quinta-feira, 27 de maio de 2021

(In)ação...

(In)ação...

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Mahatma Gandhi dizia que “Um homem não pode fazer o certo numa área da vida, enquanto está ocupado em fazer o errado em outra. A vida é um todo indivisível”. Mas, olhando para a situação do Brasil, nesse momento, o problema é não se ver o certo em nenhuma área; mas, uma sucessão de desmantelamentos que comprometem não só o desenvolvimento do país, como a sobrevivência de sua população.

Não há nenhum setor em que não se perceba a velha história do “cachorro correndo atrás do rabo”, ou seja, um esforço imenso que não traduz em absolutamente nada. Tudo porque a estrutura foi comprometida pela ausência de planejamento, de conhecimento, de interesse em promover melhorias e avanços. Transformaram o país em uma gigantesca arena de confronto ideológico, que não conseguiu ser claro nas suas próprias convicções e, nem tampouco, estabeleceu uma mudança com efetividade e relevância propositiva; apenas, discussão arbitrária e ruptura. Puseram abaixo o que estava funcionando, sem que houvesse um plano melhor para colocar no lugar.

Por isso, não é justo lançar sobre a Pandemia a culpa sobre o caos. A presença do Sars-Cov-2 em território nacional foi, tão somente, mais uma questão a revelar esse movimento desconstrutivo do país. Mais uma vez, ele manteve sua posição de caminhar na contramão do desenvolvimento contemporâneo e das perspectivas globais. Uma trilha própria repleta de atraso e de inação que revela o nível de despreparo e de ausência plena de habilidades e competências, por parte daqueles que deveriam tocar as agendas governamentais.

É lógico que se o governo federal age de maneira atabalhoada, isso repercute diretamente nos demais entes federativos. A governança do país se dá por uma engrenagem que precisa articular todos de maneira precisa, a fim de evitar o travamento e a interrupção dos processos e resultados. Ninguém é pior ou melhor nesse contexto, todos têm sua importância e sua participação bem definida. Caso contrário, o país não avança e a população padece as consequências e a cronificação das mazelas.

Portanto, não é à toa, que paire no ar um clima de insatisfação generalizada. Universidades sendo “derretidas” a olhos vistos, pela insuficiência de recursos. Pesquisas importantíssimas para o avanço científico e tecnológico sendo paralisadas, por perseguições ideologizadas aos grandes nomes da Ciência nacional. Investidas brutais de uma economia perversa à sobrevivência da população, especialmente, as parcelas mais vulneráveis. O retorno triunfante do desemprego e da miséria nacional. A lentidão da imunização contra a COVID-19 pela carência quantitativa de vacinas. O gargalo logístico nos serviços de saúde. Enfim... Não adianta culpar a imprensa por tantas más notícias. A população sente na pele, na dramaticidade cotidiana, o que está acontecendo no país.

Infelizmente, a resposta mais elucidativa quanto ao porquê de todo esse movimento, talvez, esteja nas palavras de George Orwell, quando ele afirma que “O essencial da guerra é a destruição, não necessariamente de vidas humanas, mas de produtos do trabalho humano. A guerra é um meio de despedaçar, ou de libertar na estratosfera, ou de afundar nas profundezas do mar, materiais que de outra forma teriam de ser usados para tornar as massas demasiado confortáveis e, portanto, com o passar do tempo, inteligentes” 1.

Deixar o país em escombros significa, então, tornar os 94% da população distribuídos entre a classe média tradicional e a classe baixa, totalmente, subservientes aos interesses e objetivos mercantis da elite. Daí a governança se revestir de uma fundamentação teórica baseada no Biopoder, na Necropolítica e na Aporofobia.

Os indivíduos das camadas estruturantes da pirâmide social são, portanto, “peças” sem importância humana para a sociedade, apenas econômica. Por isso, todo e qualquer investimento em políticas públicas vem sendo preterido. O que faz com que os direitos sociais2 - Educação, Saúde, Alimentação, Trabalho, Moradia, Transporte, Lazer, Segurança, Previdência Social, Proteção à maternidade e a infância e Assistência aos desamparados – estejam sempre na lista da prioridade de cortes no orçamento público, independentemente da conjuntura vigente.

Por mais que pareça indigesta, essa breve reflexão é um lampejo da realidade brasileira. Assim, não se esqueça de que “Os fatos não deixam de existir só porque são ignorados” (Aldous Huxley); é preciso entender que “[...] quem não espera o bem não teme o mal” (Maquiavel). Talvez, por isso, Jean-Paul Sartre dizia, “O pior mal é aquele ao qual nos acostumamos”, porque dele se constitui a nossa voluntária inação.  



1 ORWELL, G. 1984. Companhia das Letras, 2009.

2 art. 6º, CF. 1988.