E
o constrangimento nem foi por W.O. ...
Por
Alessandra Leles Rocha
Qual é a graça? Nenhuma. Por trás
de um jogo de futebol que não aconteceu, está algo muito maior e bastante
desconfortável para se admitir. O fato da Seleção de Futebol Masculino da
Argentina ter infringido regras sanitárias vigentes no Brasil é um absurdo que
ninguém discorda. Mas, penso que cabe refletir sobre o que os levou a pensar
que poderiam fazê-lo sem nenhuma repercussão ou consequência.
E isso é simples. Pode ser que
exista muita gente morrendo de rir e considerando sensacional todo o tipo de
insultos, desrespeitos, grosserias e inconsequências manifestas pelo Presidente
da República e seus asseclas, desconsiderando por completo a liturgia do cargo e
a importância da manutenção da imagem do Brasil no cenário global. Mas, não é
bem assim.
Afinal, quantos exemplos deploráveis
têm sido noticiados em relação aos ataques contra membros do Supremo Tribunal
Federal (STF), governadores de Estado, representantes dos legislativos
estaduais e federais, e tantas outras personalidades dentro e fora do
território nacional. Sem contar, as inúmeras investidas quanto ao descumprimento
das leis vigentes no Brasil, especialmente, durante a Pandemia.
O país que rechaçou a testagem em
massa, que trabalhou arduamente contra o uso de máscaras e o isolamento como
prevenção, que inflamou a população a sair às ruas para retomar a “Economia”, que obstaculiza o avanço da
vacinação em plena ascensão da Variante Delta do Sars-Cov-2, que debocha das
mortes decorrentes da Pandemia, o fez pública e notoriamente para o mundo.
Todos viram. Todos se constrangeram. Todos ficaram perplexos. E o Brasil passou
a ser considerado um pária internacional.
Então, o desrespeito e a afronta
a esse país chamado Brasil, vem sendo tecido por sua própria gente, em
demonstrações sucessivas de total descaso à sua cidadania. Aliás, não é de
hoje, que o senso cidadão nacional se mostra raso e distante do que deveria
ser. Ser brasileiro não é vestir verde e amarelo, ou gostar de samba, ou celebrar
o carnaval e quaisquer outras coisas nesse sentido. A brasilidade é mais do que
um estado de espírito; mas, a responsabilidade do exercício dos direitos civis,
políticos e sociais que cabem a cada indivíduo nascido ou naturalizado aqui,
segundo manifesta a Constituição Federal de 1988.
O velho hábito do “jeitinho brasileiro” não tem
absolutamente nada de folclórico ou cultural. É desrespeito na lata, na cara
dura, e que mancha cada vez mais a reputação e a respeitabilidade nacional. Não
são os outros que estão a flexibilizar os limites e a extrapolar nas condutas,
somos nós, quando permitimos viver sob a premissa de vários pesos para milhões de
medidas. A tal ponto em que muita gente acaba se sentindo mais, ou menos,
brasileiro, dependendo do espaço social que ocupa.
Não podemos negar que basta uma
oportunidade para o brasileiro se aventurar no universo das infrações. Uma fila
dupla aqui. Uma “carteirada” ali. Uma
“Fake News” acolá. O país parece ser movido a esse tipo de
adrenalina. Pena que, no fim das contas, a alegria desse “pobre ser” dura pouco. O somatório dos problemas causados por esse
movimento inconsequente pesa na balança do cotidiano e causa estragos
individuais e coletivos, muitas vezes, irreparáveis.
De modo que o resumo dessa “ópera”
é um só, o descrédito. O país que não se leva a sério, não é levado a sério por
ninguém. Haja vista quantos criminosos internacionais, de nazistas a grandes
assaltantes de banco, fizeram do Brasil seu oásis de vida incólume durante décadas.
Simplesmente, porque tinham plena convicção da impunidade reinante por aqui. O que
se traduz no mais completo desdém, como já dito anteriormente, com o exercício
da cidadania pelo próprio brasileiro.
Mais uma vez, reafirmo que a atitude argentina não foi apropriada; sobretudo, considerando a situação pandêmica que ainda persiste no mundo. Leis sanitárias devem ser respeitadas por todos, sem exceção, quaisquer que sejam os lugares, porque dizem respeito a preservação da própria vida. Contudo, a nós, brasileiros e brasileiras, resta uma reflexão profunda sobre a parte que nos cabe nesse contexto. Afinal, estamos fazendo feio sim. Muito feio com a nossa própria identidade. “Amarelando” a nossa cidadania, por excessivas doses de estupidez e ignorância. Bora pensar, né?!