sexta-feira, 26 de agosto de 2022

Ah! Se o salário pudesse falar!


Ah! Se o salário pudesse falar!

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Acompanhando as notícias a respeito das eleições, no Brasil, não tenho como achar, até certo ponto, curiosas as análises sobre as preferências dos eleitores, com base na sua renda. Não me entendam mal; mas, sou imediatamente conduzida ao pensamento que circula no universo das nossas heranças coloniais.

Afinal de contas, certos veículos de informação e comunicação ainda se apegam no discurso da velha fragmentação da pirâmide social e fazem distinções em torno da classe média, como era possível de se fazer há algumas décadas. Aliás, essas distinções não passam de mero rapapé para lustrar o ego das pessoas e fazer-lhes parecer mais bem remuneradas do que na verdade são.

Ora, vejamos que o salário mínimo, hoje, no país, é de R$1.212,00. Mas, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), em sua última apuração, no mês de julho, este deveria ter sido de R$6.388,55 para cobrir aquilo que estabelece a Constituição Federal como necessidades básicas do trabalhador e sua família.  Mas, retirando os mais de 10 milhões de desempregados no país, quantos cidadãos na atualidade brasileira ganham, de fato, esses R$6 mil, hein?

Não nos enganemos com a visita da saúde, como chamam a melhora súbita antes da morte! Sim, porque é exatamente esse fenômeno que estamos presenciando antes do pleito eleitoral, em relação a certas estatísticas econômicas. O jogo de espelhos que fazem com os números para encantar e ludibriar o sujeito, logo desaparecerão na fumaça da efemeridade que se ergue imediata no pós-eleição.

Aliás, tanto os prognósticos nacionais quanto os internacionais, para 2023, não são os melhores e a tendência de dias difíceis deve ser encarada como um fato concreto, a fim de se evitar maiores dissabores. Vejam que, em 2021, as notícias no campo econômico nacional já davam conta de um achatamento significativo da classe média 1.

Na ocasião seu percentual populacional se igualou ao da classe baixa em 47%. Mas, depois disso, muita água rolou por debaixo da ponte, e a crise econômica recrudesceu um bocadinho mais sobre os brasileiros. De modo que a sobrevivência está cada vez mais susceptível aos malabarismos que a renda achatada do cidadão precisa fazer!

Em linhas gerais, isso significa que diariamente mais pessoas acabam indo cerrar fileira nas camadas mais vulneráveis do estrato social, por conta da perda do poder de compra salarial, como já apresentei acima. Sem essa, então, de trazer de volta a velha ideia da classe média alta, classe média (média) e classe média baixa, ok?! Não vejo razão, portanto, para ninguém nessa situação cogitar a possibilidade de pensar que está em uma conjuntura social favorável!

Só para constar, a atual configuração da renda mensal domiciliar, no contexto da pirâmide social brasileira é a seguinte: “classe A: 2,8% (acima de R$22 mil), classe B: 13,2% (entre R$7,1 mil e R$22 mil), classe C: 33,3% (entre R$2,9 mil e R$7,1 mil) e classes D/E: 50,7% (até R$2,9 mil)”2 . Agora, imagine dividir esses valores pela pesquisa do DIEESE e descobrir quanto vale realmente o seu salário pela perspectiva do salário mínimo que deveria ser pago no país.

Chocado (a)? Então, acorda! Os brioches já se foram. Os pães dormidos, também. Os luxos e os supérfluos já não fazem parte da lista de compras. ... E mesmo assim, o dinheiro teima na sua insuficiência! Por isso é que a vida pede atenção. Certas coisas não dão para fingir que não viu, que não sabe, que não entende, que paga para não ter preocupações, porque não adianta. O resumo dessa ópera é o empobrecimento populacional que está em curso, queira você admitir ou não.

O acirramento da desigualdade está cada vez se aprofundando mais! Toda nova crise ou turbulência que a economia venha a enfrentar será um desespero só. Por isso, não cabe mais a velha ideia de se considerar “a última bolacha do pacote”! Não há certeza maior nessa vida do que a incerteza, como explicou bem a pandemia. Daí a necessidade de dizer adeus para o seu lugar na fila do gargarejo da sociedade de consumo.

Chega de ser perdulário, gastador, imprevidente, esbanjador! São tempos da razão e não, da emoção! A palavra de ordem é reaprender. Reaprender a se organizar, a repensar, a priorizar, a recusar, a reduzir, a reaproveitar, a reutilizar, a reciclar. Porque enquanto você se entretém nessa missão, você se descobre e se enxerga como realmente é. Sem precisar disso ou daquilo para ser alguém na fila do pão!

Antes de pertencer a esse ou aquele lugar, você sempre existiu! E é isso o que realmente importa, no frigir dos ovos. A realidade nos impõe a prioridade de satisfazer as demandas vitais e não, os delírios de ocasião. E esse movimento, que muitos chamam de minimalista, consegue trazer um novo reposicionamento humano para o mundo. Afinal, como escreveu Aldous Huxley, “Todo excesso traz em si, o germe da autodestruição”.

Daí a necessidade de descobrir que não basta só olhar para dentro ou só para fora, é preciso olhar em várias direções, em vários sentidos, para descobrir como a vida lhe faz sentido. Mas, um sentido que é capaz de preencher a alma. Que traz leveza, que traz paz, que traz luz para a consciência, sem que você precise romper ou cortar relações com esse capitalismo selvagem que corre solto por aí. A tarefa está longe de ser fácil; mas, precisa ser feita. Precisa sim! Então, mãos à obra!

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