quinta-feira, 4 de janeiro de 2024

Das arenas romanas à contemporaneidade. A eterna perseguição aos seguidores de Jesus Cristo.


Das arenas romanas à contemporaneidade. A eterna perseguição aos seguidores de Jesus Cristo.

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Queria ver se houvesse, no país, um contingente bastante expressivo de “Padres Júlio”, se a Direita e seus matizes, mais radicais e extremistas, estariam propondo Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), por aí! Acontece que na sua singularidade, no seu ativismo humanitário, o Padre Júlio Lancellotti se torna alvo fácil para agressões e violências diversas.

Talvez, isso explique porque ele se mantém solitário na sua sina. Trabalhar na ajuda assistencial, no acolhimento, no auxílio aos abandonados e desvalidos, não é tarefa fácil. É missão de risco, em tempos de ódio à flor da pele. Não me parece que falte interesse, vontade ou intenção, de atuar nesse compromisso; mas, o medo que assombra as pessoas dispostas não é uma impressão, ele é real.

Há sim, uma corrente trabalhando na contramão da fraternidade, da humanidade, do altruísmo. Na verdade, sempre houve. Entretanto, agora, ela perdeu o pudor de materializar a sua fúria odiosa, partindo para cima de quem ouse realizar em favor de diminuir ou amenizar as desigualdades sociais.

Afrontam através das redes sociais. Criam Fake News. Depredam espaços de acolhimento e promoção humana. ... Enfim, exibem toda a sua natureza anticristã, anticidadã, desumana. Pois é, para quem resume as tensões nacionais ao espectro político-partidário, eis aqui a desconstrução desse pensamento.  

O primeiro traço de polarização brasileira, se dá na construção histórica de um país demarcado pela fronteira entre pobres e ricos. A grande questão é que os séculos passaram e esse modelo permanece vigente. O que muita gente não percebe é que essa polarização não se resume a existência de seres humanos sob o desalento da fome, da miséria e/ou do desabrigo.

Lamentavelmente, ela abre espaço para a perpetuação do trabalho análogo à escravidão, ao racismo e demais formas criminosas de preconceito, à precarização do trabalho, à construção de barreiras de desqualificação profissional e educacional, a todo tipo de inacessibilidade social. ... O que significa criar um país de múltiplas realidades traduzidas pela existência de cidadãos de primeira e de última classe, totalmente desalinhado aos princípios e valores da dignidade humana.

Vejam só, querem envergonhar, constranger, punir, o Padre Júlio. Pena, que nada disso cabe na figura dele! A vergonha, o constrangimento, a punição, são atributos que recaem sobre os ombros de quem o ataca covardemente. Afinal, tratam-se de pessoas que não sabem ou não se sentem capazes de fazer algo semelhante ao que ele faz, por medo de afetar, de alguma forma, as regalias e os privilégios que historicamente lhes foi permitido desfrutar.

Isso sem contar o fato de que ocultam ou omitem, para si e sua bolha de simpatizantes, que a Constituição de 1988 representou sim, uma inovação ao incluir, dentre os direitos constitucionalmente protegidos, os direitos enunciados nos tratados internacionais de que o Brasil é signatário, dentre os quais estão os Direitos Humanos.   O que amplifica o desrespeito, a afronta, a violência, para além da figura do Padre Júlio.

Ora, o que faz há décadas esse simples servo de Deus é o que manifestam as leis do céu e da Terra. Caridade, amor ao próximo, porque “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e de consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade” (art. 1º, DUDH, 1948)1. Desse modo, se ele faz é porque existem milhares que deveriam fazer e não fazem. Se ele visibiliza suas causas é porque milhares tentam invisibilizá-las e negligenciá-las.

A verdade, é que Padre Júlio Lancellotti não deveria estar só nessa empreitada, ela deveria ser compartilhada por todos, incluindo aqueles que assumiram publicamente deveres com o Estado brasileiro, em cada um dos seus rincões.  Sim, porque as desigualdades não assolam apenas a maior cidade da América Latina, São Paulo. Ainda que em alguns lugares mais e outros menos, elas estão presentes em todos os lugares.

Dizia São Francisco de Assis, “Ninguém é suficientemente perfeito, que não possa aprender com o outro e, ninguém é totalmente estruído de valores que não possa ensinar algo ao seu irmão”. Se cada brasileiro se permitir aprender com o Padre Júlio, o país certamente se transformará em uma potência de habilidades e competências humanas, até então, ocultas por uma persistente negligência marginalizante.

Em um mundo tão belicoso, conflituado, desarmonizado, “Qualquer ato de amor, por menor que seja, é um trabalho pela paz “; acontece que “Quem julga as pessoas não tem tempo para amá-las” (Madre Teresa de Calcutá). Esse é o ponto para a reflexão, o ponto que separa o joio do trigo, no contexto contemporâneo. Afinal, “O verdadeiro cristianismo rejeita a ideia de que uns nascem pobres e outros ricos, e que os pobres devem atribuir a sua pobreza à vontade de Deus” (Dom Hélder Câmara).