Movidos
pela indignação e tantas coisas mais...
Por
Alessandra Leles Rocha
Enquanto o país se permite viver
sob uma gigantesca nuvem de fumaça desenhada por uma “guerra de torcidas” sem sentido, é bom não esquecer de que a vida
de milhões de brasileiros, como eu e você, está fenecendo pela inabilidade,
pelo descaso, pela negligência; mas, sobretudo, pela incompetência do atual
governo.
O que importa não é se A, B, C ou
D conseguiram levar mais ou menos pessoas à rua, neste ou em qualquer outro
dia. O que importa é o que está acontecendo no Brasil, nos últimos três anos, e
que move a indignação de muitos ao ponto de fazê-los se manifestar nas sacadas,
nas ruas, nas avenidas, nas praças, dentro e fora do território nacional.
Esse é um movimento cidadão e
democrático, não uma mera aferição estatística.
Claro, que a beleza dos espaços públicos lotados de gente transmite uma
sensação de unidade e de força coletiva muito motivadora. Mas, não se pode
esquecer que a Pandemia permanece e apenas 43,39% da população já está
totalmente imunizada, tornando a cautela relevante e necessária.
Assim, nem todo mundo pode, ou quer,
ou considera relevante externar por aí as suas impressões, os seus sentimentos,
as suas angústias, os seus clamores, diante dessa conjuntura. Mas, isso não faz
dessas pessoas menos cidadãs. Isso não é sinal de falta de empatia, de
solidariedade, de respeito, de cidadania, ... Isso é uma escolha e não deve e
nem pode ser tratada com desrespeito, por ninguém.
Como já disse no início, não se
pode perder tempo e energia discutindo desimportâncias, quando há questões
urgentes exigindo atenção. Foi pela fragmentação, pela desunião, pela
polarização do país que estamos como estamos. Haja vista, por exemplo, todos os
processos de desmantelamento e desconstrução ocorridos dentro das próprias
estruturas de governo, nas mais importantes pastas da gestão pública, para se
verificar in loco que essa intenção é
intrínseca a ideologia desse governo.
Isso significa que as
manifestações têm sim a sua importância, o seu propósito, a sua significância;
mas, não são tudo. Talvez, seja a hora de agregar novas estratégias a esse
processo, de lançar sobre as mesas dos Tribunais de Justiça e do Congresso
Nacional pilhas e pilhas de “abaixo-assinados”,
pautando reivindicações emergenciais dos milhões de brasileiros prejudicados pela
péssima administração que conduz o Brasil.
Se essas autoridades tivessem se
engajado, se sensibilizado a contento, certamente, não seria necessária uma
estratégia como essa, porque a realidade não teria chegado ao ponto em que
chegou. Mas, vieram se abstendo, se esquivando, ... até que o caos se instalou.
Agora, só mesmo pela iniciativa de documentos
coletivos, de caráter público, assinados por milhões de pessoas, para que as
diferentes faces da inação governamental sejam devidamente contestadas.
Porque 94% da população1 já não suporta mais essa escalada de perdas
materiais e imateriais diárias. Pandemia. Crise hídrica. Crise Energética.
Crise dos Combustíveis. Crise Econômica. Crise Socioambiental. Desemprego.
Pobreza. Miséria. ... A dignidade dos cidadãos, do país, está indo pelo ralo da
história.
Pois como se sabe, até aqui,
permanece a falta de vacinas, o boicote as medidas sanitárias, a apologia as
medicações ineficazes contra a COVID-19, o desmatamento ao invés do
reflorestamento, as queimadas criminosas, as ações de garimpeiros ilegais, as
ameaças contra diversos povos indígenas, a desconfiança do mercado em relação
ao país, os altos juros, a perda do poder de compra, a insuficiência na geração
de empregos formais e a expansão da informalidade etc.etc.etc.
Por mais difícil que seja
admitir, o Brasil está se desintegrando a olhos vistos, sem que nada esteja
sendo feito a respeito; particularmente, no campo econômico. Enquanto a
carestia galopa e as condições de vida deterioram, o baixo crescimento do país
se soma a uma evolução disseminada da inflação, estabelecendo um quadro de “estagflação”, o que não se via na
realidade brasileira há aproximadamente três décadas.
Se nenhuma medida concreta e
responsável for tomada rapidamente, então, o país irá mergulhar em um abismo
por anos e anos a fio. Tendo em vista de que essa não é uma recuperação rápida
e fácil. Aos que pensam se encontrar em condições mais favoráveis de
sobrevivência, esse cenário esclarece que isso não existe. Independentemente da
velocidade dos acontecimentos, no fim das contas, todos serão consumidos pelos
efeitos desastrosos desse processo. Posto que o risco de um travamento no
desenvolvimento do país é iminente.
O povo brasileiro está diante do
resultado de algo que muitos não querem enxergar, mas é verdade, “Na falsa democracia mundial, o cidadão está
à deriva, sem oportunidade de intervir politicamente e mudar o mundo.
Atualmente, somos seres impotentes diante de instituições democráticas das
quais não conseguimos nem chegar perto” (José Saramago, Revista Época,
2005).
Mas, apesar dos pesares, se até
aqui as tentativas de diálogo com as instituições falharam, é sinal de que é
preciso se valer de outros recursos legais e democráticos disponíveis para
surpreendê-las, persuadi-las. De tal forma que elas sejam compelidas a agir,
ainda que à revelia de sua genuína vontade. Afinal de contas, como dizia Santo
Agostinho, “A esperança tem duas filhas lindas, a indignação e a coragem; a
indignação nos ensina a não aceitar as coisas como estão; a coragem, a
mudá-las”.