Ah! Se o salário pudesse falar!
Por Alessandra Leles Rocha
Acompanhando
as notícias a respeito das eleições, no Brasil, não tenho como achar, até certo
ponto, curiosas as análises sobre as preferências dos eleitores, com base na
sua renda. Não me entendam mal; mas, sou imediatamente conduzida ao pensamento
que circula no universo das nossas heranças coloniais.
Afinal de
contas, certos veículos de informação e comunicação ainda se apegam no discurso
da velha fragmentação da pirâmide social e fazem distinções em torno da classe
média, como era possível de se fazer há algumas décadas. Aliás, essas
distinções não passam de mero rapapé para lustrar o ego das pessoas e
fazer-lhes parecer mais bem remuneradas do que na verdade são.
Ora,
vejamos que o salário mínimo, hoje, no país, é de R$1.212,00. Mas, segundo o
Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE),
em sua última apuração, no mês de julho, este deveria ter sido de R$6.388,55
para cobrir aquilo que estabelece a Constituição Federal como necessidades básicas
do trabalhador e sua família. Mas,
retirando os mais de 10 milhões de desempregados no país, quantos cidadãos na
atualidade brasileira ganham, de fato, esses R$6 mil, hein?
Não nos
enganemos com a visita da saúde, como chamam a melhora súbita antes da morte!
Sim, porque é exatamente esse fenômeno que estamos presenciando antes do pleito
eleitoral, em relação a certas estatísticas econômicas. O jogo de espelhos que
fazem com os números para encantar e ludibriar o sujeito, logo desaparecerão na
fumaça da efemeridade que se ergue imediata no pós-eleição.
Aliás, tanto
os prognósticos nacionais quanto os internacionais, para 2023, não são os
melhores e a tendência de dias difíceis deve ser encarada como um fato
concreto, a fim de se evitar maiores dissabores. Vejam que, em 2021, as
notícias no campo econômico nacional já davam conta de um achatamento
significativo da classe média 1.
Na
ocasião seu percentual populacional se igualou ao da classe baixa em 47%. Mas,
depois disso, muita água rolou por debaixo da ponte, e a crise econômica
recrudesceu um bocadinho mais sobre os brasileiros. De modo que a sobrevivência
está cada vez mais susceptível aos malabarismos que a renda achatada do cidadão
precisa fazer!
Em linhas
gerais, isso significa que diariamente mais pessoas acabam indo cerrar fileira
nas camadas mais vulneráveis do estrato social, por conta da perda do poder de
compra salarial, como já apresentei acima. Sem essa, então, de trazer de volta
a velha ideia da classe média alta, classe média (média) e classe média baixa,
ok?! Não vejo razão, portanto, para ninguém nessa situação cogitar a
possibilidade de pensar que está em uma conjuntura social favorável!
Só para
constar, a atual configuração da renda mensal domiciliar, no contexto da
pirâmide social brasileira é a seguinte: “classe A: 2,8% (acima de R$22 mil),
classe B: 13,2% (entre R$7,1 mil e R$22 mil), classe C: 33,3% (entre R$2,9 mil
e R$7,1 mil) e classes D/E: 50,7% (até R$2,9 mil)”2
. Agora, imagine dividir esses valores pela pesquisa do DIEESE e descobrir
quanto vale realmente o seu salário pela perspectiva do salário mínimo que
deveria ser pago no país.
Chocado
(a)? Então, acorda! Os brioches já se foram. Os pães dormidos, também. Os luxos
e os supérfluos já não fazem parte da lista de compras. ... E mesmo assim, o
dinheiro teima na sua insuficiência! Por isso é que a vida pede atenção. Certas
coisas não dão para fingir que não viu, que não sabe, que não entende, que paga
para não ter preocupações, porque não adianta. O resumo dessa ópera é o
empobrecimento populacional que está em curso, queira você admitir ou não.
O
acirramento da desigualdade está cada vez se aprofundando mais! Toda nova crise
ou turbulência que a economia venha a enfrentar será um desespero só. Por isso,
não cabe mais a velha ideia de se considerar “a última bolacha do pacote”! Não há certeza maior nessa vida do
que a incerteza, como explicou bem a pandemia. Daí a necessidade de dizer adeus
para o seu lugar na fila do gargarejo da sociedade de consumo.
Chega de
ser perdulário, gastador, imprevidente, esbanjador! São tempos da razão e não,
da emoção! A palavra de ordem é reaprender. Reaprender a se organizar, a
repensar, a priorizar, a recusar, a reduzir, a reaproveitar, a reutilizar, a
reciclar. Porque enquanto você se entretém nessa missão, você se descobre e se
enxerga como realmente é. Sem precisar disso ou daquilo para ser alguém na fila
do pão!
Antes de
pertencer a esse ou aquele lugar, você sempre existiu! E é isso o que realmente
importa, no frigir dos ovos. A realidade nos impõe a prioridade de satisfazer
as demandas vitais e não, os delírios de ocasião. E esse movimento, que muitos
chamam de minimalista, consegue trazer um novo reposicionamento humano para o
mundo. Afinal, como escreveu Aldous Huxley, “Todo
excesso traz em si, o germe da autodestruição”.
Daí a
necessidade de descobrir que não basta só olhar para dentro ou só para fora, é
preciso olhar em várias direções, em vários sentidos, para descobrir como a
vida lhe faz sentido. Mas, um sentido que é capaz de preencher a alma. Que traz
leveza, que traz paz, que traz luz para a consciência, sem que você precise
romper ou cortar relações com esse capitalismo selvagem que corre solto por aí.
A tarefa está longe de ser fácil; mas, precisa ser feita. Precisa sim! Então,
mãos à obra!