Uma
tempestade perfeita
Por
Alessandra Leles Rocha
Uma tempestade
perfeita. Isso é o que pode definir o Brasil nesse momento. O radicalismo na
propositura de um “plano de governo” desconstruiu
a base de sustentação do país, ou seja, a Economia. A fixação em dizer que
todos os elementos de governança estavam incorretos, que tudo havia sido
contaminado por uma ideologia de “esquerda”,
interrompeu o fluxo natural de trabalho, sem conseguir apresentar uma
contrapartida sequer, que fosse eficaz e satisfatória. Foi o corte pelo corte,
sem critério, sem método, sem objetivo justificável. E isso, bem antes de
surgir no horizonte uma grande Pandemia.
Quase 3 anos de
governo e, até agora, nada de governar. Sim, porque governar significa agir em
prol do desenvolvimento e da resolução de questões prioritárias para o país. Quando
chamavam o Ministério da Economia de “Superministério”,
tinha-se a percepção de que o governo entendia a importância da área. Afinal de
contas, a administração pública depende de recursos e estes precisam ser,
adequadamente, bem geridos. Mas, para surpresa geral, foi só mais uma expressão
de efeito, um aceno à vaidade.
O tal Ministério não
estava tão consciente, assim, da complexidade existencial brasileira e decidiu
trilhar caminhos distintos em relação aos demais assuntos da gestão pública. Erro
crasso que, agora, ameaça a paralisia geral do país. Ao dissociar Meio Ambiente
e Sustentabilidade da Economia, por exemplo, meteram os pés pelas mãos.
Segundo o site da
Folha de São Paulo, ontem, “sem chuvas, Brasil pode ter estagnação econômica e
inflação”, ou seja, “crise de energia
pode derrubar o PIB e aumentar a inflação no ano que vem” 1. O que significa não se tratar de uma
infeliz coincidência; mas, a resposta em relação ao fato de que as “queimadas atingiram quase 20% do território
brasileiro nos últimos 36 anos”, sendo que a “Amazônia e cerrado tiveram mais incêndios” 2.
De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), “agosto já registra maior número de
queimadas no Amazonas em 2021” 3.
E como divulgado
recentemente pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a
“influência humana é responsável por alta
de 1,07°C na temperatura global [...]” e a “alta de 1,5°C a 2°C será vista
neste século se não houver profunda redução nas emissões de gases de efeito
estufa” 4.
Portanto, a
humanidade está diante de alterações extremas na realidade climática do
planeta, tais como, secas e desertificação, enchentes, furacões, degelo das
calotas polares. De modo que esse processo não afeta somente a macro e microbiologia
do planeta; mas, as relações sociais, porque interfere, principalmente, no modo
de organização e desenvolvimento da sociedade urbanoindustrial.
Trata-se de uma rede
integrada de demandas individuais e coletivas, cujos pilares de sustentação dependem
do equilíbrio ambiental. Se há escassez de chuvas, por exemplo, secam os
reservatórios, a produção de energia elétrica fica limitada e o risco de
apagões se torna iminente.
Agora, quando se muda
o assunto para a pauta da Pandemia, o Ministério da Economia, também, demonstra
sua clara incapacidade resolutiva. De acordo com as análises do Instituto de
Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), apesar de o país ter injetado R$524
bilhões do “orçamento de guerra” no
combate à Pandemia, em 2020, ele não conseguiu controlar a crise sanitária.
Além disso, ainda,
insiste em acreditar que irá superar tudo sem despender outros pacotes de
estímulo fiscal capazes de favorecer a recuperação econômica e o alcance de
objetivos estratégicos em médio e em longo prazo. Acontece que uma das consequências,
já apontadas pelo Banco Mundial, em relação a toda essa conjuntura, “prevê nove anos de efeito negativo da
Pandemia sobre emprego e salário no Brasil” 5.
Uma pena que diante
deste cenário, o governo insista em ocupar os espaços vazios, as lacunas dessa
caótica governança, formulando atritos e ruídos antiproducentes. Barulhos em
demasia para fomentar a polarização político-ideológica, enquanto entretém o
cidadão e desvia o seu foco sobre o que realmente importa.
Basta uma análise
superficial das notícias do dia, ou da semana, para perceber que o cotidiano
transcorre por essa via paralela, que beira um amadorismo e incompetência
surreal. Nada parece sustentável, firme, seguro o suficiente para garantir um
certo equilíbrio social pacificador.
Assim, nesse roteiro
estabelecido pelo Brasil, a vida vai sendo embrulhada à revelia dos fatos e das
necessidades, lançando para baixo dos tapetes as inconveniências e as
impopularidades, como se fosse possível se desfazer de todas elas. Enquanto, os
limites tendem a se tornar demasiadamente flexíveis, moldáveis aos interesses
de uns e outros, a tempestade brasileira ganha forma e conteúdo cada vez mais
preocupantes. Afinal, “a nossa atmosfera
estava carregada de tempestade, a nossa própria natureza nublava-se, pois não tínhamos
encontrado caminho algum...” (Friedrich Nietzsche – filósofo alemão).
1 https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/08/sem-chuvas-brasil-pode-ter-estagnacao-economica-e-inflacao-diz-analista.shtml
2 https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2021/08/queimadas-atingiram-quase-20-do-territorio-brasileiro-nos-ultimos-36-anos.shtml
3 https://g1.globo.com/am/amazonas/noticia/2021/08/16/agosto-ja-registra-maior-numero-de-queimadas-no-am-em-2021.ghtml