segunda-feira, 8 de novembro de 2021

E todos os caminhos levam ao mesmo Brasil


E todos os caminhos levam ao mesmo Brasil

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Gostaria muito de encontrar razões suficientemente robustas para explicar os motivos que levam a política brasileira a uma saga sem fim, em busca de um “salvador da pátria”. Porque essa insistência deliberada em reproduzir os mesmos erros nos mantêm presos a um retrocesso vexatório, que não nos conduz a lugar algum.

Por mais que uma grande parcela da população não disponha de uma construção identitária cidadã apurada, não me parece estar apenas nessa fragilidade o ponto nevrálgico da questão. Aqui, como em outros países latino-americanos, pulsa uma passionalidade política que arrebata as pessoas por um partidarismo cego e inconsequente, semelhante ao que se vê no futebol. Que une e converge as pessoas a partir de uma análise superficial e tendenciosa dos fatos.

Como se projetassem suas idealizações e aspirações em figuras inexistentes. Seres de carne e osso não são capazes de sustentar esse peso, porque não foram feitos para se ajustar as projeções alheias; mas, ao seu próprio arcabouço de defeitos e qualidades. Além disso, não é essa a perspectiva de reflexão no campo político. Nele não se discutem pessoas, se discutem ideias, projetos, propostas, capacidade técnica de gestão, envergadura das relações sociais e diplomáticas, enfim...

Algo que o próprio acompanhamento diário pelos veículos de informação e comunicação é capaz de fornecer. Basta, portanto, um pouco de disponibilidade e interesse do cidadão. Aliás, de saída, deveria se construir uma linha histórica a respeito dos acontecimentos capazes de revelar as ligações e relações da classe política entre si. A começar, pela observação atenta quanto ao que se chama “fidelidade partidária”. Não são raros os políticos que já transitaram, por idas e vindas, em mais de uma dezena de legendas ao longo da carreira, sempre em busca de algum benefício de momento. O que significa muito pouca, ou quase nenhuma, fundamentação político ideológica presente nas suas escolhas.

Entregues a esse movimento em razão de interesses, de promessas, de barganhas, sempre à espera de algo mais, eles demonstram, portanto, pouca aderência ao espírito representativo e aos valores e princípios que regem os cargos públicos. O que ressalta os ares de profissionalização à carreira político-partidária no país. Não acredita? Isso é fácil de apurar. Informações a respeito existem em profusão.

No entanto, não há garantias que esses mandatos “Ad aeternum” consolidam experiência e credibilidade. Haja vista o arrastar de correntes das mazelas nacionais nesses séculos de história. Essa “pseudoprofissionalização” da política brasileira demonstra, cada dia mais, como a função representativa não representa a população; mas, os interesses pessoais e partidários dos eleitos. Tanto que projetos essenciais para o desenvolvimento do país, os quais trariam enormes benefícios para a população, são esquecidos no fundo de gavetas empoeiradas do Congresso e das Assembleias Legislativas. Enquanto outros, não essenciais, são votados a toque de caixa, na calada da noite.

Aliás, é importante ressaltar, que nessas horas de “prejuízo à população” os conchavos e as alianças entre partidos totalmente antagônicos ideologicamente acontecem como em um passe de mágica. Sem o menor pudor ou constrangimento. O que torna difícil sustentar suas narrativas e discursos posteriormente; afinal de contas, flexibilizaram demasiadamente as suas convicções.

Mas, como o cidadão aprendeu a conviver com as aparências, muito mais do que com a credibilidade e a lisura política, rapidamente tudo é recomposto ao seu lugar de costume. Basta um meia “mea culpa” aqui e outro ali, ou um engajamento oportunista acolá, para que, com o apoio da claque, se encham os olhos do eleitor e se reacenda a chama do herói, do eterno “defensor dos fracos e oprimidos”. Tanto é verdade, que apesar dos pesares, eles acabam reeleitos. E aí, começa todo o martírio, outra vez.

A pergunta é, até quando? A verdade está bem diante do nariz. Trata-se de uma questão simples, querer enxergá-la, querer admitir a sua existência, querer lidar com a sua aspereza, tantas vezes, inconveniente. Tarefa difícil. Sair das zonas de confortos legitimadas pelos séculos, não é pouca coisa. Demanda esforço e energia. Então, entre avançar e retroceder, a maioria bate em retirada, abandona o ímpeto e deixa a mudança para amanhã, para depois, para alguém que se disponha a arregaçar as mangas e tomar uma atitude.

E nessa conjuntura, abre-se espaço para desenhar mais um “salvador da pátria”, um super-herói saído da ficção popular. Boa aparência. Discurso raso; mas, envolvente. Promessas e desculpas na ponta da língua. ... Uma figura talhada para zunir delicadamente, nos ouvidos desatentos, as soluções que desesperam cada parcela da população. Fim da corrupção. Fim da carestia. Fim do desemprego. Fim da miséria. ... de modo que as mazelas vão evaporando uma a uma, alvejadas por uma retórica ilusoriamente certeira.

Ora, ora. Nessas horas, ninguém para e pensa na história do Brasil. Nos seus mais de 500 anos vividos aos trambolhões.  Só se permite enganar, mais uma vez, pelo “canto da sereia”, para depois chorar e sofrer, como é de costume. É; eu quis muito acreditar que os acontecimentos desses últimos três anos seriam suficientes para impactar um número bastante significativo de brasileiros e brasileiras. Mas, me enganei. A insuficiência está marcada na tomada de posição das pessoas, na sua incapacidade de refletir a respeito de seus frágeis pontos de vista.