quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

Todos os caminhos levam a ...


Todos os caminhos levam a ...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Não sou o tipo de pessoa que acredita em coincidências, nem tampouco, costuma ver a vida por pequenos recortes desconectados. Daí ter sido tomada pela estranheza ao perceber que vários integrantes do antigo governo federal brasileiro terem desembarcado na Flórida, EUA, nos últimos meses, incluindo o próprio Ex-Presidente da República. Reduto da direita e seus matizes, nos EUA, a escolha pela Flórida faz todo o sentido.

Acontece que olhando para os recentes acontecimentos nefastos ocorridos no Brasil tem-se a nítida sensação de que as tramas, por trás deles, vêm sendo urdidas por lá, um reduto notoriamente extremista, radical e permeado de teorias conspiratórias.  Assim, os ventos que sopram cá apontam para a construção de tensões e obstáculos que tentam dificultar o fluxo natural do atual governo, favorecendo a manifestação de narrativas desqualificantes e prejudicais ao curso dos trabalhos.

Não é à toa a recente turbulência diante das declarações do Presidente da República sobre a questão dos juros elevados no país. Pois, o presidente do Banco Central (BC) tenta enviesar o discurso para o campo da autonomia, conferida pelo Congresso à instituição, criando uma gigantesca cortina de fumaça para encobrir certos aspectos fundamentais nessa discussão.

A própria formação profissional do atual presidente do BC diz muito sobre o seu alinhamento político. Sua carreira foi majoritariamente construída no setor bancário, tanto que foi escolhido pelo ex-ministro da Economia para a função, considerando a política econômica de viés plenamente direitista a ser implantado naquela gestão.

Portanto, não se trata de autonomia ou de incertezas econômicas ligadas ao atual governo, não. A questão aqui é puramente ideológica, no sentido de que o BC expressa seu total interesse em permanecer, pelo menos até o fim da gestão do seu atual presidente, defendendo os objetivos da direita e de seus simpatizantes, não se importando com o desalinhamento que isso pode provocar no campo das políticas públicas do atual governo.

Ou já se esqueceram de que a política econômica do governo anterior destruiu o teto de gastos de maneira totalmente irresponsável, excedeu absurdamente em práticas perdulárias inúteis ao desenvolvimento do país, permitiu que a inflação retornasse galopante ao cenário favorecendo a elevação dos juros na sua tentativa de contenção? O Brasil viveu sobre uma verdadeira gangorra de incertezas, nos últimos quatro anos, que não tinha nada de normal e dava sinais claros da sua incapacidade de fomentar o bem-estar econômico da sociedade.

Aliás, quem não se lembra da polêmica sobre as offshores, em 2021, envolvendo tanto o ex-ministro da Economia quanto o presidente do BC brasileiro? Pois é, ter dinheiro fora do país, nos chamados paraísos fiscais, não é crime. Desde que tudo seja declarado à Receita Federal. O que causou estranheza e desconforto na ocasião foi, justamente, o fato de que, sendo os dois funcionários públicos estão submetidos ao artigo 5º do Código de Conduta da Alta Administração Federal (2000), ou seja, “funcionários do alto escalão são proibidos de manter aplicações financeiras – no Brasil ou no exterior – que possam ser afetadas por políticas governamentais”. Fato é que o caso foi julgado, arquivado e posto em sigilo pela Comissão de Ética 1.

É por essas e por outras que temos que nos lembrar de que os bancos emergiriam e se fortaleceram após a Revolução Industrial, no século XVIII, estabelecendo a burguesia como a classe social dominante e detentora dos meios de produção. Assim, as engrenagens sociais funcionam segundo os interesses dessa pequena fatia do estrato populacional, a qual não se preocupa que as demais fatias possam perder desde que ela não perca jamais. Ora, é a burguesia quem legisla, quem controla, quem decide, quem manda.

Daí o frisson que se iniciou desde a campanha eleitoral, em 2022, inclusive valendo-se de Fake News, por parte da direita e seus simpatizantes, para gerar pânico e tensão aos mercados em relação ao candidato de oposição. Queriam, e parecem ainda querer, lhe atribuir, a todo custo, a pecha de um doidivanas irresponsável. Sim, porque para essas pessoas as discussões em torno de uma política econômica menos desigual, menos selvagem, menos tendenciosa, é simplesmente inadmissível.

Vejam que, enquanto a rusga entre o Presidente da República e o BC ganha recentemente as mídias, o presidente da instituição deu uma palestra, no evento 2023 Milken South Florida Dialogues, dia 7 de fevereiro, que trata de inovações digitais. Uma palestra para um público predominantemente de direita e ligado ao mercado financeiro, defendendo com unhas e dentes os seus pontos de vista; bem como, sinalizando a ideia do BC criar uma moeda digital 2.

Bem, divergências são sempre oportunidades de construção, de evolução, de melhorias. Mas, para que isso aconteça é imperioso que exista disposição em buscar por denominadores comuns. O que temos visto é só mais um reflexo nocivo da cisão ideológica que a direita brasileira e seus inúmeros simpatizantes impuseram ao país. Ou é do jeito deles ou não pode ser.

Acontece que instituições, agentes político-partidários, funcionários públicos, tem por obrigação básica trabalhar em favor do país. E o Brasil não é só essa ou aquela fatia, como se habituou a ver nos últimos quatro anos.  O Brasil é um todo, plural e diverso, de realidades e demandas distintas que precisam ser atendidas satisfatoriamente; sobretudo, depois do cenário de terra arrasada que o ex-governo deixou como legado. A impressão que se tem, é que certas pessoas estão imbuídas em criar um isolamento econômico frente a realidade do país, como se a Economia pudesse sobreviver dessa forma.

Portanto, todas as figuras envolvidas no campo econômico do governo precisam sim, buscar aparar o máximo de arestas e divergências que impeçam o país de ser reconstruído e de seguir em frente. Imagina se, de repente, abate sobre o país uma catástrofe ambiental ou uma nova epidemia. Será que o arraigamento ideológico da direita e seus simpatizantes vai permanecer insistindo em conduzir a economia nacional como tem feito até agora? Essa é uma pergunta importantíssima a se fazer, pois ela tende a traçar um panorama bastante realista entre a vida e a morte do Brasil.