Das
arenas romanas à contemporaneidade. A eterna perseguição aos seguidores de Jesus
Cristo.
Por Alessandra
Leles Rocha
Queria ver se houvesse, no país, um
contingente bastante expressivo de “Padres Júlio”, se a Direita e seus
matizes, mais radicais e extremistas, estariam propondo Comissões Parlamentares
de Inquérito (CPIs), por aí! Acontece que na sua singularidade, no seu ativismo
humanitário, o Padre Júlio Lancellotti se torna alvo fácil para agressões e violências
diversas.
Talvez, isso explique porque ele se
mantém solitário na sua sina. Trabalhar na ajuda assistencial, no acolhimento,
no auxílio aos abandonados e desvalidos, não é tarefa fácil. É missão de risco,
em tempos de ódio à flor da pele. Não me parece que falte interesse, vontade ou
intenção, de atuar nesse compromisso; mas, o medo que assombra as pessoas dispostas
não é uma impressão, ele é real.
Há sim, uma corrente trabalhando
na contramão da fraternidade, da humanidade, do altruísmo. Na verdade, sempre
houve. Entretanto, agora, ela perdeu o pudor de materializar a sua fúria odiosa,
partindo para cima de quem ouse realizar em favor de diminuir ou amenizar as
desigualdades sociais.
Afrontam através das redes
sociais. Criam Fake News. Depredam espaços de acolhimento e promoção
humana. ... Enfim, exibem toda a sua natureza anticristã, anticidadã, desumana.
Pois é, para quem resume as tensões nacionais ao espectro político-partidário,
eis aqui a desconstrução desse pensamento.
O primeiro traço de polarização
brasileira, se dá na construção histórica de um país demarcado pela fronteira entre
pobres e ricos. A grande questão é que os séculos passaram e esse modelo
permanece vigente. O que muita gente não percebe é que essa polarização não se resume
a existência de seres humanos sob o desalento da fome, da miséria e/ou do
desabrigo.
Lamentavelmente, ela abre espaço
para a perpetuação do trabalho análogo à escravidão, ao racismo e demais formas
criminosas de preconceito, à precarização do trabalho, à construção de
barreiras de desqualificação profissional e educacional, a todo tipo de
inacessibilidade social. ... O que significa criar um país de múltiplas realidades
traduzidas pela existência de cidadãos de primeira e de última classe,
totalmente desalinhado aos princípios e valores da dignidade humana.
Vejam só, querem envergonhar,
constranger, punir, o Padre Júlio. Pena, que nada disso cabe na figura dele! A
vergonha, o constrangimento, a punição, são atributos que recaem sobre os
ombros de quem o ataca covardemente. Afinal, tratam-se de pessoas que não sabem
ou não se sentem capazes de fazer algo semelhante ao que ele faz, por medo de
afetar, de alguma forma, as regalias e os privilégios que historicamente lhes
foi permitido desfrutar.
Isso sem contar o fato de que
ocultam ou omitem, para si e sua bolha de simpatizantes, que a Constituição de
1988 representou sim, uma inovação ao incluir, dentre os direitos
constitucionalmente protegidos, os direitos enunciados nos tratados
internacionais de que o Brasil é signatário, dentre os quais estão os Direitos
Humanos. O que amplifica o desrespeito, a afronta, a violência,
para além da figura do Padre Júlio.
Ora, o que faz há décadas esse
simples servo de Deus é o que manifestam as leis do céu e da Terra. Caridade,
amor ao próximo, porque “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em
dignidade e direitos. São dotados de razão e de consciência e devem agir em
relação uns aos outros com espírito de fraternidade” (art. 1º, DUDH, 1948)1. Desse modo, se ele faz é porque
existem milhares que deveriam fazer e não fazem. Se ele visibiliza suas causas
é porque milhares tentam invisibilizá-las e negligenciá-las.
A verdade, é que Padre Júlio
Lancellotti não deveria estar só nessa empreitada, ela deveria ser
compartilhada por todos, incluindo aqueles que assumiram publicamente deveres
com o Estado brasileiro, em cada um dos seus rincões. Sim, porque as desigualdades não assolam
apenas a maior cidade da América Latina, São Paulo. Ainda que em alguns lugares
mais e outros menos, elas estão presentes em todos os lugares.
Dizia São Francisco de Assis, “Ninguém
é suficientemente perfeito, que não possa aprender com o outro e, ninguém é
totalmente estruído de valores que não possa ensinar algo ao seu irmão”. Se
cada brasileiro se permitir aprender com o Padre Júlio, o país certamente se transformará
em uma potência de habilidades e competências humanas, até então, ocultas por
uma persistente negligência marginalizante.
Em um mundo tão belicoso, conflituado,
desarmonizado, “Qualquer ato de amor, por menor que seja, é um trabalho pela
paz “; acontece que “Quem julga as pessoas não tem tempo para amá-las”
(Madre Teresa de Calcutá). Esse é o ponto para a reflexão, o ponto que separa
o joio do trigo, no contexto contemporâneo. Afinal, “O verdadeiro
cristianismo rejeita a ideia de que uns nascem pobres e outros ricos, e que os
pobres devem atribuir a sua pobreza à vontade de Deus” (Dom Hélder Câmara).