terça-feira, 26 de julho de 2022

Ao silenciarem-se, eles silenciam o direito do povo de conhecê-los


Ao silenciarem-se, eles silenciam o direito do povo de conhecê-los

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Aberta oficialmente a corrida eleitoral de 2022, no Brasil, precisamos, enquanto cidadãos, saber se apenas a euforia das Convenções Partidárias e do corpo a corpo com os eleitores é mesmo o suficiente para uma tomada de decisão consciente. Ora, não se dá um cheque em branco a ninguém!

Sim, porque a flagrante desigualdade estabelecida dentro da legislação eleitoral, no que diz respeito ao tempo de rádio e TV dos candidatos para a exposição das suas propostas e perspectivas, beneficia claramente uns e detrimento de outros.

E ainda que a realidade contemporânea nos oportunize os meios tecnológicos de informação e comunicação, não é preciso recapitular a verdade sobre as discrepâncias de acessibilidade tecnológica no país.

Seja por carência e insuficiência estrutural no setor, que não abrange equitativamente o país. Seja pelo custo que onera as despesas de milhões de famílias. Seja pela ausência de letramento digital para o manuseio correto das ferramentas tecnológicas. Enfim...

De modo que esse cenário, como está configurado, acaba por favorecer, e muito, a disseminação de Fake News, na medida em que tira da expressão dos próprios candidatos as suas pretensões para repassá-las a partir das perspectivas de terceiros, nem sempre muito bem-intencionados.

O que significa que das Fake News para as idealizações pessoais é um pulo! De distorções em distorções da realidade se estabelece uma ideia totalmente equivocada e absurda a respeito desse ou daquele candidato. Afinal, ambos os lados, candidatos e eleitores, estão imersos em suas bolhas e distanciados da possibilidade dialógica franca e objetiva.

Começa, assim, o estopim para a fragilização da Democracia. Quando os candidatos se abstêm das oportunidades de falar e de responder aos questionamentos da sociedade, ainda que por intermédio de jornalistas e especialistas em Ciências Políticas e outras áreas do conhecimento.  

Ao silenciarem-se, eles silenciam o direito do povo de conhecê-los um pouco mais. De exporem suas propostas para o país a fim de recolocá-lo nos trilhos com práticas de gestão socioambientalmente responsáveis capazes de resultar em benefícios sociais, atendendo aos mais diversos espectros de demandas.

A recusa na participação democrática dialógica traz à tona um simplismo constrangedor, dada a costumeira justificativa de que os candidatos já são conhecidos. Ora, a discussão não é sobre eles, enquanto pessoa física! A discussão, necessária e fundamental, é sobre o que cada um, enquanto pretenso candidato a, objetiva fazer para o país diante daquele recorte temporal que estabelece o novo mandato.

Como reconstruir, a partir das perdas que se contabilizaram ao final desse ciclo? Como enfrentar os desafios? Como superar as eventuais adversidades? Como recobrar o protagonismo no cenário internacional? Como alavancar novas práxis de administração e gestão alinhadas aos pensamentos sustentáveis? Como...?

São perguntas assim, de cunho cidadão, que permitem aos eleitores construir um panorama do que pode ou não ser alcançado na próxima gestão. Que podem minimizar os rompantes de idealização em torno de transformações radicais e surpreendentemente rápidas, trazendo para o campo da realidade, do possível, do palatável, a consciência da população.

Sem contar, o essencial! A participação dos candidatos, especialmente no que diz respeito aos cargos do Executivo, nos eventos de discussão política, nos permite avaliar a segurança e o nível de conhecimento e preparo deles para a investidura do cargo, ao qual pretendem ocupar. Sabem se expressar ou não? Suas respostas são firmes e diretas? São elegantes ou sarcásticos? São conscientes do seu papel ou dados as aventuras políticas? ...

Mas, além de tudo isso, é preciso reconhecer que a recusa de qualquer dos candidatos à participação nesses eventos, não deixa de transmitir uma mensagem subliminar de arrogância, de prepotência e de uma pseudossuperioridade em relação aos demais. Algo que advém, muitas vezes, em razão dos percentuais estatísticos das pesquisas eleitorais de opinião.

Acontece que o fato de as pessoas simpatizarem mais com esse ou aquele, é muito relativo. As pesquisas são estruturadas a partir de perguntas genéricas e abrangentes, que não dissecam em nenhum momento as intenções de cada candidato. Ali, é só uma amostra superficial e não necessariamente estável da realidade, sujeita a constantes mudanças.

Daí a necessidade de todos se apresentarem. A participação nos eventos de discussão política traz a igualdade e a equidade aos candidatos. Naquele momento todos desfrutam do mesmo tempo de fala, sob o escrutínio dos mesmos interlocutores, sob o mesmo espaço físico, de modo que eles estão sob as mesmas condições, sem privilégios ou regalias. Nenhum é mais ou menos do que o outro.

Mais do que nunca é necessária essa reflexão. Precisamos nos questionar sobre a passividade de aceitação em relação a certos comportamentos dos nossos pretensos candidatos. Como escreveu Steven Levitsky, “Sempre há incerteza sobre como um político sem histórico vai se comportar no cargo, mas, como foi observado antes, líderes antidemocráticos são muitas vezes identificáveis antes de chegarem ao poder” 1



1 LEVITSKY, S.; ZIBLATT, D. Como as democracias morrem. Traduzido por Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Zahar, 2018. 272p.