Um
saco sem fundo
Por
Alessandra Leles Rocha
Me incomoda a ideia propagada por
muitos de que a próxima eleição é a solução para o Brasil, porque ela não é
completa. A mudança das peças no tabuleiro por si só é pouco relevante se não
vier acompanhada de um entendimento sobre tudo aquilo que sustenta o emaranhado
de problemas, que fazem do país uma terra de constante insuficiência.
Então, só para despertar o
gatilho dessa reflexão, que tal parar e pensar sobre a carga tributária
brasileira? Ocupando a 14ª posição nesse ranking mundial é preciso entender que
não se trata apenas de uma questão de equívocos, distorções e absurdos a compor
a cobrança de impostos no país, o verdadeiro problema. Nem tampouco, que uma
reforma nesse contexto seria mesmo a solução efetiva.
Se a situação crítica chegou ao
ponto que chegou foi porque os impostos por aqui, há mais de 500 anos, tendem a
funcionar como uma boia de segurança para a manutenção dos desvarios e
futilidades de quem se encontra lotado nas esferas do poder.
Não é à toa que a rede de
impostos e tributos foi se desenvolvendo a cada situação em que a arrecadação
se mostrou aquém das expectativas, ou seja, na medida em que essas pessoas se
sentiam ameaçadas nos seus interesses era hora de o governo se dispor a criar novos
impostos para resolver a situação.
Assim, no ano de 2021, por
exemplo, foram quase cinco meses (149 dias)1
para que o cidadão brasileiro cumprisse com o pagamento de seus tributos. Algo que
ele (a) não tem como escapar de fazer, considerando o sistema de cobrança que o
envolve nas mínimas atividades do seu cotidiano.
Então, basta abastecer o veículo,
ou fazer uma compra no supermercado, ou pagar uma conta na farmácia, ou produzir
e/ou comercializar um produto, que os impostos estão lá embutidos na transação
financeira.
O problema é que, como já
manifestei diversas vezes, 94% da população brasileira mostrou em 2021 que vem
perdendo significativamente a sua renda 2.
Isso significa que o esforço para arcar com os custos da carga tributária vem
se agravando e deixando um rastro de carências e insuficiências, que tendem a
se cronificar pela inexistência de medidas de contenção e/ou solução, por parte
do governo.
Assim, entra ano e sai ano, sem
que a população brasileira vislumbre qualquer sinal de transformação e/ou de
melhoria na sua qualidade de vida, a ser refletida através do retorno que se
espera a partir da arrecadação dos tributos.
Muito pelo contrário, ela é
levada à exaustão para dar conta das suas obrigações cidadãs; mas, cai na
armadilha de ser obrigada a pagar, quantas vezes forem necessárias, para fazer
por si mesma em termos dos seus direitos fundamentais.
Esse é o ponto. Ser a 14ª maior
carga tributária do mundo não significa nada de positivo para o Brasil, porque
ela visivelmente se perde pelos labirintos dos crimes cometidos contra a
administração pública, de modo que jamais chega a cumprir o seu papel de
garantidora e mantenedora das demandas do cidadão.
Os discursos e as narrativas tentam
sempre dar conta de uma insuficiência de recursos cronificada, para tentar
justificar a inação, a incompetência, a negligência, o descaso que se avoluma pelos
corredores do poder. Ué, mas ela não é a 14ª maior carga tributária do mundo???
Mas, para total tristeza da
população, eis que esse vultoso montante de recursos, com uma frequência incomodamente
recorrente, surge nas páginas dos veículos de informação e comunicação no
flagrante de carros, de malas, de cuecas, de “búnqueres”, de aviões, ... recheados de dinheiro público.
Ora, o que é o dinheiro público
senão dinheiro de impostos e tributos? Então, é como se a tal insuficiência de
recursos alegada pelo governo risse bem alto na cara de cada cidadão.
Sim, daquela gente que se
desespera pela falta de emprego, pela miséria, pela fome, pela inflação, pela
sanha no preço dos combustíveis e tarifas de energia, pela falta de medicamentos
e imunobiológicos, pela impossibilidade de um tratamento médico, pela casa
perdida nas enchentes, pelo fogo criminoso que consumiu seu roçado, pela existência
de rodovias em péssimas condições de tráfego, pelas águas contaminadas dos
rios, pela ausência de saneamento básico, pela demora na formulação e execução
de políticas habitacionais, ... apesar da consciência e da certeza de ter pago tão
caro pela esperança.
É preciso deixar claro que
ajustes ou reformas tributárias, ainda que bem-vindos, se não resultarem na
aplicação adequada dos recursos arrecadados, jamais haverá a transformação
aguardada pela população.
Pode-se fazer muito com pouco;
mas, também, pode-se fazer nada com muito. Por isso, não é só uma questão de
voto. É uma questão de eleger pessoas que estejam, de fato, dispostas a cumprir
as suas obrigações constitucionais.
Essa ideia de sempre inverter o
discurso e dizer que os problemas continuam porque a carga tributária é elevada,
não cola mais. Porque, se é assim, então, haveria recursos suficientes para
restituir a população na resolução das suas demandas. Tendo em vista de que o
Brasil tem a 14ª maior carga tributária do mundo. A verdade é que estamos
simplesmente diante do mau uso, do mau emprego de recursos públicos.
Assim, além de todos os subterfúgios
fraudulentos, dos projetos sem pés nem cabeça, dos aditivos multimilionários,
também, é pública e notória a existência de muitos veios para custear todos os crimes
cometidos contra a administração pública. É por esse esgoto que vemos o país se
esvair e afundar.
É preciso, então, descobrir quem vai dar a devida atenção a esse “saco sem fundo”, chamado Brasil. Daí a necessidade de pessoas dispostas, interessadas, com vontade de arregaçar as mangas e trabalhar; pois, certamente, irão esbarrar e atrapalhar os interesses de muitos outros, por aí, que se acostumaram a essas práxis e não pretendem abrir mão, tão facilmente, da “boa vida”.