sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

Sempre em tempo ... de pensar, de refletir, de aprender, com a própria cabeça!


Sempre em tempo ... de pensar, de refletir, de aprender, com a própria cabeça!

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Direta ou indiretamente, o efeito sabidamente deletério das mídias sociais é motivo para uma reflexão cada vez mais consciente e profunda.  

Na construção de um extremo entre indivíduos que refutam tamanha exposição e outros que fazem de tudo pelos seus 15 minutos de fama, essa é uma seara que afeta indistintamente a sociedade como um todo.

Como toda boa novidade, as novas tecnologias não se furtaram em propagandear o seu lado mais bonito, mais convidativo, mais atraente, ocultando de maneira consciente as armadilhas perigosas e os interesses escusos, intrínsecos à sua gênese.

Digo isso, porque não precisou de muito tempo para que os sonhos começassem a virar pesadelos e o desvirtuamento social apontasse o rumo dos descaminhos impostos por esse movimento.

Nesse sentido, lembrei-me de uma cena marcante do filme O Diabo Veste Prada (The Devil Wears Prada), de 2006, quando a editora-chefe da revista de moda, interpretada por Meryl Streep, comenta com sua assistente, interpretada por Anne Hathaway, sobre seu divórcio e o quanto ela deveria receber dos grandes conglomerados de imprensa, pela notícia, tendo em vista que o sofrimento alheio sempre rende milhões ao setor.

Quem diria! Passadas quase duas décadas, deveríamos estar cientes de que, agora, são as Big Techs a fazerem fortuna através da disseminação do ódio, da violência, da ignorância, da pós-verdade, das fragilidades e carências existenciais, enfim.

Infelizmente, são tempos de capitalização das desgraças 1, como se houvesse um cabresto da mercantilização humana 2, que transforma seres humanos em mercadoria 3.

Pois é, a tecnologização contemporânea tem levado milhares de seres humanos a uma escravização social, tão aterrorizante, que é capaz de destruir vidas, enquanto contabiliza cifras bilionárias para pessoas que não têm quaisquer compromissos éticos e morais com a própria humanidade.

Mas, qual é o espanto? Desde a 1ª Revolução Industrial, ocorrida na segunda metade do século XVIII, na Inglaterra, que a práxis é essa. Não acredita? Quer um exemplo?

Leia, então, a matéria “Quem eram as ‘crianças da chaminé’ exploradas nos países industrializados até o século 19?” 4 e descubra o lado horrendo e vergonhoso que se esconde na miragem eufórica e extasiante da industrialização.

São muitas as razões que levaram, e ainda levam, milhares de seres humanos a se render às teias do desenvolvimento e do progresso, simplesmente denominadas de Revolução Industrial.

Já estamos na sua 4ª versão e se não é, ao menos deveria ser, preocupante o fato de a humanidade não ser mais contundente nos seus questionamentos sobre “como ela deve afetar nossas vidas” 5.

Afinal de contas, seja objetiva ou subjetivamente, a 4ª Revolução Industrial ou Revolução 4.0 diz que chegamos ao auge da automação, através de múltiplas tecnologias, as quais utilizam conceitos de sistemas ciber-físicos, internet das coisas e computação em nuvem.

Em nome da eficiência e da produtividade, máquinas de última geração dominam a dinâmica cotidiana e exercem um poder, nunca antes visto, sobre os mais de 8 bilhões de seres humanos.

Lamento; mas, não é força de expressão dizer que saltamos, sem paraquedas, de um modo de vida em que seres humanos eram protagonistas de sua própria história, podiam decidir sobre questões simples e complexas do seu dia a dia, para um extremo, sem que houvesse qualquer preparo psíquico e emocional.

Foi tudo de repente! Literalmente. Sem redes proteção, sem manuais, fomos lançados a uma busca frenética para que pudéssemos caber dentro dessa nova realidade.

Mas, parece que não estamos obtendo o êxito desejado. Informações, daqui e dali, dão conta de uma realidade que passa sobre os seres humanos, como um verdadeiro rolo compressor, e afeta a sua estabilidade em todo os sentidos.

Vamos e convenhamos, a franca disposição, presente nas mídias sociais, em homogeneizar os indivíduos está destruindo o seu alicerce identitário.

É tanta pressão, tanta opressão, que apesar de toda a negligência e invisibilização em torno do assunto, o mundo já assiste a uma escalada pandêmica de doenças mentais.

Depressão. Síndrome de Burnout. Ansiedade. Síndrome do Pânico. Obesidade. Transtornos alimentares. Bipolaridade. ... só para citar algumas.

A questão é que a insalubridade mental, quase sempre, termina em vidas ceifadas precocemente, enquanto o mundo continua a girar em sua espiral de loucura, sem quaisquer constrangimentos ou culpas.

Infelizmente, conscientemente ou não, a raça humana deu demasiados poderes ao que pode matá-la. Se colocou em xeque-mate, ou seja, em processo de massificação social – a difícil decisão entre o ser e o ter 6 .

Mas é preciso pensar! Buscar uma maneira de equacionar tamanho desequilíbrio, em nome da preservação da própria espécie. O adoecimento populacional não fala só de corpos; mas, de almas, de sonhos, de desejos, de perspectivas, ...

Assim, essa é a hora de despertar, de olhar para dentro de si mesmo, de reconhecer os fatos como são.  Só peço que não esmoreça, não desanime; pois, “O óbvio é a verdade mais difícil de se enxergar” (Clarice Lispector – Uma aprendizagem ou o Livro dos Prazeres, 1969).

Afinal, é ele o que nos confronta a admitir que “O importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós mesmos fazemos do que os outros fizeram de nós” (Jean-Paul Sartre).