A
esperança nunca para de soprar...
Por
Alessandra Leles Rocha
Hoje é dia para ler e reler o
poema Esperança 1,
de Mário Quintana! Sorver de maneira delicada e profunda as palavras que compõem,
de maneira quase infantil, o grande segredo da existência humana. Não entendeu?
Ora, somos movidos cotidianamente pela esperança! Sem ela, tudo é terra
arrasada, sem perspectiva, sem sonho, sem nada. É por essa emoção repentina,
que brota de algum lugar dentro da alma, então, que a vida não desbota até a
última gota. Que os fiapos de energia nos seguram pelas mãos.
Algo que me faz recordar Rubem
Alves, quando escreveu que “Hoje não há
razões para otimismo. Hoje só é possível ter esperança. Esperança é o oposto do
otimismo. ‘Otimismo é quando, sendo primavera do lado de fora, nasce a
primavera do lado de dentro. Esperança é quando, sendo seca absoluta do lado de
fora, continuam as fontes a borbulhar dentro do coração’. Camus sabia o que era
esperança. Suas palavras: ‘E no meio do inverno eu descobri que dentro de mim
havia um verão invencível...’. Otimismo é alegria ‘por causa de’: coisa humana,
natural. Esperança é alegria ‘a despeito de’: coisa divina. O otimismo tem suas
raízes no tempo. A esperança tem suas raízes na eternidade. O otimismo se
alimenta de grandes coisas. Sem elas, ele morre. A esperança se alimenta de
pequenas coisas. Nas pequenas coisas ela floresce...” 2.
Assim, a partir dessa percepção
podemos encontrar uma pista das razões que nos levam a resistir tão bravamente
às tempestades e intempéries que investem contra os seres humanos, sem piedade.
Quando tudo parece nos engolir, nos soterrar, nos massacrar, nos colocar de
joelhos, eis que a esperança desconstrói o cenário e apazigua mente e coração. O
que me faz acreditar que, por mais que se diga ter chegado ao fundo do poço,
isso de fato nunca acontece. Estamos sempre presos a um último bastião de
esperança. No entanto, ele não se consome em si mesmo, ele se renova para estar
sempre à disposição quando se fizer necessário. É inesgotável. É atemporal.
É essa esperança que nos ajuda a
cicatrizar as feridas do tempo, da vida. A não permitir que sangremos sem
socorro, sem auxílio, sem amparo. Contudo, as cicatrizes permanecem para não
nos deixar esquecer e acreditar que a vida possa ser resumida na autossuficiência
da esperança. Não. Como bem destacou Mario Sergio Cortella, “Segundo o grande pensador da educação,
Paulo Freire, é preciso ter esperança para chegar ao inédito viável e ao sonho.
Cuidado! Há pessoas que têm esperança do verbo ‘esperar’. Esse grande educador
e filósofo falava da esperança do verbo ‘esperançar’. Esperar é: ‘Ah, eu espero
que dê certo, espero que aconteça, espero que resolva’. Esperançar é ir atrás,
é não desistir. Esperançar é ser capaz de buscar o que é viável para fazer o
inédito. Esperançar significa não se conformar” 3.
Você já deve ter lido o livro, ou
assistido ao filme, O Curioso Caso de Benjamin
Button 4. Trata-se de um conto do
escritor norte-americano F. Scott Fitzgerald, publicado em 1922, no qual ele
narra a história de um homem pela perspectiva inversa da vida, ou seja, da
velhice para a infância. E dentre as mais famosas citações da obra está uma que
coaduna exatamente com as palavras de Cortella. Ela diz o seguinte, “Para as coisas importantes, nunca é tarde
demais, ou no meu caso, muito cedo, para sermos quem queremos. Não há um limite
de tempo, comece quando quiser. Você pode mudar ou não. Não há regras. Podemos fazer
o melhor ou o pior. Espero que você faça o melhor. Espero que veja as coisas
que a assustam. Espero que sinta coisas que nunca sentiu antes. Espero que
conheça pessoas com diferentes opiniões. Espero que viva uma vida da qual se
orgulhe. Se você achar que não tem, espero que tenha a força para começar
novamente”.
E se essa esperança não lhe
satisfaz por considerar que esteja baseada na criação ficcional, veja a
história da poetisa goiana Cora Coralina. Ela só publicou seu primeiro livro
aos 75 anos de idade, embora tenha começado a escrever aos 14. Quando o assunto
é esperança, ela é um exemplo indiscutível! Aliás, como ela mesma escreveu, “Eu sou aquela mulher / a quem o tempo /
muito ensinou. / Ensinou a amar a vida. / Não desistir da luta. / Recomeçar na
derrota. / Renunciar a palavras e pensamentos negativos. / Acreditar nos
valores humanos. Ser otimista. / Creio numa força imanente / que vai ligando a
família humana/ numa corrente luminosa / de fraternidade universal. / Creio na
solidariedade humana. / Creio na superação dos erros / e angústias do presente.
/ Acredito nos moços. / Exalto sua confiança, / generosidade e idealismo. /
Creio nos milagres da ciência / e na descoberta de uma profilaxia / futura dos
erros e violências / do presente. / Aprendi que mais vale lutar / do que
recolher dinheiro fácil. / Antes acreditar do que duvidar” (Ofertas de Aninha [
aos moços]) 5.
Portanto, há esperança! Em mim,
em você, no outro... Na ficção. Na
realidade. Em cada átomo de energia existente no universo. Esperança no hoje,
no amanhã, no depois de amanhã, ... sempre. Com ou sem lágrimas. Com ou sem
sorrisos. Com ou sem abraços. Mas, sempre uma esperança genuína, motivante, transformadora.
Uma esperança que tende a emergir o melhor que há em cada ser humano, apesar
das sombras e das escuridões que tentam consumi-lo com voracidade. Porque é esperança com ares de criança, com
leveza, com alegria, com gosto de quero mais... Mais da vida. Mais do belo. Mais
do sagrado. Mais do tempo. Mais... Apenas, mais.