Juventude.
Cidadania. O que esperar dessa combinação?
Por
Alessandra Leles Rocha
Cuidado com as aparências, porque
elas podem enganar! A fragilidade da cidadania brasileira é real e, por isso
mesmo, precisa ser levada mais a sério nas análises sociopolíticas. E um dos
aspectos que me chamou atenção nesse sentido é o comportamento dos jovens.
Uma euforia imensa se formou por
conta do aumento do número de jovens aptos a votar; mas, cujo voto ainda é
facultativo. Movidos pelos clamores de anônimos e famosos que se uniram para
estimulá-los a retirar o título de eleitor e participar do próximo pleito, eles
seguiram a onda.
Porém, isso não é tudo. Observando
semana após semana os arredores do meu apartamento, localizado próximo a um
Campus Universitário, de quarta-feira à domingo, a juventude vive como se não
houvesse amanhã, em suas baladas barulhentas e inconsequentes. Sinto como se da
minha janela para fora existisse um outro Brasil, explodindo felicidade e
normalidade pelos poros.
As ruas nessa região amanhecem
repletas de garrafas quebradas, muito lixo derivado da festança. Nem parece que
o país padece com uma inflação de mais de dois dígitos, a precarização do
trabalho e o desemprego correndo solto, o achatamento da renda consumindo a
dignidade do cidadão, pessoas comendo ossos de boi e pés de galinha por total
falta de opção, ... e as próprias universidades (especialmente, as públicas),
padecendo aos cortes severos e contínuos no seu orçamento.
Pois é. A galera do circuito
universitário com o título na mão, por exemplo, não me parece preocupada com
nada disso. Aliás, não me parece preocupada nem com o hoje e nem com o amanhã
do seu próprio país. Pelo menos, por enquanto, a mesada está em dia. Pais e
mães, certamente, fazendo das tripas coração, estão apertando os cintos para
não deixar faltar nada aos seus rebentos em fase de vida universitária.
Mas, até quando? Essa é a
pergunta que deveriam fazer. Não sou contra a juventude, nem a alegria, nem a
diversão, nem o lazer. Mas, os tempos estão bicudos, sisudos demais para
considerar normal tanto excesso. Qualquer saída de casa para desanuviar o
pensamento, na atual conjuntura nacional, corresponde a um pequeno rombo no orçamento
de qualquer cidadão trabalhador. Imagina, então, sair toda semana, de
quarta-feira à domingo?
É preciso considerar, inclusive,
que nem todos os universitários são naturais da cidade em que estudam e residem
com a própria família. Há um contingente, bastante expressivo, daqueles que
chegam de outras cidades para estudar, o que representa uma despesa fixa com
aluguel, às vezes condomínio, celular, internet, alimentação, transporte,
xerox, livros, participação em congressos e eventos científicos, enfim...
E nem podem contar com as bolsas de
pesquisa e/ou os auxílios ofertados pelas universidades, no caso das públicas,
porque estes são tempos de vacas muito magras e esses benefícios têm sido extremamente
limitados e incertos. Quando faltam recursos para despesas operacionais básicas
das instituições, há uma redução drástica dos departamentos em relação a esse
tipo de investimento.
Assim, procurar um trabalho,
seria o ideal para colaborar nas despesas; mas, onde? Se as vagas andam também
escassas! Se muitos cursos são de tempo integral. Se as exigências acadêmicas,
muitas vezes, impõem uma inflexibilidade horária. Aqueles que chegam ao limite
acabam não tendo outra opção a não ser trancar a faculdade e aguardar um
momento mais oportuno. E essa evasão soa como um inesperado tapa na cara, que
rompe com o sonho para trazer a realidade bruta e cruel.
Embora meu relato se refira a um
pequeno recorte populacional, tenho certeza de que ele não é caso único. Quantas
instituições de ensino superior existem no Brasil? Infelizmente, esse perfil da
juventude brasileira se mostra, em uma significativa proporção, dissociada da
sua própria cidadania, como se esta estivesse resumida ao ato de votar. Como um
compromisso de um único dia estabelecido no calendário, com alguns minutos
predeterminados, e pronto. A sua responsabilidade termina ali.
Desse modo, tudo isso é muito
preocupante não só pelo agora, mas pelos próximos anos, considerando o cenário
de terra arrasada que se figura no país. O desvirtuamento econômico ao qual o
Brasil foi submetido impactou todos os setores, todas as engrenagens que fazem o
desenvolvimento e o progresso de uma nação caminharem. E não bastasse isso, a
conjuntura internacional já se mostra muito pouco auspiciosa para os próximos
anos, repercutindo seus efeitos negativos aqui dentro também.
A geração contemporânea,
portanto, precisa acordar antes que seja tarde. Precisa entender que a
contemporaneidade é o campo das incertezas, do imponderável, do imprevisível. E
que cada dia ele se acirra mais nesse sentido. Nenhuma perspectiva de futuro
lhes chegará em uma bandeja de prata. Muito pelo contrário! A tendência é ter
que lutar por um dia de cada vez! Nada de grandes sonhos, grandes ambições. E isso não vale só para os mais vulneráveis economicamente,
vale para os ricos também!
Não se esqueça, todo hoje é um amanhã! Então, não dá para postergar. Não dá para outorgar a quem possa interessar. A vida do país interfere diretamente na sua vida. Isso significa que o mundo real não é uma festa e a cidadania é uma questão de sobrevivência. Daí a necessidade de a juventude brasileira rever seus conceitos, desconstruir seus paradigmas e despertar sua consciência desse torpor alienante aspergido, há tempos, pela sociedade de consumo.