Sob
o risco de “mais do mesmo”
Por
Alessandra Leles Rocha
A incipiente consciência cidadã
do brasileiro é algo que me preocupa muito, particularmente, diante das
conjunturas atuais. Vejam, por exemplo, a discussão que se forma em torno de
uma terceira via para concorrer à Presidência da República, no ano que vem. Vejo
as pessoas preocupadas com nomes e não com ideias, projetos, propostas,
elementos suficientemente consistentes e distantes dos outros dois candidatos
que se apresentam para a corrida eleitoral.
Ora, esse deveria ser o ponto de
análise. Afinal, a atual gestão chegou ao poder depois de hastear inúmeras bandeiras,
tais como “nova política”, “antipetismo”,
“combate à corrupção”, “liberalismo econômico”, “resgate de valores
conservadores”; as quais foram lentamente sendo rasgadas e destituídas para
que “mais do mesmo” se apresentasse
aos brasileiros e brasileiras.
Acontece que essas pautas apesar
de chegarem juntas em um mesmo “pacote”,
não eram recebidas igualmente pelos eleitores, ou seja, cada grupo elencava a
sua para oferecer o apoio. Daí a debandada ter acontecido de maneira gradualmente
desigual. Cada pauta que desaparecia do cenário fazia perder um percentual de
apoiadores diferentes.
No entanto, esse movimento é
bastante significativo. Porque ele evidencia como esses eleitores não se deram
conta de que a deterioração do país nesse período se deu em razão desse “combo” de ideias. Não foi isso ou
aquilo o fiel da balança do que se tem como realidade atual; mas, o somatório
de tudo. De modo que ele atribuir a sua decepção, ou frustração, ou indignação,
ou o que quer que seja, ao abandono dessa ou daquela pauta é uma visão muito
limitada da situação.
Trata-se de um sinal claríssimo
de que se a pauta do seu interesse tivesse sido cumprida, para ele estaria tudo
às mil maravilhas. Ele não faria objeção ao restante. Tudo poderia estar “explodindo”, “desabando”, “naufragando”,
que para ele estaria tudo bem. Porque ele não consegue enxergar o país além
dessa forma dissociada, fragmentada, partida em pedacinhos, que só faz atender
aos seus interesses individuais e não, coletivos.
Mas, o cerne do problema, é que
dentre esse contingente de eleitores que apoia (ou apoiou) a atual gestão se
encontra uma massa expressiva da classe política nacional. Gente que não só depositou
seu voto na urna, a favor da atual gestão; mas, também, subiu no palanque,
discursou, fez campanha, tirou fotografia, enfim... exibiu publicamente a sua
imagem de apoiador irrestrito. E agora, tenta emplacar um “mea culpa” meio desajeitado, meio esquisito, que não parece
conseguir entoar, como fazem todos os cidadãos comuns decepcionados,
frustrados, indignados etc.etc.etc.
Vejam que incrível esse fenômeno!
Três anos depois de toda a manifestação esfuziante e aparentemente convicta de
apoio, eles agora lançam as lembranças e as memórias sob o tapete da história,
para se despontarem como a mais nova opção para o pleito de 2022. Tentam fazer
de um tudo para repaginar o discurso e a narrativa da ocasião, como se o
passado tivesse sido um transe, um evento errático inexplicável, que não
coaduna em absolutamente nada com suas convicções. Será?!
Depois de tudo é difícil acreditar.
Mesmo porque, pessoas que mudam de opinião, como uma “folha de bananeira”, não costumam transmitir credibilidade, consistência,
firmeza de opinião. Estão mais para satisfazer seus interesses pessoais, suas
ambições, seus pontos de vista, suas jogadas no tabuleiro da vida. E por mais
que isso pareça trivializado, banalizado, especialmente, no campo político, o
resumo da ópera não muda, continua sendo frívolo, volúvel, instável, efêmero,
... o que não é nada bom.
Ainda mais, quando se fala de
Brasil. Quando se olha ao redor e vê essa conjuntura caótica, seguindo à
deriva, para acreditar que alguém de espírito leviano seja capaz de resolver a
situação. Sim, porque esse tipo de pessoa se permitiu acreditar no suposto “programa de campanha”, apresentado em
2018, o qual fracassou como era de se esperar. Se o Brasil, hoje, exibe uma
imagem caricata, que o torna pária internacional, é porque ela colaborou, ela
se aliou a esse projeto absurdo.
Pois é, enquanto ventilam-se
nomes, daqui e dali, como opção de uma terceira via; menos eles parecem
sustentáveis. Direta ou indiretamente seus currículos políticos se ligam ao
atual governo, ou seja, se ligam a esse modelo de gestão que está sumariamente
esfacelando o país. Basta ver em suas breves falas à imprensa, linhas e
entrelinhas que repetem o ideário vigente. Aliás, me parece que nem se
preocupam em disfarçar ou omitir que pensam exatamente da mesma maneira. Então,
por que se dizem terceira via? Essa é a pergunta das perguntas.
O que tende a acabar acontecendo
é que sem perspectivas de se projetarem suficientemente concorrentes para
competir com os outros dois candidatos, teoricamente já consolidados, em caso
de segundo turno eles acabarão fazendo os seus eleitores migrarem para o lado
da direita e extrema-direita, que é a representação das suas ideias.
Infelizmente, eles são sim, “mais do mesmo” e não se mostram
constrangidos ou desconfortáveis com a realidade do país que pretendem
governar. Pelo contrário, eles fortalecem e legitimam as pautas que vêm
lançando o Brasil à bancarrota e que acirram as desigualdades sociais de
maneira totalmente perversa e brutal. Eles pensam que podem fazer dar certo o que
não deu nessa gestão, como se o problema não estivesse calcado nas próprias pautas.
Se esquecem de que elas vieram
ancoradas em uma realidade de país, de mais de meio século atrás, de modo que
não tinha como funcionar. Ora, quantas gerações transitaram por esse período
até aqui? Quantas novidades passaram a compor a vida das pessoas? Quantos hábitos
e costumes foram revolucionados? Quantas tecnologias transformaram as
informações e comunicações sociais? ...
Portanto, não dá para
desconsiderar uma reflexão a respeito. O cenário atual do país é muito grave,
não é para amadores, nem para oportunistas, nem para “salvadores da pátria”. Há tanto por fazer na mesma proporção da
impossibilidade de realizar. A complexidade dos desafios é imensa,
especialmente, tendo em vista um déficit fiscal gigantesco já confirmado pelo
governo, o qual retira o sono do mercado financeiro, das agências de risco e das
entidades ligadas à Economia em todo o mundo.
Assumir a governança do Brasil não
é o difícil. O difícil será governar. Será colocar o país nos trilhos do
desenvolvimento, do progresso, do alinhamento globalizado contemporâneo. Será
compreender que a questão é ser popular e não populista. Será se cercar de
gente séria e responsável; mas, sobretudo, habilidosa e suficientemente competente
para desfazer os nós e os entraves vigentes, não se esquecendo de que o país é
feito de gente, de seres humanos, de milhares de vidas, todas elas importantes.
O tempo da governança política sob vieses, interesses, poderes, tudo isso está ultrapassado. O mundo do século XXI exige um olhar holístico, integrado, multifacetado, que conecte todas as peças do tabuleiro, que dialogue para atender a todas as demandas, que trabalhe com a realidade e não, com idealizações e projeções infundadas. Não alcançar essas perspectivas não significa simplesmente ficar no atraso ou à margem; significa não sobreviver. Então, cuidado com o seu voto!