Isabel
do Vôlei. Do Brasil. Para sempre.
Por
Alessandra Leles Rocha
A geografia da vida é mesmo
curiosa. Não é preciso a proximidade, a convivência estreita e regular, para
que um ser humano faça parte da sua história, para que imprima emoções e sentimentos
bonitos na sua alma. A existência humana simplesmente transcende! Então, quando
eu vi a notícia do falecimento da Isabel Salgado, a eterna Isabel do vôlei,
fiquei baqueada.
Aquela mulher sensacional, que
junto com suas companheiras de equipe e de seleção brasileira, contribuiu tão
significativamente para o esporte feminino nacional e para a reafirmação da
mulher na sociedade brasileira, havia subitamente se despedido desse mundo. 62
anos de vida era muito pouco para quem tinha tanto por fazer, por dizer, por
ensinar, por transformar.
Sim, porque a atleta do vôlei sempre
foi exemplo do esporte em geral, de uma cidadania brasileira sem fronteiras, de
uma maternidade plena, de uma alegria estampada por um sorriso largo. Isabel é
a personificação de uma identidade nacional que enche a alma de satisfação,
porque sempre nos trouxe certeza de que não estava a passeio nesse mundo.
Isabel, talvez, não esteja na
memória de brasileiros e brasileiras pela plasticidade ou pela inovação de seus
movimentos em quadra; mas, pela intensidade de quem nunca passou despercebida. Ela
sempre teve vez e voz por onde transitou, sem perder o foco, sem perder o swing
carioca. Talvez, isso possa explicar, porque mesmo sem uma medalha olímpica no
pescoço ela não ficou restrita às páginas históricas do esporte nacional.
Afinal, a vida é assim! Muito do
que acontece na construção de nós mesmos, se dá à revelia de planos
mirabolantes ou de desejos incontroláveis. Apenas acontece. Por um toque de
personalidade, ou por força das circunstâncias, ou por influência do ambiente,
enfim... o que importa é o resultado final, ou pelo menos parcial, considerando
que ser humano é uma obra em construção contínua.
De modo que até onde ela
percorreu nessa jornada se pode dizer que o cômputo foi extraordinário. A
Isabel incansável em ser, em fazer sempre mais e melhor se tornou uma
inspiração para muita gente, por aí. Por causa dela, como diz a canção do gênio
Milton Nascimento, é “que muita gente boa
pôs o pé na profissão” 1 e o
vôlei foi, devagarinho, consolidando o seu espaço, a sua força, a sua
representatividade nacional. Não só como desporto; mas, como um instrumento de
formação humana, de educação e de aperfeiçoamento cidadão.
Por isso, o dia foi arrastado,
foi triste. Os de repentes da vida são sempre indigestos, difíceis, porque não
nos dão chance de contestar. Acontece e pronto! Só que perdas assim, são muito
doídas, muito complexas para se assimilar num piscar de olhos. O mundo perde um
ser humano e a gente perde um pedaço da nossa própria história, na medida em
que aquele ser por quem se nutria admiração, respeito, carinho, se foi. Deixou seu
legado, deixou memórias, deixou histórias; mas, que param por aqui, não terão
mais amanhãs.
Agora, é nisso que as emoções, os sentimentos humanos se apegam, como quem se abraça a um travesseiro macio para se refugiar do desconforto, da tristeza. Mas, como tão bem escreveu Rubem Alves, “Aquilo que está escrito no coração não necessita de agendas, porque a gente não esquece. O que a memória ama fica eterno”. Portanto, apesar da partida, Isabel permanece. Linda, forte, radiante, inspiradora, símbolo de gente do mais alto quilate humano que se possa imaginar.
1 Nos Bailes da Vida (Milton Nascimento/ Fernando Brant) - https://www.letras.mus.br/milton-nascimento/47438/