Economia
Verde ou Economia Amarela? Eis a questão!
Por
Alessandra Leles Rocha
Na verdade, nem precisaríamos falar
sobre o chamado “Dia do Fogo”, em
2019, quando fazendeiros da região próxima à BR-163 realizaram uma série de
queimadas criminosas, cuja prática veio se repetindo nos anos seguintes ao
ponto de fazer com que cinco dos seis biomas nacionais registrassem as piores
perdas pelo fogo em 2021.
Ou do desmatamento, que só a
Amazônia já perdeu entre 2020 e 2021 uma área equivalente a nove vezes o
tamanho da cidade do Rio de Janeiro, segundo o Instituto do Homem e Meio
Ambiente da Amazônia (Imazon). E de acordo com o “relatório do MapBiomas que
engloba os seis biomas brasileiros aponta que 99% da devastação ocorrida em
2020 foi ilegal” 1.
Ou das solicitações do Ministro
da Economia ao Ministério do Meio Ambiente para que fossem afrouxadas 14 regras
a pedido do setor privado. Ou da liberação do registro de agrotóxicos no país, que
significa que foram aprovados 1165 novos produtos entre 2019 e 2021 2. Enfim...
Porque o Brasil está anos luz de distância
de compreender e de formalizar uma Economia Verde, o que segundo o Programa
das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), é definida como “uma economia que resulta em melhoria do
bem-estar da humanidade e igualdade social, ao mesmo tempo em que reduz os
riscos ambientais e a escassez ecológica. As características preponderantes da economia verde são: baixo carbono, eficiência
no uso de recursos aturais e inclusão social. No projeto de economia verde, propõe-se o consumo
consciente, reciclagem, reutilização de bens, uso de energia limpa e valoração
da diversidade”3.
Então, basta uma visita rápida
aos veículos de informação e comunicação nacionais e estrangeiros, visto que
vivemos em um mundo globalizado, para verificar in loco que estamos sim, na contramão do mundo. O problema do
Brasil é “de imagem”, na medida de
uma realidade bastante constrangedora que, no entanto, não vem encontrando resistência
para se manter exatamente como está. Além disso, ela não se resume apenas as
questões ambientais. Os desafios das desigualdades sociais se acirraram de uma
maneira bastante contundente; de modo que os fatos falam por si. Nesse exato
momento, o mundo enxerga o Brasil como ele é, a partir da perspectiva que ele
próprio faz questão de apresentar.
Por isso, é inútil os esforços de
construir narrativas de convencimento internacional. Em pleno século XXI,
diante de situações extremas no mundo, os fóruns de discussão sobre Meio
Ambiente e Sustentabilidade, como é o caso da COP-26 (26ª Conferência das
partes sobre Mudanças Climáticas da ONU, em Glasgow, Escócia), não são palcos
retóricos. Ninguém está ali para ouvir promessas vãs, porque os problemas já
são reais e pedem soluções imediatas. Sem contar que os distanciamentos visíveis
entre discurso e práticas acentuam, ainda mais, a perda de credibilidade, o que
afasta as possibilidades de cooperações, de parcerias, de investimentos.
Cada nação tem responsabilidades
e compromissos a serem efetivados, em nome do bem-comum, da sobrevivência global.
Mas, o Brasil se colocou em uma “sinuca
de bico”, porque ele não pretende abrir mão do seu projeto político de
poder, em nome da preservação das suas relações diplomáticas no campo de um
comércio exterior pautado por uma Economia cada vez mais verde. Isso significa
que esse dilema tende a colocá-lo mais e mais a margem, no status de pária internacional,
acentuando as complexidades e os abismos de suas mazelas crônicas e agudas.
Até aqui, o que se assiste é o
afrouxamento das legislações, o desmantelamento dos órgãos de gestão,
fiscalização e controle ambiental, a construção de políticas ambientais nocivas
e degradantes. Ninguém fala em reflorestamento imediato das áreas desmatadas e
queimadas, das matas ciliares, a fim de reverter o índice de esgotamento hídrico
dos reservatórios superficiais e subterrâneos, para que não haja escassez de
água para suprir as demandas da população.
Ninguém fala em repensar a
utilização de agrotóxicos, no sentido de preservar a presença de polinizadores –
abelhas, moscas, vespas, borboletas – para manter a manutenção da população de
plantas e a variabilidade genética entre elas, algo essencial para a
biodiversidade. Afinal, “de 191 plantas cultivadas ou silvestres utilizadas
direta ou indiretamente na produção de alimentos em solo brasileiro, 144 (75%)
são visitadas por polinizadores”, o que significa que em termos de ganho, “apenas no Brasil, calcula-se que a
polinização relacionada à produção agrícola tenha um valor anual de US$12
bilhões” 4.
Ninguém fala sobre consumo
consciente e a política dos 5R’s – repensar, recusar, reduzir, reutilizar,
reciclar -, sobre energias e práticas limpas, sobre combater efetivamente as
desigualdades e, por consequência, seus preconceitos. E quando eu digo ninguém,
esse “ninguém” inclui governos,
parlamentares e judiciário, também. Inclui toda a sociedade, todo o povo
brasileiro, de maneira subjetiva e objetiva. Porque inclui ideias,
criatividade, discussões, projetos, leis, políticas, e inúmeras ações, cujas
formas e conteúdos precisam atingir cada eixo do país, resultando em
transformações positivas, em perspectivas melhores.
E se ninguém fala é porque ninguém escuta. Reflexos
dessa contemporaneidade cheia de pressa, cheia de afazeres, cheia de si mesma,
que não se dispõe a parar um segundo para absorver e digerir os discursos e as
narrativas, transformando cada centímetro de chão do planeta em uma nova “Babel”. O que não significa que essa
predisposição não tenha método, não tenha objetivo. Tem sim, garantir uma pseudoliberdade,
um pseudodireito de decidir à revelia do coletivo, o que poderia
fazer romper as teias desse individualismo narcísico e doente. Caso contrário,
já teriam levado a sério as palavras de Mahatma Gandhi, de que “Cada dia a natureza produz o suficiente
para nossa carência. Se cada um tomasse o que lhe fosse necessário, não havia
pobreza no mundo e ninguém morreria de fome”.
Diante da conjuntura atual, então, pare e reflita; pois, “O progresso é impossível sem mudança. Aqueles que não conseguem mudar as suas mentes não conseguem mudar nada” (George Bernard Shaw – escritor irlandês). E mudar a mente significa se desapegar, se desvencilhar de velhas crenças e valores, se permitir ressignificar a vida a partir da consciência de que “Ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois quando nele se entra novamente, não se encontra as mesmas águas, e o próprio ser já se modificou ...” (Heráclito de Éfeso – filósofo pré-socrático).