E
agora? Como será o amanhã?
Por
Alessandra Leles Rocha
As Revoluções Industriais que
vieram prometendo, mundos e fundos, para a humanidade, também, vieram tecendo
uma dependência terrível em relação aos combustíveis fósseis – petróleo, carvão
mineral e gás natural.
A tal ponto, que nem mesmo a
crise do Petróleo nos anos 70, quando se descobriu que as reservas do produto
eram finitas, explodindo em uma hipervalorização do mesmo no mercado internacional,
fez a humanidade rever a questão.
Tanto a diversa produção
industrial quanto a vida cotidiana haviam sido condicionadas a girar,
principalmente, em torno de produtos e de derivados de petróleo. Gasolina,
diesel, óleos lubrificantes, GLP, produtos asfálticos, querosene, chiclete, plásticos,
tecidos (como o náilon e o poliéster), corantes, conservantes, flavorizantes,
brinquedos, borracha sintética, esmaltes de unha, produtos de limpeza, filme
fotográfico, giz de cera, balões de festa, ...
Então, o que parece uma
praticidade incorporada ao cotidiano, com o tempo foi mostrando não só o seu custo
financeiro, em decorrência dos constantes reajustes no preço dos barris; mas,
os custos socioambientais.
Os quais incluem não só a
dificuldade de degradação desses resíduos no meio ambiente e os eventuais acidentes
com navios de transporte e plataformas marítimas de extração do produto; bem
como, as doenças decorrentes do contato direto com esses produtos e subprodutos,
tais como patologias cardiovasculares e respiratórias, alergias e neoplasias.
No entanto, isso também não fez a
humanidade rever a questão. Aliás, é importante ressaltar que pesquisas científicas,
fóruns internacionais, cúpulas governamentais e não governamentais, e tantos
outros esforços em demonstrar e alertar sobre os caminhos transitados pela
humanidade, em relação aos combustíveis fósseis, foram (e ainda são) frequentemente
realizados e documentos, a partir deles, discutidos e assinados por diversos
países.
Acontece que, o mundo já é um
refém do sistema socioeconômico proposto pelas Revoluções Industriais, de modo
que a geração de riqueza, poder e influência política advindos dele tornaram-se
os argumentos primordiais para a tomada de quaisquer decisões a respeito.
Contudo, a tendência natural dos
problemas é piorar e com o uso dos combustíveis fósseis não é, e nem seria,
diferente. Então, a medida em que as conjunturas se tornaram mais desafiadoras foi
inevitável buscar e aceitar medidas mais restritivas a eles e outras substituíveis.
Porém, sem comprometer
demasiadamente o seu papel preponderante nos processos de produção mundial e na
dinâmica cotidiana das sociedades. Isso significa que as alternativas propostas
emergiram muito timidamente e com pouca participação e contribuição na
resolução efetiva dos problemas, alguns, inclusive, já secularmente
cronificados.
Mas, como dizem por aí, nada melhor
do que um dia após o outro, porque desse movimento pode despontar uma surpresa,
um elemento imponderável. Então, ele surgiu. Uma pena que seja pela figura de
uma guerra, cujas proporções ainda não se pode mensurar exatamente; mas, que já
causam tensões e rupturas socioeconômicas importantes no cenário da diplomacia
internacional.
A invasão da Ucrânia pela Rússia
está tendo, portanto, um impacto direto na questão dos combustíveis fósseis,
pelo fato de que os russos são os maiores exportadores de gás natural e o
segundo na exportação de petróleo, no planeta.
Isso significa que “o setor energético representa perto de dois
terços de toda a renda da Rússia (63%). Mais da metade da população (53%) vive
de salários ou pensões do governo. O gás e o petróleo acabam botando a sociedade
de pé” 1.
Aliás, foi com a tomada da
Crimeia pela Rússia, em 2014, que se despertou uma consciência nos europeus, no
que diz respeito a redução da dependência do gás natural russo; entretanto,
nada que fosse verdadeiramente impactante nas relações entre as partes.
Mas, agora, e especialmente com a
decisão dos EUA em proibir a importação de petróleo russo e derivados 2 em seu país, as movimentações já acenam
uma eliminação dos produtos combustíveis de origem russa por parte de outros
países.
No entanto, isso cobrará um preço
de toda a população mundial; afinal, “o
mundo não pode prescindir do petróleo ou gás russo. A Rússia exporta mais de 8
milhoes de barris por dia de petróleo bruto e produtos refinados. Não há como
substituir este volume”, nem mesmo, “mobilizando
a Arábia saudita 100% e os Emirados 100% se consegue encher entre dois e três milhões
de barris por dia” 3.
Mas, a insuficiência combustível é
só a ponta do iceberg. O grande x dessa questão está no fato de que o planeta
se permitiu viver atrelado à dependência dos combustíveis fósseis, mesmo diante
de todos os alertas, todos os avisos, todos os dados científicos.
Hoje, a questão é a Rússia; mas,
quaisquer que fossem os produtores a sofrerem sanções desse tipo, o mundo estaria
sob impacto direto. Porque a vida, bens e consumos orbitam esse universo, em
razão de que praticamente tudo o que utilizamos contém combustível fóssil, ou
seja, nada foi feito para mudar esse cenário.
O que significa que as consequências
desastrosas a serem sentidas no contexto das relações diplomáticas, sobretudo
quanto ao comércio exterior, não podem ser atribuídas exclusivamente à Guerra
na Ucrânia e às sanções impostas aos russos.
Houve negligência, houve imprevidência,
houve descaso, em relação ao desenvolvimento de um modelo econômico socioambientalmente
sustentável, o qual trouxesse uma perspectiva inovadora para os diferentes sistemas
de produção.
A verdade é que a humanidade aceitou
ser e permanecer refém dos combustíveis fósseis, pelo fato das cifras trilionárias
que eles sempre ofereceram. Ninguém jamais se preocupou ou se atentou para os
riscos, os perigos, os imprevisíveis que pertencem às dinâmicas do mundo.
Assim, as atuais sanções impostas
à Rússia, nessa guerra, simplesmente, foram a gota d’água no sentido de desnudar
as ambições que sempre foram uma fonte combustível para as Revoluções
Industriais, em todos os tempos e lugares. Daí, então, se descobriu da pior forma que tanta
resistência, tanto esforço, tanto conflito, tanta ganância, no fim das contas resultará
em nada, considerando que as mudanças de rota e de paradigmas sinalizam no
horizonte próximo que serão mesmo inevitáveis.