terça-feira, 13 de dezembro de 2022

Desordem, Retrocesso, ... Anticidadania


Desordem, Retrocesso, ... Anticidadania

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Não foi necessária nenhuma atitude dos outros, para que o ódio da ultradireita desnudasse o seu rosto e as suas intenções. Agora, todos sabem quem são os representantes da turba da balbúrdia, da confusão, da discórdia, da desordem e do retrocesso. Tomados pelo seu inconformismo crônico e doentio, em relação ao controle do poder social, político e econômico do país, eles vêm marcando raivosa e antidemocraticamente a sua posição desde o fim das eleições deste ano.

Então, ontem, à noite, depois da diplomação do Presidente e do Vice-Presidente da República, eleitos democraticamente, um pequeno grupo de anticidadãos decidiu destruir as linhas da civilidade e tentaram invadir a sede da Polícia Federal (PF), em Brasília/DF; além, de queimar 8 carros, 5 ônibus, e depredar uma Delegacia de Polícia 1. Em suma, buscaram medir forças com a legalidade, criando um pequeno caos na capital federal.

É uma pena que sua estupidez beligerante seja bem maior do que o seu senso de cidadania e patriotismo, a tal ponto que os faça desconsiderar a própria legislação vigente no país. Vejam que os recentes acontecimentos atentam diretamente ao que estabelece o artigo 359-L 2, da lei n.º 14.197, de 1º de setembro de 2021, e por isso, irão acarretar a todos os envolvidos, direta ou indiretamente, a responsabilização cabível, estejam eles no campo da mentoria intelectual ou na prática delituosa em si.

Tudo porque não admitem que nada e nem ninguém ameace o modelo de organização social, política e econômica, que julgam ser o ideal para não ameaçar suas regalias e privilégios, consolidados desde os idos do Brasil Colonial. Sim, o desespero da ultradireita brasileira nasce desse ranço histórico permeado de desigualdades, de intolerâncias, de preconceitos e de violências, que sempre esteve presente no país, de uma maneira, muitas vezes, subliminar; mas, que alcançou o ápice da sua legitimidade nos últimos quatro anos.    

Infelizmente, é dessa base ideológica que se proliferam discursos e narrativas distorcidos, inverídicos, a fim de estabelecer o medo e o terror entre a população; sobretudo, entre parcelas menos politizadas. Não é à toa que tanto se ouviu falar, nos últimos tempos, em ocupação do comunismo no país, em apropriação da propriedade privada, em doutrinação escolar obrigatória quanto ao ideário de esquerda, liberação do consumo de drogas, fechamento de igrejas, e coisas desse tipo. Tudo sem nenhum respaldo real, jurídico e concreto, apenas um artifício linguístico de intimidação e manipulação social.

É curioso que essas pessoas não entendam que o fato de se valerem dessas estratégias para encobrir o seu próprio desvirtuamento ético e moral, a sua ganância, a sua arrogância, a sua anticidadania, na verdade, acaba deixando tudo muito mais às claras. De certo modo, pode-se dizer que é o declínio e a ruína da autoaclamação como pessoas de bem, na medida em que há um franco desvirtuamento entre a linguagem e a realidade. Afinal, uma pessoa de bem deve ter boa índole, bom caráter, empatia, altruísmo; portanto, não sai por aí investido de egoísmo, de individualismo, de narcisismo, de autoritarismo.

Talvez sejam essas as sementes do fundamentalismo contemporâneo dispersadas entre nós. Segundo Umberto Eco, “Fundamentalistas dão um toque de arrogante intolerância e rígida indiferença para com aqueles que não compartilham suas visões de mundo”. Exatamente o que os relatos dos recentes atos e manifestações antidemocráticas têm exibido, e que nos deixam a plena certeza de que “Não é possível discutir racionalmente com alguém que prefere matar-nos a ser convencido pelos nossos argumentos” (Karl Raimund Popper).

Portanto, se estamos diante de uma situação assim é porque “Ninguém pode negar, face aos indícios disponíveis, que é fácil, uma vez garantido o poder militar, produzir uma população de lunáticos fundamentalistas. Talvez fosse igualmente fácil produzir uma população de gente razoável e sã, mas muitos governos preferem não o fazer, visto que essas pessoas seriam incapazes de sentir admiração pelos políticos que lideram tais governos” (Bertrand Russell). Entendeu, agora???



2 Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais: Pena – reclusão de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência.