarar o
desenvolvimento econômico e o desenvolvimento social como questões excludentes,
porque tem sido essa a visão que está levando à humanidade a sua extinção 2. Portanto, é urgente romper com esse
cenário caótico, o qual não aponta uma relação custo/benefício equilibrada para
nenhuma das partes envolvidas.
1 https://portal.fiocruz.br/noticia/2024/03/aumento-da-dengue-esta-associado-mudancas-climaticas-e-ao-desmatamento-no-brasil