Cuidado!
As aparências podem enganar!
Por
Alessandra Leles Rocha
De certo modo é compreensível que
nos percamos no tsunami de informações geradas pela Pandemia do Sras-Cov-2;
mas, nesse risco de “normalização da
vida” deixamos passar despercebidas questões muito importantes. Com o
surgimento recente da variante ômicron, inúmeros aspectos me fizeram pensar por
um viés pouco explorado pelos veículos de informação.
Olhando com bastante atenção para
o Brasil, onde desde o início da Pandemia o sistema de testagem da população
foi errático e insuficiente, certamente milhares de pessoas foram contaminadas
por alguma variante, ao longo desse período; mas, por ausência de sintomas
significativos ou muito leves, não se preocuparam em observar eventuais
desdobramentos ou sequelas.
Acontece que o contato com o
agente viral da COVID-19 demonstrou possibilidades reais de desenvolver
intercorrências, inclusive severas ou letais, em muitos pacientes,
desconsiderando o fato destes terem apresentado quadros leves, moderados ou
gravíssimos. Segundo o estudo Gutenberg COVID-19 da Universidade de Medicina de
Mainz, na Alemanha, “o número de casos
não identificados seria bem maior do que se pensava. E estes também podem estar
sujeitos a complicações tardias e duradouras da infecção original, em parte
graves – a assim chamada ‘covid longa’”1.
Ela também pode ser chamada de “Síndrome
pós-Covid”, “Covid persistente”
ou “Covid prolongada”, porque novos
quadros da doença podem aparecer até 6 meses após a contaminação inicial.
As investigações em curso, a
priori, apontam para o fato de que “dos
casos conhecidos, 10% desenvolveram covid-19 de longo prazo, e que em 10% destes
– ou 1% do total – se trata de uma forma severa”; por isso, eles precisam “entender quantos dos casos assintomáticos
são capazes de desenvolver a forma longa” 2.
Mas, outras 15 pesquisas a respeito estão em desenvolvimento no Reino Unido,
nos EUA, na Austrália, na China, no Egito e no México, sendo que a partir delas
foi possível identificar 55 sintomas principais.
De modo que “entre os 47.910 pacientes que integraram os estudos, os cinco
principais sintomas detectados foram: fadiga (58%), dor de cabeça (44%),
dificuldade de atenção (27%), perda de cabelo (25%) e dificuldade para respirar
(24%). Cerca de 80% das pessoas que pegaram a doença ainda tinham algum sintoma
pelo menos 2 semanas após a cura do coronavírus” 3.
O que desperta um alerta para o
fato de que apesar de algumas variantes do vírus se mostrarem menos agressivas
e potencialmente letais, o simples fato de elas terem alta capacidade de
transmissão pode ser um indicativo importante para o desenvolvimento de algum,
ou alguns, desses 55 sintomas. Porque, de acordo com um dos pesquisadores
britânicos, “a gravidade inicial da
doença – leve, moderada ou grave, não tem mostrado muita influência nas chances
de ter ou não sintomas após a cura” 4.
No entanto, tendo em vista que
entre esses 55 sintomas podem estar a perda de olfato e/ou paladar, palpitação,
insuficiência ou aumento da frequência cardíaca, redução da capacidade
pulmonar, problemas digestivos, apneia do sono e febre intermitente, é natural
que essas pessoas venham a demandar uma atenção especial pelos serviços de
saúde, por um período difícil de ser estimado. Sem contar que, em muitos casos,
também necessitarão de tratamento medicamentoso e de suporte (fisioterapia, psicologia,
nutricionista etc.), os quais demandam logística e orçamento para todos os
entes da Federação.
Assim, o caso da variante ômicron,
ainda em plena fase de elucidações científicas, merece o aprofundamento das
análises nessa direção. A COVID-19 vem demonstrando que a doença não se curva
nem mesmo diante da imunização. Pessoas
podem não apresentar quadros graves; mas, podem se reinfectar por variantes
distintas e desenvolver casos leves e moderados. O que é uma porta aberta para
uma eventual manifestação da “covid longa”.
Daí a razão de se manterem as medidas preventivas enquanto a Pandemia estiver
em curso.
Aliás, esse é um aspecto
importantíssimo para ser inserido no rol das discussões econômicas da Pandemia.
Ainda não se tem um número exato de pessoas, nem o seu perfil social, as quais
ficarão com sequelas indefinidamente e serão obrigadas a se afastar das suas
atividades produtivas, passando a depender de aposentadorias e/ou auxílios
governamentais, por exemplo. Essa perda da população economicamente ativa (PEA),
por conta das sequelas, precisa ser levada em consideração; posto que, em
termos de mortos, de diferentes idades e gêneros, o mundo já perdeu mais de 5
milhões de pessoas.
É isso o que justifica a
necessidade de esforços globais simultâneos para debelar a Pandemia. Enquanto o
vírus permanecer circulando, se disseminando, potencializando mutações, o mundo
estará tecendo os problemas descritos nesse texto e tornando a retomada do
cotidiano sob novos paradigmas, cada vez mais complexa e onerosa. O que pode significar
para inúmeros países, especialmente aqueles com menor Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH), um desafio e um prejuízo por décadas, acirrando o retrato da
desigualdade mundial.
Por isso, não se esqueça de que “É fácil escapar das responsabilidades.
Difícil é escapar das consequências por ter se livrado delas” (Graciliano Ramos
– escritor brasileiro). Afinal de contas, “Nossa responsabilidade é muito maior do que poderíamos supor, porque
ela engaja a humanidade inteira” (Jean-Paul Sartre – filósofo francês) e “A responsabilidade de todos é o único
caminho para a sobrevivência humana” (Dalai Lama – chefe de estado e líder
espiritual do Tibete).
1 https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/deutsche-welle/2021/07/17/estudo-diz-que-assintomaticos-tambem-podem-sofrer-efeitos-da-covid-longa.htm
2 Idem 1.
3 https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2021/02/13/sintomas-da-covid-longa-atingem-ate-80percent-dos-infectados-entenda-o-que-e-e-conheca-55-efeitos-de-longo-prazo.ghtml
4 Idem 3.